Irará - Vara cível

Data de publicação02 Setembro 2021
Número da edição2934
SeçãoCADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE IRARÁ
INTIMAÇÃO

8000309-04.2018.8.05.0109 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Irará
Autor: Irenilda Estrela Da Silva
Advogado: Karina De Araujo Silva Lima Ramos (OAB:0026903/BA)
Reu: Companhia De Eletricidade Do Estado Da Bahia Coelba
Advogado: Rafael Martinez Veiga (OAB:0024637/BA)
Advogado: Bruno Nascimento De Mendonça (OAB:0021449/BA)
Advogado: Marcelo Salles De Mendonça (OAB:0017476/BA)

Intimação:

Visto, etc

Destaco que, embora dispensado o relatório, na forma do art. 38, da Lei 9.099/95, entendo necessário um sucinto resumo dos fatos.

Trata-se de ação de indenização por dano moral ajuizada por IRENILDA ESTRELA DA SILVA, em face da COELBA COMPANHIA DE ELETRICIDADE DO ESTADO DA BAHIA COELBA, na qual a Requerente aduz que teria sofrido abalo de ordem psicológica em razão de defeito na prestação do serviço fornecido pela Ré, consistente na suspensão do serviço de abastecimento de energia elétrica prestado pela Demandada. Informa que, entre os dias 4 a 7 de janeiro de 2016, ou seja, por mais de 48 horas, a cidade em que reside, inclusive sua residência, teriam sofrido com a ausência de iluminação, o que lhe causou as perdas e prejuízos descritos na inicial, requerendo, por tal razão, indenização pelos danos morais que alega ter sofrido. Juntou documentos.

A demandada contestou o feito (ID n. 14468388) arguindo as preliminares de incompetência do Juizado, por complexidade da causa, bem como a inépcia da petição inicial. No mérito, aduz que não houve a afirmada suspensão do fornecimento de energia elétrica, e que, se tivesse havido, inexistiria nexo causal porque o dano seria decorrente de caso fortuito ou força maior, o que afasta a sua responsabilidade civil. Alega, ainda, que não há prova dos danos morais e que não caberia a inversão do ônus da prova. Pede a improcedência dos pedidos.

Realizada audiência de conciliação, não se obteve êxito na composição do litígio (ID 14499920).

Réplica juntada no ID 15437949.

Em audiência de instrução foi ouvido depoimento pessoal da parte autora (ID 18975135).

Passo a decidir.

DAS PRELIMINARES:

DA PRESCRIÇÃO

Na forma do Enunciado n. 01, do Colégio dos Magistrados dos Juizados Especiais do Estado da Bahia: “prescreve em 03 (três) anos a pretensão de reparação civil decorrente de suspensão do fornecimento de água ou energia elétrica, tendo como termo inicial o primeiro dia da interrupção do serviço, nos termos do art. 206, §3º, V, Código Civil”.

Assim, considerando que o fato do serviço teria ocorrido entre as datas de 4 a 7 de janeiro de 2016 e que a presente ação foi proposta em 07/05/2018, rechaço a preliminar em questão.


DECADÊNCIA


Outrossim, não há que se reconhecer a decadência suscitada, já que inaplicável o disposto no art. 26 do CDC invocado pela demandada.

INÉPCIA DA INICIAL- AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS

No tocante à preliminar arguida, esta deve ser de pronto rechaçada, tendo em vista que se trata de processo que tramita pelo rito da Lei 9.099/95, de modo que é permitido a juntada de documento em qualquer fase do processo. Tem-se, também, que a distribuição do ônus da prova é uma questão que se liga diretamente ao mérito e nesta sede deve ser analisada.

COMPLEXIDADE DA CAUSA

Afasto a preliminar de incompetência do Juízo em virtude da complexidade da demanda, uma vez que a pretensão resistida em juízo não está a depender de intricada prova pericial para o seu deslinde, já que os fatos controvertidos podem ser esclarecidos à luz de outras provas, especialmente pelo exame de documentos e oitiva de testemunhas. Ademais, a necessidade de produção de provas está submetida ao prudente arbítrio do Juiz (art. 33 da Lei 9.099 /1995), que é o destinatário da prova, sendo livre para firmar sua convicção e valorar as provas, mediante fundamentação da sua decisão.

DO MÉRITO

Insta salientar que no caso em análise estamos diante de uma típica relação de consumo, pois as partes enquadram-se nos conceitos de consumidor e fornecedor constantes nos artigos e do do Código de Defesa do Consumidor . O art.14, §3º, do CDC, prevê a responsabilização do fornecedor, à exceção da culpa exclusiva de terceiro ou do próprio consumidor, pela reparação de danos causados ao consumidor.

