Irecê - 1ª vara cível

Data de publicação23 Junho 2021
Número da edição2887
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DOS FEITOS REL A RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEL, COM, REG PUB E ACIDENTES DO TRAB DE IRECÊ
INTIMAÇÃO

8001691-24.2021.8.05.0110 Tutela Cível
Jurisdição: Irecê
Requerente: Herbeth Dourado De Araujo Barreto
Advogado: Jose Carlos Cruz De Oliveira Filho (OAB:0026227/BA)
Requerido: Estado Da Bahia
Requerente: E. C. D. A. B.
Advogado: Jose Carlos Cruz De Oliveira Filho (OAB:0026227/BA)

Intimação:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA DOS FEITOS DE RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEL, COMERCIAL, REGISTRO PUBLICO E ACIDENTES DO TRABALHO DA COMARCA DE IRECÊ

PROCESSO Nº: 8001691-24.2021.8.05.0110


DECISÃO

Atribuo ao presente ato força de mandado, para fins de possibilitar o seu célere cumprimento, em consagração ao princípio constitucional da razoável duração do processo, servindo a segunda-via como instrumento hábil para tal.

Vistos etc.

Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL movida por ELISA CARDOSO DE ARAÚJO BARRETO, menor representada por seu genitor HERBETH DOURADO DE ARAUJO BARRETO, qualificados nos autos, em face do ESTADO DA BAHIA.

Argui o autor, em síntese, que se trata de menor com 14 dias de vida e que se encontra internada na UTI neonatal do Hospital Regional Dr. Mário Dourado Sobrinho, nesta cidade de Irecê/BA, desde o dia 10/06/2021.

Relata, outrossim, que a paciente menor é portadora de transposição dos grandes vasos com comunicação interventricular restritiva e FOP (restritivo), com CID Q 25.8 e Q 21.0, necessitando com URGÊNCIA de transferência por meio de UTI aérea para Hospital terciário que disponha de HEMODINÂMICA e cirurgia cardíaca urgente para realização de ATRIOSSEPTOSTOMIA POR BALÃO (CATETERISMO CARDÍACO) e programação de cirurgia cardíaca, devido a risco de vida iminente.

Requer, assim, seja deferida a tutela de urgência de modo que seja o réu compelido a oferecer a menor os mencionados serviços de saúde, para preservação de sua vida, devendo arcar, em sendo hipótese, com os custos da internação da paciente em hospital, inclusive se for o caso, particular, que disponibilize o atendimento médico de que necessita, se necessário e caso não disponível pela rede pública, sob pena de multa diária.

Vieram-me os autos conclusos.

Ressalto que esta magistrada estava de férias entre os dias 01 e 20 de junho de 2021, tomando conhecimento apenas hoje da presente ação de saúde.

É o relatório. Passo a decidir.

Analisando o dispositivo que consagra o instituto da tutela provisória de urgência, art. 300 do NCPC, colhem-se os pressupostos para a sua concessão. Exige-se a presença da verossimilhança das alegações cumulado com o requisito específico, vale dizer, “fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação”.

Além de a tutela provisória de urgência submeter a parte interessada às exigências da prova inequívoca do alegado na inicial, com robustez suficiente para convencer o Juiz de que as alegações são verossímeis, deverá o julgador estar convencido também de que há risco iminente para a autora de dano irreparável ou de difícil reparação.

A par disso, urge que, em princípio, a providência antecipatória não produza efeitos irreversíveis, ou seja, resultados de ordem que torne impossível a devolução da situação ao estado anterior (art. 298, § 3º, do NCPC).

Na hipótese em comento, por meio da prova documental apresentada, constato que a paciente menor tem diagnóstico de “transposição dos grandes vasos com comunicação interventricular restritiva e FOP (restritivo), com CID Q 25.8 e Q 21.0,”, e efetivamente necessita de “transferência por meio de UTI aérea para Hospital terciário que disponha de HEMODINÂMICA e cirurgia cardíaca urgente para realização de ATRIOSSEPTOSTOMIA POR BALÃO (CATETERISMO CARDÍACO) e programação de cirurgia cardíaca, devido a risco de vida iminente”.

Por outro lado, verifico que não há razões aparentes que legitimem a demora na disponibilização de serviços de saúde ora pleiteados. Evidencia-se, assim, a gravidade e o risco ao quadro de saúde do paciente menor a justificar o deferimento do pedido.

Resta demonstrado o fumus boni iuris, conforme acima exposto, e evidenciado o periculum in mora consistente na demora em proporcionar ao paciente a realização de regulação urgente/imediata em UTI aérea ou terrestre para unidade de saúde com UTI pediátrica.

Ressalte-se, ainda, que o retardo na realização do procedimento viola não só o art. 196 da Constituição Federal, como também o próprio princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, inciso III, da Carta Magna.

É do escólio de JOSÉ AFONSO DA SILVA: "[...] A saúde, como direito público subjetivo, representa uma prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas e é decorrência indissociável do direito fundamental à vida, que se constitui a fonte primária de todos os demais bens jurídicos, devendo ser resguardada de modo concreto e efetivo, na forma prevista pela Carta Constitucional, regendo-se pelos princípios da universalidade e da igualdade de acesso às ações e serviços que a promovem, protegem e recuperam."

