Jaguaquara - Vara c�vel

Data de publicação26 Junho 2023
Número da edição3358
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JAGUAQUARA
INTIMAÇÃO

8002789-23.2022.8.05.0138 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Jaguaquara
Autor: Genivaldo De Jesus Coelho
Advogado: Liniquer Louis Sousa Andrade (OAB:BA43482)
Advogado: Tarcilo Jose Araujo Farias (OAB:BA36301)
Reu: Banco Bradesco Sa
Advogado: Paulo Eduardo Prado (OAB:BA33407)

Intimação:

I – RELATÓRIO

Trata-se de ação indenizatória proposta por GENIVALDO DE JESUS COELHO em face do BANCO BRADESCO S/A, partes qualificadas.

Sustenta na inicial, em síntese, que é titular da conta benefício 6822-5, agência 2060, exclusiva para receber os proveitos da sua aposentadoria. Entretanto, ao consultar o extrato bancário percebeu que o réu estava promovendo descontos não autorizados de rubrica “CESTA B. EXPRESSO”, conforme valores estão demonstrados nos extratos bancários anexos (id.238477342).

Por isso, ante a impossibilidade da requerida em resolver a lide na esfera administrativa, requereu, dentre outros pedidos, a condenação da ré à reparação por danos morais e materiais, além de custas processuais e honorários advocatícios.

Juntou documentos e valorou a causa.

Decisão interlocutória proferida concedendo os efeitos da tutela pleiteada (id.242116784).

Citado, o réu apresentou contestação (id.275850092), alegando que não houve falha na prestação dos serviços e que o autor utiliza os serviços de saque, transferência de valores que somente é possível através de conta corrente, mediante contraprestação de pagamento de tarifa. E, ainda, que foram prestadas todas as informações devidas quando da abertura da conta.

Por fim, frisa que devido a inexistência de nexo causal entre o suposto dano alegado e a conduta da ré, não há lesão sofrida, e, por conseguinte, não há falar em indenização por danos morais e materiais.

Impugnação à contestação (id.294588903).

Anunciado o julgamento antecipado de mérito (id.323890077).

Vieram-me os autos conclusos.

É o relatório. Fundamento e decido.

II – FUNDAMENTOS

A questão posta em juízo dispensa dilação probatória, por se tratar de matéria exclusivamente de direito, impondo, destarte, o julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

Trata-se de uma típica relação de consumo, onde a ré figura como fornecedora e a utilização pela parte autora do serviço como destinatária final, aplicando-se portanto, as disposições dos arts. e do Código de Defesa do Consumidor.

Neste esteio, tendo em vista que o consumidor é parte hipossuficiente dessa relação, cabível a inversão do ônus da prova, nos moldes do art. 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor.

Insta salientar, que a inversão do ônus da prova não implica vitória automática do consumidor se não comprovados minimamente os fatos alegados ou se as provas dos autos revelarem o contrário.

O cerne da controvérsia consiste em verificar se houve, por parte da ré, falha na prestação de serviços com relação à cobrança de tarifas bancárias na conta do autor por alegação que por se tratar de conta corrente é necessário que haja contraprestação aos serviços prestados.

Conforme súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça é aplicado o Código de Defesa do Consumidor nas operações bancárias.

Súmula 297. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Nada obstante, sabe-se que a Resolução nº 3.402/2006 do Banco Central - ao disciplinar a prestação de serviços de pagamento de salários, proventos, soldos, vencimentos, aposentadorias, pensões e similares - impõe restrições à cobrança de tarifas pelas instituições financeiras contratadas apenas para essa finalidade. De acordo com o art. 2º da referida legislação, a vedação à cobrança de tarifas aplica-se, inclusive, às operações de:

(1) saques, totais ou parciais, dos créditos;

(2) transferências dos créditos para outras instituições, quando realizadas pelos beneficiários pelo valor total creditado, admitida a dedução de eventuais descontos com eles contratados para serem realizados nas contas de que trata o art. 1º, relativos a parcelas de operações de empréstimo, de financiamento ou de arrendamento mercantil.