Considerando a verossimilhança das alegações, bem como a hipossuficiência e vulnerabilidade do Consumidor face à parte ré e a relação de consumo existente na presente lide, foi invertido, no caso (ID n. 13182846), o ônus da prova (artigo 6º, VIII, do CDC), cabendo, então, ao fornecedor dos serviços, o ônus quanto à inverdade das afirmações da parte consumidora, apresentando alegações e provas da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado (art. 373, II do CPC).

Com efeito, há de se observar que tal prerrogativa, quando concedida ao consumidor, possui contornos especiais que precisam ser destacados e que já foram delineados, em riqueza de detalhes, no julgamento do Resp. 720.930/RS (informativo de jurisprudência nº 412), de relatoria do Min. Luís Felipe Salomão, in litteris:

(…) A "facilitação da defesa" dos direitos do consumidor, definitivamente, não significa facilitar a procedência do pedido por ele deduzido, tendo em vista - no que concerne à inversão do ônus da prova - tratar-se de dispositivo vocacionado à elucidação dos fatos narrados pelo consumidor, transferindo tal incumbência a quem, em tese, possua melhores condições de fazê-lo. Essa é a finalidade de se inverter o ônus da prova. Tanto é assim que a inversão do ônus da prova está ancorada na assimetria técnica e informacional existente entre as partes em litígio. Ou seja, somente pelo fato de ser o consumidor vulnerável, constituindo tal circunstância um obstáculo à comprovação dos fatos por ele narrados, e que a parte contrária possui informação e os meios técnicos aptos à produção da prova, é que se excepciona a distribuição ordinária do ônus.

No mesmo sentido vem entendendo o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, vejamos:

RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. COELBA. ALEGAÇÃO DE DANOS CAUSADOS PELA AVARIA EM APARELHOS ELÉTRICOS DO CONSUMIDOR, OCASIONADA EM RAZÃO DA OSCILAÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA EM SEU IMÓVEL. FALTA DE INDÍCIOS MÍNIMOS, NOS AUTOS, DE QUE AS CIRCUNSTÂNCIAS ILÍCITAS DESCRITAS PELA PARTE AUTORA DE FATO OCORRERAM, DESCARACTERIZANDO A HIPÓTESE DE MÁ-PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ILICITUDE NÃO CONFIGURADA. MANUTENÇÃO, NOS SEUS PRÓPRIOS TERMOS, DA SENTENÇA QUE JULGOU A DEMANDA IMPROCEDENTE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

(TJ/BA,, 4ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS DA BAHIA, RECURSO INOMINADO, PROCESSO: 0006336-93.2019.8.05.0113)

RECURSO INOMINADO. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SUSPENSÃO DO SERVIÇO DE ENERGIA ELÉTRICA POR PERÍODO SUPERIOR A 48 HORAS. APAGÃO. AUSÊNCIA DE MÍNIMA PROVA DOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO DO AUTOR, NOS TERMOS DO ARTIGO 373, I, DO CPC. CONSUMIDOR QUE VEM A JUÍZO INDIVIDUALMENTE REQUERER REPARAÇÃO DO DANO DEVE COMPROVAR QUE FOI ATINGIDO PELA MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO ALEGADA. DANO MORAL INOCORRENTE. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

(TJ/BA,, 4ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS DA BAHIA, RECURSO INOMINADO, PROCESSO: nº 0006671-68.2019.8.05.0063)

Dos julgados extrai-se que a inversão do ônus da prova não conduz, de forma automática, à procedência do pedido formulado pelo autor. Com efeito, em caso de vício no serviço, deve o consumidor provar ao menos o fato constitutivo do seu direito, ou seja, a existência de suspensão da energia, devidamente comunicada a requerida para que a mesma pudesse restabelecê-la.

Ademais, sobre a questão, importante destacar também que o teor do Enunciado n. 03, do Colégio dos Magistrados dos Juizados Especiais do Estado da Bahia, elucida: “o dano moral oriundo da suspensão de serviço de fornecimento de água ou energia elétrica, em decorrência de caso fortuito ou força maior não é in re ipsa”, entendimento, embora não vinculante, com o qual coadunamos.

Registro, por oportuno, ainda sobre a distribuição do ônus da prova, apesar da inversão produzida, que entendemos ter sido possível à parte Requerente a juntada de possível protocolo de atendimento ou, ao menos, a indicação de possível data de reclamação formulada junto à acionada, o que poderia demonstrar a ocorrência dos danos que se alega ter suportado. Ademais, anote-se que a parte requerente não juntou sequer documento com lista de chamadas que tenha realizado na ocasião, a confirmar que realmente solicitou a presença de algum técnico da requerida para resolver o seu problema. Destaque-se que a chamada para a Requerida, Coelba, poderia ser feita de qualquer telefone móvel, através do número 0800, que independe de cobrança/créditos, serviço no qual, inclusive, se oferece o protocolo de atendimento no primeiro momento da ligação. Não há, a nosso ver, razoabilidade em o (a) consumidora passar três ou quatro dias sem energia e não comunicar ao órgão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT