Ipirá - Vara cível

Data de publicação19 Dezembro 2022
SeçãoCADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA
Número da edição3237
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COM. IPIRÁ
INTIMAÇÃO

8000134-14.2021.8.05.0106 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Ipirá
Autor: Jociana Fernandes Rios
Advogado: Hugo Vinicius Martins Oliveira (OAB:BA25910)
Advogado: Lucas Dantas Martins Dos Santos (OAB:BA25866)
Reu: Municipio De Ipira

Intimação:

Proc. nº: 8000134-14.2021.8.05.0106

AUTOR: JOCIANA FERNANDES RIOS

REU: MUNICIPIO DE IPIRA


SENTENÇA



Vistos.

Trata-se de ação de cobrança proposta por Jociana Fernandes Rios contra o Município de Ipirá. A parte autora alega que é agente de combate a endemias e que a parte ré não observou a legislação específica quando do pagamento de sua remuneração entre os anos de 2016 e 2020. Neste sentido, aduz a existência das seguintes supostas irregularidades: 1) não concessão dos reajustes anuais conferidos aos demais servidores públicos municipais; 2) pagamento incorreto do adicional de insalubridade com base no vencimento básico, e não na remuneração; 3) não repasse da verba denominada incentivo financeiro e, como consequência dos apontamentos anteriores, 4) pagamento incorreto dos biênios, férias e 13º salário. Desta maneira, requer a condenação da parte ré ao pagamento das diferenças correspondentes aos reajustes dos vencimentos, adicional de insalubridade, repasse do incentivo financeiro e das repercussões daí decorrentes sobre os biênios, férias acrescidas do terço constitucional e 13º salários (id 91131481, 91134023 e 95518935).

A petição inicial veio acompanhada de documentos.

A parte ré apresentou contestação, na qual, preliminarmente, suscitou a incompetência do juízo por necessidade de realização de perícia. No mérito, alegou que: 1) as portarias referidas pela parte autora que tratam do incentivo financeiro “veiculam parcelas destinadas ao custeio do programa de Agente Comunitário de Saúde, não representando valor a ser repassado ao servidor”; 2) não é devido qualquer reajuste salarial além do piso salarial já pago aos agentes de combate às endemias; 3) o pagamento do adicional de insalubridade deve ser calculado sobre o vencimento ou salário-base, conforme dispõe a Lei Federal n. 13.342/2016, pelo que “verifica-se a adequação do cálculo pelo município quando incide sobre o salário-base do servidor público”. Desta maneira, pugnou pela improcedência dos pedidos (id 96933687).

A parte autora apresentou réplica (id 100110699).

Em cumprimento a determinação judicial, pela parte autora foram acostados documentos (id 238083662).

O réu, intimado para acostar aos autos as leis de reajuste salarial para os servidores públicos municipais referentes aos anos de 2017 e 2020, não o fez (id 247156412, 256912676, 276056574 e 332666292).

É o essencial a relatar. Decido.

Procedo ao julgamento antecipado dos pedidos, por versar a demanda apenas sobre matéria de direito, não havendo necessidade de produção de outras provas além daquelas já constantes dos autos, com base no art. 355, inciso I, do CPC.

Inicialmente, afasto a preliminar de incompetência do juízo, suscitada pelo réu sob o argumento de que seria necessário a realização de perícia no local de trabalho da parte autora, visto que, em verdade, o deslinde do feito não desafia a produção de prova pericial, pois a parte autora questiona a base de cálculo usada para pagamento da insalubridade, sendo suficiente, para dirimir tal controvérsia, a análise da legislação pertinente.

A parte autora requer o repasse da verba denominada "incentivo financeiro" em seu benefício, o que não pode ser acatado, tendo em vista a ausência de respaldo legislativo para tanto. A respeito da matéria, cumpre transcrever alguns dispositivos legais, a fim de facilitar a compreensão:



Lei Federal n. 11.350/2006



Art. 9º-A O piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das carreiras de Agente Comunitário de Saúde e de Agente de Combate às Endemias para a jornada de 40 (quarenta) horas semanais.

§ 1º O piso salarial profissional nacional dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias é fixado no valor de R$ 1.550,00 (mil e quinhentos reais) mensais, obedecido o seguinte escalonamento:

I - R$ 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta reais) em 1º de janeiro de 2019;

II - R$ 1.400,00 (mil e quatrocentos reais) em 1º de janeiro de 2020;

III - R$ 1.550,00 (mil quinhentos e cinquenta reais) em 1º de janeiro de 2021.



Art. 9º-C Nos termos do § 5º do art. 198 da Constituição Federal, compete à União prestar assistência financeira complementar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, para o cumprimento do piso salarial de que trata o art. 9º-A desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.994, de 2014).



