Itua�u - Vara crime, j�ri, execu��es penais, inf�ncia e juventude

Data de publicação27 Novembro 2023
Gazette Issue3460
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL DE ITUAÇÚ
INTIMAÇÃO

0000347-87.2012.8.05.0134 Ação Penal - Procedimento Sumário
Jurisdição: Ituaçu
Reu: Alfredo Silva Costa
Advogado: Helconio Brito Moraes (OAB:BA46718)
Vitima: Keila Da Silva Santos
Autor: Ministério Público Do Estado Da Bahia
Testemunha: Maria Amália Da Silva
Testemunha: Márcia Aparecida Oliveira Nascimento
Testemunha: Eliana Silva Santos Carvalho

Intimação:

I – RELATÓRIO.

1. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA ofereceu denúncia contra de ALFREDO SILVA COSTA, já qualificado no auto, imputando-lhe a prática da conduta tipificada no artigo artigo 129, § 9º, e 217-A, na forma do art. 71, todos do Código Penal.

2. A peça acusatória narra que: “no dia 19 de maio deste ano de 2012, por volta das 09h30min, o denunciado acima qualificado ofendeu dolosamente a integridade corporal de sua companheira, a infante Keila da Silva Santos, causando-lhes as lesões descritas na prova material de fls. 13, fato ocorrido defronte ao terminal rodoviário deste Município de Ituaçu - BA. Segundo o apurado, naquela data, o imputado, sentindo ciúmes ao perceber que uma pessoa não identificada olhava para a vítima, e esta também olhou para o rapaz, iniciou uma briga com a mesma, desferindo-lhe socos na barriga e em seu rosto, causando-lhe fratura no maxilar, além de empurrar sua cabeça contra a grade de proteção de uma igreja evangélica situada no local. Consta, ainda, do manancial apuratório, que o inculpado, continuadamente, há cerca de um ano até a data do fato, mantinha conjunções carnais com a vítima, aproveitando-se da vulnerabilidade da mesma”.

3. Constam os seguintes elementos: a) Inquérito policial; b) Documento de identificação da vítima; c) Laudo de exame corporal da vítima e laudo de exame complementar.

4. Denúncia recebida no Id. 169968697, em 05/10/2014 (CPP, arts. 41, 396 e 594, § 1º).

5. O réu apresentou resposta à acusação, comparecendo aos autos espontaneamente (Id 169968700) (CPP, 396-A).

6. Em razão da renúncia do patrono, foi constituído defensor dativo, que apresentou nova defesa.

7. Decisão interlocutória de mérito, extinguindo a punibilidade quanto ao crime do art. 129, § 9º, do CP.

8. Designada e realizada audiência de instrução, onde foi ouvida a vítima e as testemunhas arroladas. O réu não foi localizado para intimação, sendo decretada sua revelia (CPP, art. 400).

9. Não foram requeridas diligências (CPP, art. 402).

10. Memoriais do Órgão Ministerial, no qual o Parquet pugnou pela condenação do réu nas penas do art. 217-a do CP (CPP, art. 403, §3º).

11. Memoriais do réu, onde pugnou pela absolvição do denunciado em razão do consentimento, por atipicidade material.

12. É o relatório. Fundamento e decido. O princípio da motivação judicial (CF, art. 93, IX), impõe ao Poder Judiciário o dever de apontar as razões que levaram a adoção de determinada decisão, expondo as justificativas e os motivos fático-jurídicos. Assim, observando o princípio da razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII), passo a fundamentar.

II. FUNDAMENTAÇÃO.

13. Cuida-se de ação penal pública incondicionada, em que se busca apurar a responsabilidade criminal de ALFREDO SILVA COSTA, pela prática do delito do art. 217-a do CP.

14. Exclama-se uma necessidade de analisar minuciosamente o contexto do fato narrado na denúncia que imputa ao réu o cometimento do crime de estupro de vulnerável.

15. Transcrevo o tipo penal:

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

16. Da leitura atenta das entrelinhas do mencionado artigo, cumulado com o entendimento jurisprudencial e doutrinário vigente, infere-se que foi firmada uma presunção de que o menor de quatorze (14) anos não adquiriu maturidade suficiente para a vida sexual, sendo neste contexto irrelevante falar ou tratar acerca do consentimento, seja para a prática de atos libidinosos ou para a prática de conjunção carnal.

17. Reitera-se e ressalta-se que não é desconhecido por este Juízo o entendimento dos Tribunais Superiores acerca da presunção absoluta de vulnerabilidade dos menores de quatorze (14) anos para o crime de estupro.

18. Todavia, compreende-se também este Juízo a imprescindibilidade de uma análise do caso concreto paralela e anuente aos ditames constitucionais, pois, admitir a vulnerabilidade absoluta da suposta vítima, e, consequentemente, não se ater às circunstâncias de cada caso, seria aplicar ao acusado uma responsabilidade penal objetiva.