Da mesma forma prevê o art. 2º, inciso I, da Resolução nº 3.919/2010 a vedação da cobrança de tarifas pela prestação de serviços bancários essenciais a pessoas naturais relativos a “conta de depósitos à vista”, sendo eles:

(a) Fornecimento de cartão com função débito;

(b) Fornecimento de segunda via do cartão referido na alínea "a", exceto nos casos de pedidos de reposição formulados pelo correntista decorrentes de perda, roubo, furto, danificação e outros motivos não imputáveis à instituição emitente;

(c) Realização de até quatro saques, por mês, em guichê de caixa, inclusive por meio de cheque ou de cheque avulso, ou em terminal de autoatendimento;

(d) Realização de até duas transferências de recursos entre contas na própria instituição, por mês, em guichê de caixa, em terminal de autoatendimento e/ou pela internet;

(e) Fornecimento de até dois extratos, por mês, contendo a movimentação dos últimos trinta dias por meio de guichê de caixa e/ou de terminal de autoatendimento;

(f) Realização de consultas mediante utilização da internet;

(g) Fornecimento do extrato de que trata o art. 19;

(h) Compensação de cheques;

(i) Fornecimento de até dez folhas de cheques por mês, desde que o correntista reúna os requisitos necessários à utilização de cheques, de acordo com a regulamentação em vigor e as condições pactuadas; e

(j) Prestação de qualquer serviço por meios eletrônicos, no caso de contas cujos contratos prevejam utilizar exclusivamente meios eletrônicos;

Analisando o caso dos autos, percebo através da leitura dos extratos bancários juntados tanto pelo autor quanto pelo réu (id.238477342, 275850096, 275850097, 275850098 e 275850099), que a conta mantida em seu nome era utilizada apenas para as finalidades que comportam isenção legal nos termos das Resoluções nº 3.402/2006 e 3.919/2010 do BACEN. Explico.

Verifico que além da percepção dos proventos de sua aposentadoria, a conta mencionada na exordial era utilizada apenas para a realização de poucos saques e transferências. Tratam-se todos de serviços que comportam isenção legal nos termos da Resolução nº 3.402/2006 do Banco Central.

Acrescenta-se a isso o fato de que o demandante é pessoa idosa e de baixa instrução, o que demonstra a sua situação de vulnerabilidade frente à instituição financeira.

Nessa linha, compulsando aos autos percebo que a requerida não se desincumbiu do dever de apresentar o instrumento contratual responsável por viger a relação estabelecida entre as partes, a fim de demonstrar que o princípio da informação foi devidamente efetivado ao consumidor. Deste modo, o réu não demonstrou fatos modificativos ou extintivos do direito do autor (art. 373, inciso II, CPC).

Assim, forçoso concluir que restou configurada a prática do ilícito da instituição financeira em proceder aos descontos mencionados, devendo ser restituídos os valores cobrados a título de serviços isentos nas Resoluções nº 3.402/2006 e 3.919/2010 do BACEN.

Impondo-se a restituição, em dobro, dos valores que lhe foram cobrados indevidamente a este título, nos termos do parágrafo único do art. 42 do CDC, eis que nitidamente configurada a má-fé (dolo) em induzir a parte contratante a erro. Ora, pela simples resistência do réu no âmbito administrativo e judicial é possível observar o intuito de levar o consumidor a crer que não faria jus a contratação de conta com isenção de serviços que são considerados como essenciais pelo Banco Central.

Nessa linha, a indenização por dano moral é devida.

Quanto ao dano moral, resta caracterizada a ilicitude dos atos da ré, o que conduz à procedência dos pedidos autorais, amoldando ao disposto nos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil, verbis:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

De mais a mais, se tratando de consumidor, incide, na espécie, o disposto no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, o qual imputa responsabilidade objetiva ao fornecedor do serviço, com fundamento na teoria do risco do empreendimento. Por conseguinte, dispensa-se a demonstração do elemento subjetivo da conduta, cabendo ao interessado comprovar tão somente a ocorrência do fato lesivo, o dano sofrido e o respectivo nexo de causalidade.

Na...

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