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RELAÇÃO Nº 0511/2020
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ADV: THIAGO LIMA MARQUES (OAB 38102/BA) - Processo 0500952-29.2018.8.05.0113 - Ação Penal - Procedimento Ordinário - Decorrente de Violência Doméstica - AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA - RÉU: MARCOS ANTONIO DOS SANTOS ASSIS - Recebimento parcial de denúncia - aguardar designação de audiência - demais diligências. Trata-se de Denúncia oferecida contra Marcos Antonio dos Santos Assis pela prática de crime tipificado no artigo 129, §9º, e 147, ambos do Código Penal - CP c/c Lei 11.340/2006, lesão corporal e ameaça, ambos no âmbito de violência doméstica. Segundo a denúncia: "Ressai do caderno investigatório que no dia, hora e local supracitados, o ora denunciado agrediu moral e fisicamente a vítima, desferindo-lhe chutes, socos no rosto e arremessando a cabeça da vítima contra a geladeira. Consta ainda que após ofender a vítima com palavras de baixo calão, o acusado a ameaçou, afirmando que mataria a mesma, caso fosse preso. Ademais, o acusado pegou uma panela de metal que estava com água quente, no fogão, e jogou em cima da vítima, só não provocando queimaduras na mesma em razão da água ainda não estar fervendo. Em seguida, o denunciado agrediu a vítima com a aludida panela, batendo nas costas e na cabeça da ofendida. Consta dos autos que um dos socos desferido pelo acusado em face da vítima atingiu o nariz da mesma, fraturando-o, provocando sangramento. A vítima acionou a polícia militar, que compareceu ao local e prendeu o acusado em flagrante delito. A ofendida foi encaminhada para o Hospital de Base Luis Eduardo Magalhães, em razão das lesões sofridas." Devidamente citado, o acusado por intermédio de defensor constituído, apresentou resposta à acusação, folhas 54 a 57, onde nota-se pedido de absolvição sumária sob alegação de não ter cometido o crime e que resta evidenciada na conduta do réu, o princípio da insignificância. Juntou procuração e documentos nas folhas 58 a 72. Ouvido o Ministério Público, requereu o indeferimento dos pedidos formulados pela defesa, rejeitando as preliminares e recebendo a denúncia, conforme parecer de folhas 79 a 83. Esse é o breve relato; esta, a decisão. Quanto ao crime de lesão corporal no âmbito doméstico. Nos termos do Código de Processo Penal CPP, artigo 41, a denúncia ou queixa conterá a exposição de fatos criminosos, com as suas circunstâncias; qualificação dos acusados ou esclarecimentos pelos quais se possam identificá-lo; classificação jurídica dos crimes; rol de testemunhas; e lastro probatório mínimo (por exemplo: inquérito policial ou procedimento administrativo) para induzir a justa causa. Também há necessidade, conforme artigo 395 do CPP, para que a peça acusatória esteja formal e materialmente idônea, que não falte pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal. Quanto a isso e no que tange ao crime de lesão corporal, a denúncia, minimamente, preenche os requisitos, conforme se vê nas folhas 02 a 03, pois as partes, hipoteticamente, são legítimas: acusador, o Ministério Público, e acusado pessoa maior de dezoito anos; o fato narrado constitui, em tese, crime, conforme classificação jurídica exposta; e a ação penal é pública incondicionada. Contudo, e quanto à lesão corporal, não se vê lastro probatório mínimo a induzir a justa causa, pois não há material probatório suficiente ante a inexistência de laudo de exame corporal, o que, por consequência, faz inferir que não está apta a peça de acusação para ensejar a ação uma penal, o que implica, por consequência, a rejeição da denúncia. Explico. O acusado foi denunciado por suposta infração ao artigo 129, § 9º, e 147, ambos do Código Penal c/c Lei 11.340/2006. Assim, quanto à lesão corporal, tratando-se de crime que deixa vestígios, e conforme estatui o artigo 158 do Código de Processo Penal CPP, é indispensável o exame de corpo de delito, exame este que não existe no presente feito. Ademais, o Ministério