Itabuna - 3ª vara dos feitos de relações de consumo, cíveis, comerciais e acidentes do trabalho

Data de publicação25 Outubro 2022
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição3205
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
3ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COMERCIAIS E ACID. TRAB. DE ITABUNA
SENTENÇA

8000768-23.2020.8.05.0113 Reintegração / Manutenção De Posse
Jurisdição: Itabuna
Parte Autora: Orlando Vidal Dos Santos
Advogado: Roberto Wagner Santos Barbosa (OAB:BA43399)
Parte Re: Ludinalva Vidal Dos Santos
Advogado: Alessandra Teixeira De Carvalho (OAB:BA44439)
Parte Re: Wellington Vidal
Advogado: Alessandra Teixeira De Carvalho (OAB:BA44439)
Testemunha: Fabiele Vidal Dos Santos
Testemunha: Ednalva Vidal Dos Santos
Testemunha: Givaldo Batista Dos Santos
Testemunha: Eliete Moura Santos

Sentença:

S E N T EN Ç A


ORLANDO VIDAL DOS SANTOS propôs ação de reintegração de posse em desfavor de LUDINALVA VIDAL DOS SANTOS e WELLINGTON VIDAL, ambos qualificados nos autos, em consonância com os substratos fáticos e jurídicos delineados na petição inicial.

Alega a parte autora, em síntese, ser legítimo possuidor e proprietário do imóvel descrito na petição inicial, o qual, por volta dos anos 2000, foi emprestado gratuitamente à primeira acionada, sua irmã, para que pudesse criar seus filhos pequenos com o mínimo de dignidade.

Aduz que, após muitos anos, a primeira ré recebeu um imóvel do programa MINHA CASA MINHA VIDA, bem como os seus filhos cresceram e hoje trabalham, modificando a situação que condicionava o empréstimo gratuito, além da situação financeira do autor se complicar com o passar dos anos.

Informa que solicitou a devolução do referido imóvel, contudo, teve seu pleito negado, uma vez que a ré se negou a devolver o imóvel emprestado e hoje sequer fala com o autor que tanto lhe ajudou. O autor teve notícia que a primeira ré cedeu o imóvel, sem consentimento do proprietário, para o seu filho, qual seja o segundo réu que também, embora notificado se recusou a sair da casa e, inclusive, pretende construir uma laje.

Afirma que o ato praticado pela ré caracteriza-se como esbulho possessório, requerendo a procedência do pedido para reintegrar o autor na posse do imóvel bem como a condenação do requerimento nas perdas e danos no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) mensais desde o final do prazo da notificação até a entrega definitiva do imóvel, sendo que referido valor equivalente a um mês de aluguel.

Juntou documentos e valorou a causa.

Citada, a parte ré apresentou contestação, sustentando preliminar de inépcia da petição inicial e impugnação à justiça gratuita. No mérito, refutou os argumentos do autor, alegando que o imóvel em questão foi adquirido pelo genitor dos litigantes e o acionado, de má-fé, confeccionou o contrato de compra e venda do lote em seu nome. Ao final, apresentou contestação postulando o reconhecimento da usucapião especial urbana e pugnou pela improcedência dos pedidos do autor.

Réplica apresentada na ID 116645567.

Decisão de organização e saneamento do feito proferida na ID 134186041.

Audiência de instrução e julgamento realizada na ID 201883020.

A parte acionada apresentou alegações finais na ID 208485283.

Não obstante intimada, a parte autora deixou de apresentar suas alegações finais (ID 2123966879).

Os autos vieram-me conclusos para sentença.

É o relatório. Decido.

Enfrentando o mérito da pretensão deduzida em juízo, tem-se que a questão controvertida residente nos autos cinge-se à existência de posse justa, ou injusta, da parte acionada sobre o imóvel objeto da lide, assim como a consumação da prescrição aquisitiva, na modalidade especial urbana.

Compulsando-se os autos, depreende-se que a parte autora postulou a proteção possessória embasada exclusivamente na alegação de propriedade sobre o bem objeto da lide.

Sucede que, nos termos do art. 561, do CPC, a ação de reintegração de posse possui como requisitos a demonstração da posse, o esbulho e data de sua ocorrência, assim como a perda da posse.

No caso em apreço, além de não comprovar a propriedade sobre o bem em questão, o autor também não logrou êxito em demonstrar o exercício da posse sobre o imóvel, de sorte que não se mostra factível deferir a proteção possessória postulada.