Art. 9º-D É criado incentivo financeiro para fortalecimento de políticas afetas à atuação de agentes comunitários de saúde e de combate às endemias. (Incluído pela Lei nº 12.994, de 2014)



Decreto Federal n. 8.474/2015



Art. 6º O incentivo financeiro para fortalecimento de políticas afetas à atuação de ACE e ACS, instituído nos termos do art. 9º-D da Lei nº 11.350, de 2006, será concedido aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios de acordo com o quantitativo de ACE e ACS definido nos termos do art. 3º.



Art. 7º O valor mensal do incentivo financeiro para fortalecimento de políticas afetas à atuação de ACE e ACS será de cinco por cento sobre o valor do piso salarial de que trata o art. 9º-A da Lei nº 11.350, de 2006, por ACE e ACS que esteja com seu vínculo regularmente formalizado perante o respectivo ente federativo, nos termos do art. 4º, observado o quantitativo máximo de ACE e ACS passível de contratação, fixado nos termos do art. 3º.



A leitura dos dispositivos transcritos permite concluir com tranquilidade que o “incentivo financeiro” consiste em repasse financeiro realizado com a finalidade de fortalecer as políticas de saúde afetas ao trabalho dos ACE e ACS.

A norma que vincula o número de ACE e ACS por Município ou por Estado ao valor do repasse tem como objetivo apenas estabelecer um critério para balizar o valor do “incentivo financeiro” a ser transferido para cada ente público, e não dá margem à interpretação de que o valor do repasse deverá ser rateado em favor dos mencionados profissionais.

A interpretação realizada pela parte autora desvirtua o desiderato do “incentivo financeiro”, que, como está claro na legislação, é fortalecer a política afeta aos programas e estratégias relacionadas às atividades desenvolvidas pelos servidores públicos ocupantes dos cargos de ACE e ACS, e não incrementar o salário individual de cada um deles.

A Lei n. 11.350/2006 instituiu duas espécies de repasses da União aos Estados e Municípios, sendo que nenhuma delas deve ser diretamente destinada aos ACE e ACS.

O primeiro repasse é o da “assistência financeira complementar”, que tem por objetivo assegurar que os Estados e Municípios logrem efetuar o pagamento do piso salarial dos mencionados profissionais. E o segundo é o “incentivo financeiro”, que tem por objetivo fortalecer a política de saúde relacionada às atividades dos ACE e ACS.

A “assistência financeira complementar” e o “incentivo financeiro” não se confundem, mas nenhum dos dois deve ter seus valores dirigidos ao rateio entre os ACE e ACS, muito embora o primeiro repasse, ao fim, se destine à garantia do piso salarial.

Neste sentido, é a jurisprudência:



EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE - INCENTIVO ADICIONAL - OBRIGATORIEDADE DE REPASSE DIRETO AOS AGENTES - NÃO CABIMENTO. Ausente previsão legal expressa, de que as verbas referentes ao "incentivo financeiro adicional" devem ser repassadas diretamente aos agentes comunitários de saúde, não é possível reconhecer o fato constitutivo do direito alegado. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.21.223180-7/001, Relator(a): Des.(a) Luzia Divina de Paula Peixôto , 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 03/12/2021, publicação da súmula em 07/12/2021)


APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE DO MUNICÍPIO DE IPIRÁ. RECEBIMENTO DE INCENTIVO ADICIONAL CONFORME PORTARIAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA. PRECEDENTES. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

1-Trata-se de Apelação Cível interposta por MARIA ZITA SOARES DE LEÃO SILVA contra sentença (Id 2300146)) proferida pelo MM. Juízo de Direito da Vara Cível da Comarca de Ipirá que, nos autos da AÇÃO de COBRANÇA ajuizada em face do MUNICÍPIO DE IPIRÁ, julgou improcedentes os pedidos constantes na petição inicial.

2- O cerne da questão relaciona-se em verificar se agentes comunitários de saúde teriam ou não direito ao pagamento de incentivo extra regulado pelas Portarias do Ministério da Saúde 2.488/2011 e 459/2012.

3-O repasse financeiro aos entes municipais tem por objetivo financiar ações, não existindo obrigatoriedade de repasse de verba diretamente aos agentes. Desde que vinculada à área da saúde, pode ser usada em diversos setores, tais quais: infraestrutura, alimentação, despesa com deslocamento.

4- O art. 37, inciso X, da CF/1988 dispõe expressamente que constitui dever da administração pública observar o princípio da legalidade, exigindo-se lei específica para fixar e alterar a remuneração dos servidores públicos. Além disso, o art. 169, § 1º, incisos I e II, da CF/1988 impõe prévia autorização na lei de diretrizes orçamentárias para a concessão de vantagem ou aumento de remuneração aos seus agentes públicos.

5-A pretensão da autora encontra-se fundada exclusivamente em atos normativos infralegais, a saber Portarias do Ministério da Saúde, restando indemonstrada a existência de lei...

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