Irecê - 2ª vara dos feitos criminais, júri e execuções penais

Data de publicação19 Maio 2022
Número da edição3100
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL DE IRECÊ
DECISÃO

8001470-07.2022.8.05.0110 Tutela C/c Destituição Do Poder Familiar
Jurisdição: Irecê
Requerente: M. P. D. E. D. B.
Terceiro Interessado: N. D. R.
Requerido: A. P. A.
Requerido: G. P. D. F.

Decisão:

Poder Judiciário do Estado da Bahia
Comarca de Irecê

1ª Vara Criminal, Infância e Juventude


PROCESSO Nº: 8001470-07.2022.8.05.0110

TUTELA C/C DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR

REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA

REQUERIDOS: ADRIANA PEREIRA AMORIM e GERALDO PEREIRA DANTAS FILHO


DECISÃO

Vistos, etc...

Trata-se de AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR C/C TUTELA proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA, por meio de suas atribuições legais, em face de ADRIANA PEREIRA AMORIM e GERALDO PEREIRA DANTAS FILHO, em defesa dos interesses da criança VICTOR MARLEY AMORIM DANTAS.

Em síntese, o menor, supostamente, teria tido os seus direitos de infante violados pelos seus genitores, desta forma, com a atuação do Ministério Público de Goiás, juntamente com o Juízo da Comarca de Luziânia/GO, foi ajuizada medida de acolhimento institucional do infante e deferida liminarmente, conforme consta nos autos nº 5327879-51.2021.8.09.0100.

Com isso, diante do desinteresse dos genitores pelo infante, bem como sido localizada a avó paterna Noecina Dantas Rosa, no Município de Jussara – BA, foi determinado o desacolhimento e o deferimento da guarda provisória, sido o menor entregue à sua avó paterna, aplicada, ainda, a medida protetiva prevista no art. 101, inc. II, do ECA, para ser cumprida pelo Conselho Tutelar do Município de Jussara, declinando a competência para este Juízo.

O processo nº 8003474-51.2021.8.05.0110 está tramitando com o objetivo de acompanhar a execução da medida protetiva aplicada pelo Juízo da Infância de Luziânia. Desta forma, o Ministério Público, por entender ser necessária a regularização do vínculo entre o infante e sua avó paterna, instaurou o referido Procedimento Administrativo.

Em sede de tutela de urgência, requereu o Ministério Público a suspensão do poder familiar, aplicando-se, de imediato, a guarda provisória ao membro da família extensa, qual seja, Noecina Dantas Rosa.

Com a inicial, juntou os documentos.

É o relatório. Passo a decidir.

DA SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR:

Os arts. 1.637 do Código Civil e 157 do ECA estabelecem que se os genitores abusarem de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, será, liminarmente, adotada a medida necessária para resguardar a segurança do menor e de seus haveres, podendo, inclusive, havendo motivo grave, ser decretada a suspensão do poder familiar, ficando a criança ou adolescente sobre a guarda de pessoa idônea mediante termo de responsabilidade.

O fumus boni iuris, portanto, encontra-se presente, notadamente, em face das violações da legislação vigente, com a prática de graves atos contrários ao bom exercício do poder familiar.

É evidente o periculum in mora na situação narrada, haja vista que qualquer demora no provimento jurisdicional acarretará risco de danos irreparáveis à criança, não sendo a guarda institucional de natureza eterna, o que coloca em risco o infante ficar sem responsável legal.

Depreende-se dos autos da ação penal nº 8000285-65.2021.8.05.0110 e do Inquérito Policial Nº 002/2021 que, supostamente, o menor foi abandonado por sua genitora Adriana Pereira Amorim, qual não teria interesse em saber deste e, posteriormente, teria passado a ser agredido e humilhado, reiteradamente, pelo seu genitor Geraldo Pereira Dantas Filho, ainda, tendo este buscado o Conselho Tutelar de Luziânia – GO e informado que queria entregar seu filho ao orfanato.

O Conselho Tutelar de Jussara-BA informou sobre a aptidão da avó materna, satisfazendo, portanto, a possibilidade de acolhimento da criança, conforme id 197308866- Págs. 8-16.

