Itabuna - Vara de inf�ncia e juventude

Data de publicação18 Outubro 2023
Gazette Issue3435
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE E EXEC. DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE ITABUNA
SENTENÇA

8003481-63.2023.8.05.0113 Procedimento Comum Infância E Juventude
Jurisdição: Itabuna
Interessado: V. C. B.
Advogado: Eleontina Meneses Santos Braga (OAB:BA7670)
Advogado: Ricardo Santos Pinto (OAB:BA22970)
Interessado: P. D. A. À. S. D. S. P. E. -. P.
Interessado: T. A. B.
Interessado: E. D. B.
Custos Legis: M. P. D. E. D. B.

Sentença:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE E EXECUÇÕES DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE ITABUNA

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SENTENÇA
Processo 8003481-63.2023.8.05.0113
Classe PROCEDIMENTO COMUM INFÂNCIA E JUVENTUDE (1706)
Assunto [Seção Cível]
Autor INTERESSADO: V. C. B., THADEU ANDRADE BRASILEIRO
Réu INTERESSADO: PLANO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE DOS SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS - PLANSERV, ESTADO DA BAHIA

Valentina Cruz Ribeiro, menor impúbere, representada por seu genitor, ajuizou ação cominativa e indenizatória contra o PLANSERV (Estado da Bahia, conforme adiante se verá), nos termos da inicial de id 383524617, instruídas com documentos que vão desde o id 383524618 ao evento 383524632).

Em síntese, na condição de beneficiária do PLANSERV, alega encontrar-se internada em estado grave em unidade hospitalar pediátrica local, acometida de quadro infeccioso, apresentando, há quinze dias, quadro de distonia em membros superiores e inferiores (problema no sistema nervoso responsável por controlar o movimento muscular) com desmaio e hipotonia (crise convulsiva e perda de força progressiva). Após o internamento e realização de diversos exames, o médico assistente solicitou ao Planserv, nas datas de 24, 25 e 26 de abril de 2023, os seguintes procedimentos: (a) transferência, da paciente/impetrante com urgência para Hospital Especializado para continuação da investigação; (b) vaga em enfermaria e transporte de ambulância básica (motorista e enfermeiro); (c) realização de exames de ressonância magnética de coluna torácica e lombar/eletroneuromiografia de membros/videoeletroencefalograma de 24 horas. O pedido de autorização foi encaminhado pelo hospital desde a data de 24 de abril de 2023, mas, até o presente, o requerido não se manifestou. Com efeito, requer a condenação do ente acionado ao pagamento de danos morais e, inclusive antecipadamente, seja o PLANSERV compelido a disponibilizar os serviços, no prazo de 24h, sob pena de pagamento de multa.

O pedido foi inicialmente dirigido ao Juízo da Fazenda Pública, o qual declinou a competência a este Juízo (id 383659784).

Liminar concedida.

Sem audiência de conciliação em razão da insistente recusa em não transacionar.

Contestação formulada afirmando que se trata de plano de autogestão e que as regras já estão previstas dentro das normativas devidas, não podendo ser alteradas por vontade dos beneficiários. Inaplicável, portanto, a Lei 8078/90. Aponta também a inexistência de ilícito a justificar a condenação por dano moral.

Despacho determinando a especificação da prova a ser produzida, sem requerimentos.

Ministério Público se manifestou nos autos.

É o relatório. Decido.


A demanda está preparada para ser sentenciada, uma vez que as provas produzidas até o momento deixam a causa madura para conhecimento adequado do litígio, ressaltando que intimadas as partes sobre a produção de prova específica não houve requerimento. Ademais, a norma em vigência determina que deve a parte, no momento da inicial e contestação, especificar as provas que pretendem produzir, o que não foi cumprido.

O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, positivado no art. 1º, III da CRFB/88, possui carga muito forte de abstração, o que, inicialmente poderia comprometer a efetividade de certos direitos constitucionais. Entretanto, há, dentro do princípio narrado, um núcleo insindicável que protege o bem mais preciso que é a vida.

Todos os princípios jurídicos, mormente constitucionais, nada obstante sua abstração, possui carga relevante de eficácia, mesmo que negativa, proibindo o legislador ou administrador de praticar atos contrários.

Nesse particular, a autora Ana Paula de Barcelos, em brilhante obra sobre a eficácia do princípio da dignidade da pessoa humana, ressalta que o referido princípio possui pelo menos eficácia positiva quando se trata de cuidar do mínimo existencial.

Não se trata de cuidar com regalias da saúde da autora, mas de proteger pessoa hipossuficiente economicamente da morte, diminuindo o fosso de desigualdade social gerada pela péssima distribuição da renda e pior ainda emprego de verba pública.