Público em sua manifestação ratifica a inexistência do laudo de exame corporal e requereu que fosse juntado aos autos o mencionado laudo, bem como declara que o acusado fora preso em flagrante, sendo os agentes estatais testemunhas idôneas do delito. Ora, se o acusado fora preso em flagrante, oportunidade em que a vítima foi ouvida pela autoridade policial, não há razão para não ter feito o exame necessário, haja vista que naquele momento, muito provavelmente, havia vestígios sensíveis do fato delituoso, inclusive a vítima recebeu guia para exame médico legal (vide folha 13). Se o exame não foi feito naquela época, não pode mais ser o processo penal usado para tanto. Assim, necessária a rejeição parcial da denúncia haja vista a falta de provas mínimas (justa causa) acerca da materialidade delitiva descrita em relação ao crime de lesão corporal, o que, por certo, evitará a tramitação de um processo que culminará na absolvição. Assim, fica rejeitada a denúncia quanto ao crime de lesão corporal por falta de justa causa. No tocante ao crime de ameaça no âmbito doméstico. Por outro lado, e em análise formal da peça, confere-se na denúncia os requisitos previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal - CPP (exposição de fatos criminosos, com as suas circunstâncias; qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possam identificá-lo; classificação jurídica do(s) crime(s) imputados; rol de testemunhas; e lastro probatório mínimo, ou seja, o inquérito policial instaurado com documentação, o que induz a justa causa). Por outro lado, não se constata, neste momento e fase processual, motivos para rejeitá-la liminarmente, nos termos do artigo 395 do CPP (a denúncia está formal e materialmente idônea, não estando inepta; assim como não falta pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal, pois as partes são legítimas: Ministério Público e ré(u)(s) pessoa(s) maior(es) de dezoito anos; o(s) fato(s) narrado(s) constitui(em), em tese, crime(s); a ação penal é pública incondicionada, e ou condicionada, com representação da vítima etc.) Ainda, não se vislumbra seja o caso de julgamento antecipado para o fim de absolvição sumária do(a)(s) denunciado(a)(s), isso por não haver, até o momento, provas claras e seguras de existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato e de causa excludente da culpabilidade do agente, ou ser caso de inimputabilidade, bem como por não haver provas de que o fato narrado evidentemente não constitui crime ou que esteja extinta a punibilidade do agente (prescrição, decadência ou falecimento, por exemplo), conforme os termos do artigo 397 do Código de Processo Penal - CPP. Dispositivo. Desse modo, com base na Constituição Federal CF, e nas leis com ela compatíveis, e diante da falta de justa causa para a acusação quanto à lesão corporal, conforme acima referido, rejeito parcialmente a denúncia apresentada nestes autos, quanto ao crime de lesão corporal, segundo artigo 395, III, do CPP, e recebo a denúncia apenas em relação ao crime de ameaça. Intime as partes, acusação e defesa, observando as eventuais prerrogativas. Em seguimento, dê vista ao MP para fins de aplicação do artigo 28-A do CPP. Em seguinda, e para melhor viabilizar a marcação de audiência e viabilidade da pauta, considerando a existência de feitos preferenciais (réus presos, violência doméstica, crimes graves e de grande repercussão, processos antigos etc.), determino à Secretaria que encaminhe os autos para a filha do SAJ de aguardando designação de audiência, vindo-os conclusos. À Secretaria para, se ainda não feito, juntar os antecedentes do(a)(s) acusado(a)(s) disponível nesta vara. Os demais documentos referentes ao acusado, à vitima e aos fatos imputados devem ser juntados pela acusação ou pela defesa, no interesse de cada um e no momento oportuno, haja vista a imparcialidade deste órgão jurisdicional, pautada no princípio constitucional da inocência, do contraditório e da equidistância das partes.
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