19. Noutras palavras, haveria uma inobservância no que diz respeito a ocorrência ou não de violação do bem jurídico tutelado/princípio da lesividade/tipicidade material. A culpabilidade do acusado torna-se precocemente presumida, sobressaindo e confrontando o princípio constitucional da presunção de inocência, o qual rege e norteia a persecução penal.

20. Pensando no ordenamento jurídico como um todo e na intervenção mínima do Estado, o direito penal deve ser lido e compreendido como a “Ultima ratio”, ou seja, deve ser “usado” como o último recurso, último instrumento em situação de punição. De igual forma, a presunção absoluta da vulnerabilidade (da qual se entende a necessidade), confronta e contrapõe diversos ditames que tangenciam o direito penal.

21. Menciona-se então que, aplicar exclusivamente o fator etário para configurar o delito do artigo 217-A, do CP, viola princípios difundidos e consolidados no ordenamento jurídico pátrio, dos quais destacam-se como principais o princípio da dignidade da pessoa humana e a liberdade para dispor do seu próprio corpo.

22. A lei penal deve acompanhar a evolução social, não podendo assim ignorar condutas socialmente aceitas, o bem jurídico tutelado não é mais o costume de 1940, década de criação do código.

23. O termo dignidade sexual, hoje bem jurídico tutelado pelo Código Penal, deve ser lido em todos os aspectos, a dignidade também deve ser compreendida como a liberdade, haja vista que a sociedade atual se antecipa cada vez mais o início da vida sexual.

24. Por essa e outras razões, deve-se analisar cada caso como único, de forma que a generalização e o caráter absoluto não se tornam um empecilho para a adequação social e liberdade sexual de jovens que de forma orientada e consciente escolhem antecipar a vida sexual.

25. Trago à baila entendimento jurisprudencial pátrio que converge com a linha cognitiva discutida, in verbis:

RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DENÚNCIA REJEITADA PELO JUÍZO DE ORIGEM. RECEBIMENTO PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. VÍTIMA COM 12 ANOS E RÉU COM 19 ANOS AO TEMPO DO FATO. NASCIMENTO DE FILHO DA RELAÇÃO AMOROSA. AQUIESCÊNCIA DOS PAIS DA MENOR. MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DA ADOLESCENTE. DISTINGUISHING. PUNIBILIDADE CONCRETA. PERSPECTIVA MATERIAL. CONTEÚDO RELATIVO E DIMENSIONAL. GRAU DE AFETAÇÃO DO BEM JURÍDICO. AUSÊNCIA DE RELEVÂNCIA SOCIAL DO FATO. 1. A Terceira Seção, no julgamento do REsp 1.480.881/PI, submetido ao rito dos recursos repetitivos, reafirmou a orientação jurisprudencial, então dominante, de que é absoluta a presunção de violência em casos da prática de conjunção carnal ou ato libidinoso diverso com pessoa menor de 14 anos. 2. A presente questão enseja distinguishing quanto ao acórdão paradigma da nova orientação jurisprudencial, pois, diante dos seus componentes circunstanciais, verifica-se que o réu possuía, ao tempo do fato, 19 anos de idade, ao passo que a vítima, adolescente, contava com 12 anos de idade, sendo que, do relacionamento amoroso, resultou no nascimento de um filho, devidamente reconhecido, fato social relevante que deve ser considerado no cenário da acusação. 3. "Para que o fato seja considerado criminalmente relevante, não basta a mera subsunção formal a um tipo penal. Deve ser avaliado o desvalor representado pela conduta humana, bem como a extensão da lesão causada ao bem jurídico tutelado, com o intuito de aferir se há necessidade e merecimento da sanção, à luz dos princípios da fragmentariedade e da subsidiariedade" (RHC 126.272/MG, Relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 1/6/2021, DJe 15/6/2021). 4. Considerando as particularidades do presente feito, em especial, a vontade da vítima de conviver com o recorrente e o nascimento do filho do casal, somados às condições pessoais do acusado, denotam que não houve afetação relevante do bem jurídico a resultar na atuação punitiva estatal. 5. "A manutenção da pena privativa de liberdade do recorrente, em processo no qual a pretensão do órgão acusador se revela contrária aos anseios da própria vítima, acabaria por deixar a jovem e o filho de ambos desamparados não apenas materialmente, mas também emocionalmente, desestruturando e entidade familiar constitucionalmente protegida" (REsp n. 1.524.494/RN e AREsp 1.555.030/GO, Relator Ministro Ribeiro Dantas, julgado em 18/5/2021, DJe 21/5/2021). 6. Recurso especial provido. Restabelecimento da decisão que rejeitou a denúncia. (REsp n. 1.977.165/MS, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), relator para acórdão Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 16/5/2023, DJe de 25/5/2023.)

26. Em sede de inquérito, a vítima informou: “que, conheceu ALFREDO há aproximadamente um ano, isto quando passou a estudar nesta cidade, contudo, conheceu o mesmo...

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