Segundo as ponderações do eminente constitucionalista, o direito à saúde deve informar-se pelo princípio de que o direito igual à vida de todos os seres humanos significa também que, nos casos de doença, cada um tem o direito a um tratamento condigno de acordo com o estado atual da ciência médica, independentemente de sua condição econômica, sob pena de não ter muito valor a sua consignação em normas constitucionais. Nesse contexto, a Administração tem o dever de promover de forma efetiva a saúde de cada cidadão, na particularidade da doença que o acomete, isto é, por mais relevantes que sejam as dificuldades orçamentárias dos órgãos públicos ou por mais necessária que seja a regulamentação dos procedimentos atinentes ao Sistema Único de Saúde, não é possível ignorar a força normativa da Constituição Federal, sob pena de completo desrespeito à ordem jurídica.

Nesse sentido, colaciono acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná que guarda estreita similitude com o caso em tela, senão vejamos:

“APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PEDIDO DE REALIZAÇÃO DE EXAME DENOMI- NADO "ULTRA SONOGRAFIA COMPUTADORIZADA PARÓ- TIDA E" A PACIENTE PORTADORA DE ABCESSO DE PARÓ- TIDA. SENTENÇA QUE DETERMINOU A CONCESSÃO DO EXAME PLEITEADO. PRELIMINARES. 1) SUPOSTA ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM O INTUITO DE TUTELAR DIREITOS PARTICULARES E INDIVIDUALIZADOS. PRELIMINAR REJEI- TADA. TRATA-SE, NO CASO EM TELA, DE INTERESSE IN-DISPONÍVEL, UMA VEZ QUE DECORRE DO DIREITO À SA- ÚDE, DIREITO FUNDAMENTAL SOCIAL. LEGITIMIDADE DO PARQUET PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA, COM O OB- 14 JETIVO DE TUTELAR DIREITOS INDIVIDUAIS INDISPONÍ- VEIS. ENUNCIADO Nº 28 DAS 4ª E 5ª CÂMARAS CÍVEIS DESTE TRIBUNAL. 2) ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE PAS- SIVA DO MUNICÍPIO DE UMUARAMA, TENDO EM VISTA SUA INCOMPETÊNCIA QUANTO AO FORNECIMENTO DA MEDICAÇÃO SOLICITADA. NÃO ACOLHIMENTO. DIREITO À SAÚDE. COMPETÊNCIA COMUM ENTRE OS ENTES DA FE- DERAÇÃO. AS PORTARIAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE NÃO TÊM O CONDÃO DE AFASTAR A RESPONSABILIDADE DO ENTE MUNICIPAL. LEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO PARA FI- GURAR DO POLO PASSIVO DA AÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. MÉRITO. 1) IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁ- RIO INTERFERIR NO AGENDAMENTO DE TRATAMENTOS MÉDICOS SEM A COMPROVAÇÃO DE PERIGO DE VIDA DA PACIENTE. A DEPENDER DAS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS, É POSSÍVEL QUE O PODER JUDICIÁRIO ATUE COMO ÓR- GÃO CONTROLADOR DA ATIVIDADE ADMINISTRATIVA. PRECEDENTE STJ. A PACIENTE PRECISA DO PROCEDIMEN- TO REQUERIDO PARA OBTER UM DIAGÓSTICO PRECISO, E ASSIM, O TRATAMENTO MÉDICO MAIS ADEQUADO À PA- TOLOGIA QUE A ACOMETE. ADEMAIS, TRATA-SE DE PES- SOA IDOSA, QUE GOZA DE PROTEÇÃO INTEGRAL E DE PRIORIDADE ABSOLUTA QUANTO À EFETIVAÇÃO DO DI- REITO À VIDA E À SAÚDE, NOS TERMOS DO ESTATUTO DO IDOSO (ART. E DA LEI Nº 10.741/03). 2) INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL. ENUNCIADO Nº 29 DAS 4ª E 5ª CÂMARAS CÍVEIS. A REFE- RIDA TEORIA NÃO PREVALECE EM RELAÇÃO AO DIREITO À VIDA, À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E AO MÍNIMO EXISTENCIAL, NÃO CONSTITUINDO ÓBICE PARA QUE O PODER JUDICIÁRIO DETERMINE AO ENTE PÚBLICO O FOR- NECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS. 3) PEDIDO DE RATEIO DAS DESPESAS DECORRENTES DO EXAME SOLICITADO ENTRE UNIÃO, ESTADO DO PARANÁ E MUNI- CÍPIO DE UMUARAMA.IMPOSSIBILDIADE. MEDIDA QUE RE- PRESENTA ENTRAVE À EFETIVAÇÃO DO DIREITO À SAÚ- DE.ENUNCIADO Nº 16 DA 4ª E 5ª CÂMARAS DESTE TRI- BUNAL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTEN- CA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO. (TJPR - 4ª C.Cível - ACR - 1252338-7 - Umuarama - Rel.: Maria Aparecida Blanco de Lima - Unânime - - J. 08.12.2014)

Dessa forma, resta evidenciada a omissão do poder público com relação à garantia do direito à saúde da menor, sendo clarividente o seu direito à regulação urgente/imediata em UTI aérea ou terrestre para unidade de saúde com UTI pediátrica, vez que se trata de intervenção necessária, conforme demonstram os documentos anexados aos autos.

Assim e levando-se em consideração o princípio da universalidade que rege a saúde, sem prejuízo de se que a requerente é pessoa ainda em formação, o que implica no seu atendimento com prioridade absoluta, DEFIRO o pedido de tutela de urgência, nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil, para determinar que o ESTADO DA BAHIA disponibilize, no prazo de 24 h (vinte e quatro horas), a partir da ciência desta, à menor ELISA CARDOSO DE ARAÚJO BARRETO, regulação em UTI aérea ou terrestre para...

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