Ademais, presente a verossimilhança das alegações trazidas pelo “Parquet”, ante aos Relatórios acostados aos autos, eis que, enquanto documentos produzidos por agentes públicos, gozam de presunção de veracidade.

Tal entendimento segue na linha do Princípio do Melhor Interesse da Criança. O processo não é um fim em si mesmo, em verdade, é instrumento de garantia do resultado material de justiça, devendo então, proteger a criança, eis que, in casu, a tutela antecipada é provimento do seu maior interesse. A criança é sempre o protagonista, porquanto a decisão repercute direta e objetivamente em sua vida.

Os direitos processuais e materiais são submetidos ao interesse primário do menor, que é objeto central da proteção legal em ações que o afetem. A interpretação do ordenamento legal deve honrar o princípio do melhor interesse da criança, cuja intangibilidade deve ser preservada.

Neste diapasão, o art. 98, do Estatuto da Criança e do Adolescente determina adoção de medidas com vistas à proteger a criança que se encontra em situação vulnerável.

Veja-se:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:

I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;

II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;

III - em razão de sua conduta.

In casu, a medida deve ser concedida liminarmente, já que verificada a hipótese de descumprimento do disposto no art. 22, do ECA.

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

Nesta esteira, não é outra a determinação do art. 157, do ECA. Veja-se:

Art. 157. Havendo motivo grave, poderá a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar a suspensão do pátrio poder familiar, liminar ou incidentalmente, até o julgamento definitivo da causa, ficando a criança ou adolescente confiado a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade.

DA GUARDA PROVISÓRIA:

O artigo 1º da Lei n. 12.010/2009 prevê a “garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes”, devendo o enfoque estar sempre voltado aos interesses do menor, que devem prevalecer sobre os demais.

Na hipótese em exame, é forçoso concluir que, a avó paterna é a pessoa que se dispõe a cuidar do infante, devendo, portanto, a ela ser outorgada a GUARDA PROVISÓRIA.

Tal medida é perfeitamente possível, pois avó integra a chamada família extensa.

A denominação família extensa foi introduzida com a reforma do Estatuto da Criança e do Adolescente, que se deu com a Lei 12.010/09 e, de acordo com o previsto no parágrafo único do art. 25:

Art. 25. [...]

Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.

Trata-se de espécie de família natural.

Acerca do instituto de guarda provisória, preceituam os arts. 33 e 35 da Lei n. 8.069/90, in verbis:

Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.

§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros.

§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.

§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.

§ 4o Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público.

Art. 35. A guarda poderá ser revogada a qualquer tempo, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério Público.

Analisando os elementos constantes nos autos, revela-se necessária a concessão da guarda provisória, uma vez que o deferimento da medida satisfaz, portanto, a necessidade de representação do infante para assegurar a continuidade dos cuidados necessários à sua criação.

De outra feita, não vislumbro, numa análise perfunctória, ínsita ao momento de cognição prefacial, qualquer prejuízo ao infante, já que a guarda poderá ser modificada, a teor do disposto no supracitado artigo 35, do Estatuto da Criança e do Adolescente. A doutrina caminha no mesmo sentido:

A concessão da guarda, provisória ou definitiva, não faz coisa julgada, podendo ser modificada no interesse exclusivo do menor e desde que não tenham sido cumpridas as obrigações pelo seu guardião." (Paulo Lúcio Nogueira – ECA Comentado).

Considerando as razões expostas e tudo mais o que consta dos autos, JULGO PROCEDENTE o pedido ministerial e DECRETO a SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR de ADRIANA PEREIRA AMORIM e GERALDO PEREIRA DANTAS FILHO em relação à VICTOR MARLEY AMORIM DANTAS e DEFIRO, liminarmente, a GUARDA PROVISÓRIA do menor à NOECINA DANTAS ROCHA, nos termos dos artigos 33 a 35 da Lei n. 8.069/1990, devendo, para tanto, prestar compromisso de responsabilidade, sem prejuízo de ulterior revogação, a qualquer tempo, caso tal medida não mais se justifique.

Lavre-se o competente...

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