Em Estado neoliberal, como aparenta ser o brasileiro, a hipossuficiência financeira desequilibra a perspectiva de prestação de serviços de saúde, remetendo ao pobre todas as dificuldades para garantia de saúde básica, o que precisa de adequação judicial da situação exposta.

O tema preocupa quando a máquina judiciária é colocada em posição de favorecimentos e direcionamentos a hospitais ou laboratórios específicos, e esse é o calcanhar de aquiles, que certamente demanda uma investigação adequada do julgador, sem desconhecer que a judicialização da saúde vem sendo elevada com o passar dos anos, criando situações embaraçosas de violações na ordem de atendimento no sistema.

Entretanto, a falência da saúde pública é revelada não somente em serviços de péssima qualidade, mas de comprometimento sério no atendimento das demandas, embora se reconheça que há pessoas extremamente comprometidas com esse sistema.

A carga constitucional de efetividade ao direito à saúde não pode ser simplesmente desmoralizada, e demandas que se caracterizam pelo tom urgente precisam certamente de maior atenção e comprometimento, sob pena de subversão de uma sistema político que se estrutura basicamente na proteção do ser humano e sua dignidade.

É neste particular que se cabe afastar a articulação do princípio da reserva do possível, uma vez que não se pode eliminar a eficácia dos comandos de proteção à saúde, sob pena de atingir em última análise o direito à vida. Assim, a doutrina e jurisprudência pacíficas entendem pela incompatibilidade do princípio da reserva do possível nos casos envolvendo vida e saúde da pessoa, direitos fundamentais inegociáveis.

Trata-se de criança, cliente do sistema único de saúde, que possui a doença descrita no laudo médico, necessitando da providência informada pelo profissional que assinou o laudo, não havendo qualquer controvérsia sobre a necessidade do Jovem e a providência desejada.

A providência de exame não foi disponibilizada ao Infante no primeiro, diante das dificuldades estatais já relatadas outrora por seus representantes, exigindo esforço conjunto para o sucesso da empreitada, que depende de vaga a ser disponibilizada pelo Estado e autorização do Planserv.

A prova produzida é madura no sentido de apontar a necessidade da providência, objeto da demanda, e a inércia estatal, não havendo necessidade de prosseguir com a instrução para aprofundamento da prova, carecendo de impulso judicial para efetivação do direito fundamental à saúde e, por certo, à vida. Presente o dano à saúde e a consequente providência médica a ser adotada, o que descreve a procedência do pedido.

A providência desejada pela parte tem previsão no rol de atendimento aos beneficiários, conforme confessa em manifestação: "Ressaltamos que o Planserv possui cobertura para ressonância magnética de coluna torácica e lombar, eletroencefalograma dos quatro membros, mas não possui cobertura videoeletroencefalograma de 24 horas.".

Ocorre que, mesmo com a liminar deferida, e com a demora na realização do procedimento, a parte Autora resolveu realizar o exame por sua própria conta, o que é autorizado por Lei. E dessa forma, suprida a necessidade contida no pedido por ação da própria parte Autora cabe converter a obrigação de fazer em perdas e danos.

Contudo, há uma questão essencial a ser resolvida na presente demanda, que seria a inovação do pedido formulado inicialmente, para realização de outro exame em outra parte do corpo.

O novo exame (EXAME DE RESSONÂNCIA NUCLEAR MAGNÉTICA DE PELVE, com sedação), que este Magistrado teria concedido liminar, não é mero desdobramento dos exames pedidos na inicial.

Reconhece em sentença que não se pode inovar o pedido já ultrapassada a fase de contestação e também instrutória, sob pena de violação do princípio do dispositivo e do devido processo legal.

Assim, a liminar deve ser cassada por equívoco processual, devendo a parte Autora providenciar o manejo de demanda para esse novo pedido.

Por fim, há também pedido de dano moral.

A análise da configuração de dano moral exige a presença de elementos essenciais.

A relação jurídica travada pelas partes tem natureza contratual, com peculiaridades, e as violações contratuais exigem um comportamento acima dos limites que justifiquem um ato de rescisão.

A parte Ré reconhece que o pedido inicial tem previsão de cobertura assistencial em saúde e nada justifica a recusa do exame, lançando a família em uma via crucis para que tenha seu direito contratual reconhecido.

Evidentemente são horas ou dias em peregrinação para atendimento de uma saúde fragilizada.

O comportamento da parte Ré representa violação da legítima expectativa da parte em ter seu direito atendimento conforme cobertura contratual, e essa ação da parte Ré vai além da quebra contratual, mas importa em grave imposição de perda do tempo livre da parte Autora, com incertezas e angústias profundas...

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