A bem da verdade, após a instrução processual, com a oitiva das partes e das testemunhas, todos integrantes de um mesmo núcleo familiar, descortinou-se que a posse do imóvel objeto da lide foi transmitida à acionada pelo genitor, de sorte que tal bem, juntamente com outras propriedades rurais, integra o espólio deixado pelo falecimento do pai dos litigantes.

Nesse contexto, regula o direito entre as partes as normas relativas ao condomínio, consoante disciplina dos art. 1.791, parágrafo único c/c e art. 1.314 do CCB:

Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros.

Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos coerdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio.

Art. 1.314. Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la.

Além disso, é possível afirmar que, por força do princípio da saisine, há entre as partes clara situação de composse, conforme dicção do art. 1.199 do Código Civil:

Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores.

Como regra geral, nos casos de composse, todos os possuidores podem manejar ações possessórias contra terceiros, e também uns contra os outros, caso algum dos compossuidores vise a excluir a posse do outro.

No caso dos autos, convém repisar, a composse entre as partes decorre do direito sucessório, na condição de herdeiros. Pelo princípio da saisine, expresso no art. 1.784 do Código Civil, o herdeiro recebe, desde o momento da morte do autor da herança, o domínio e a posse dos bens. E, na forma do art. 1.206 do CCB, o sucessor a título universal (herdeiro) segue na posse de seu antecessor.

Impõem-se considerar, ainda, que o art. 1.199 do CC, reconhece o exercício concomitante da posse, no caso de indivisibilidade do bem. Não há, contudo, possibilidade de escolha, em sede de ação de reintegração de posse, entre a posse de um e de outro compossuidor, uma vez que ambas as posses são legitimadas.

Em tal contexto, sem que haja a individualização dos quinhões, não se tem como, diretamente, nesta ação de reintegração de posse, determinar a remoção da parte acionada em detrimento do direito de posse que também lhe assiste, devendo permanecer a situação fática existente, sobretudo porque originada, em princípio, de modo legítimo e de boa-fé, muito embora, futuramente haverá de ser limitada ao respectivo quinhão hereditário havido.

Nessa perspectiva, considerando a prova produzida, a improcedência do pedido se dá não pela qualidade de posse da parte acionada em detrimento do direito do outro compossuidor (autor), mas, sobretudo, diante da igualdade de direitos entre eles, em ponderação de valores que, por ora, confere maior relevo à manutenção da situação fática, até que solvida a delimitação dos respectivos quinhões nos autos do inventário.

Tal providência também se legitima diante da grande animosidade existente entre as partes, que já motivou desavenças, ameaças de parte a parte e registro de ocorrência na Delegacia de Polícia.

Por fim, no que concerne à alegação de usucapião como matéria de defesa, em que pese a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admitir de forma excepcional a possibilidade de usucapião de imóvel componente do acervo hereditário, declinada por herdeiro em detrimento dos demais, essa não parece ser a melhor solução para o caso.

De fato, o que se verifica, em verdade, é a existência de um problema de divisão dos quinhões hereditários, o qual não é regularizável pela via da ação de usucapião, devendo os herdeiros ajuizarem a competente ação de inventário, no âmbito do qual, estabelecidos os respectivos quinhões, poderão realizar a divisão igualitária dos bens componentes do espólio.

Posto isso, de acordo com as provas carreadas aos autos, e por tudo o mais que consta, JULGO IMPROCEDENTE o pedido deduzido na petição inicial. Outrossim, JULGO IMPROCEDENTE o pedido deduzido reconvenção. Por conseguinte, extingo a fase de conhecimento, com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do CPC/15.

Outrossim, diante da recíproca sucumbência (art. 86 NCPC), condeno ambas as partes a arcarem com as custas processuais, na proporção de metade para cada parte, e honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, observada a mesma proporção das custas, que arbitro em R$ 1.000,00, corrigidos monetariamente pelo IGP-M a contar desta data, ante a natureza da demanda, o trabalho exigido e o pequeno valor da condenação, observados os parâmetros do art. 85 NCPC, vedada a compensação com base no art. 85, § 14, do NCPC, cuja exigibilidade fica suspensa por litigarem ao abrigo da gratuidade judiciária (art. 98, § 3º, do CPC/15), que ora defiro.

Oportunamente, arquivem-se os autos.

P.R.I.

Itabuna (Ba), 09 de...

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