João dourado - Vara cível

Data de publicação01 Junho 2023
Número da edição3344
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS DE JOÃO DOURADO
INTIMAÇÃO

8000874-83.2020.8.05.0145 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: João Dourado
Autor: Elenildes Santos Da Silva
Advogado: Nilson Salum Cardoso Dourado (OAB:BA30292)
Reu: Itau Unibanco S.a.
Advogado: Francisco Antonio Fragata Junior (OAB:SP39768-A)
Advogado: Luis Carlos Monteiro Laurenço (OAB:BA16780)

Intimação:

Dispensado o relatório, segundo regra ínsita do artigo 38, da Lei Federal nº 9.099/95.

FUNDAMENTO E DECIDO.

No que se refere à audiência de instrução, entendo que a resolução da lide envolve questão de ordem meramente documental, estando o processo maduro para a sentença, conforme artigo 355, inciso I, do CPC, razão pela qual dispenso a sua realização.

O feito comporta julgamento antecipado porque a matéria posta em discussão é unicamente de direito. Conheço, por conseguinte, diretamente da demanda, proferindo o julgamento antecipado do mérito, nos termos do artigo 355, incisos I e II, do código de processo civil, como ensina Cândido Rangel Dinamarco:

A razão pela qual se permite a antecipação do julgamento do mérito é invariavelmente a desnecessidade de produzir provas. Os dois incisos do art. 330 desmembram essa causa única em várias hipóteses, mediante uma redação cuja leitura deve ser feita com a consciência de que só será lícito privar as partes de provar quando as provas não forem necessárias ao julgamento” (Instituições de Direito Processual Civil, v. III, 2a ed., Malheiros, p.555).

É o caso dos autos, vez que desnecessária dilação probatória, por conta da suficiência da prova documental coligida aos autos para a solução dos pontos controvertidos.

PRELIMINARMENTE

REGULARIZAÇÃO DO POLO PASSIVO: Defiro o pedido preliminar, no tocante à retificação do polo passivo da presente ação. À Secretaria para as anotações necessárias e devida correção na capa dos autos.

AUSÊNCIA DE PRETENSÃO RESISTIDA – FALTA DE PREQUESTIONAMENTO SOBRE A REGULARIDADE DO CONTRATO NOS CANAIS ADMINISTRATIVOS DO BANCO RÉU OU DO INSS: A ação se mostra útil, necessária e adequada para atingir o fim almejado, não sendo necessário a tentativa de resolução do conflito administrativamente. Com efeito, fica rejeitada a preliminar arguida.

INADMISSIBILIDADE DO PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CIVEL: Ao contrário do que afirma a acionada, a causa não é complexa, podendo ser solucionável pela simples verificação dos documentos jungidos aos autos, eis que os elementos probatórios trazidos pelas partes são suficientes e aptos para o julgamento do feito. Portanto, rejeito a preliminar alegada.

DO MÉRITO

Trata-se de ação na qual a parte autora requer que seja declarada a inexistência de débito, em relação ao contrato de empréstimo objeto da lide ao legar que não o realizou com a consequente indenização por danos materiais e morais. Em defesa, a parte ré sustenta o afastamento da responsabilidade civil.

O julgamento da presente causa envolve a análise de normas do campo civilista e consumerista. Para aplicação das referidas normas, imperioso invocar a teoria do diálogo das fontes, que permite a aplicação simultânea, coerente e coordenada das plúrimas fontes legislativas. Destarte, conclui-se que tais normas não se excluem, pelo contrário, se complementam para chegar a uma solução justa ao processo.

Assim sendo, muito embora a relação travada entre as partes envolvidas no processo seja de consumo, na forma dos arts. e 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, serão ponderados na presente sentença diversos aspectos da norma civilista, sobretudo os que envolvem a teoria do negócio jurídico e o direito contratual.

Quanto ao ônus da prova, dispõe o art. 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor, que constitui direito básico do consumidor a efetiva prevenção e reparação dos danos morais e materiais, assim como preceitua no inciso VIII, o direito a facilitação da defesa, inclusive com a inversão do ônus da prova a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente. Por tais razões, restou invertido o ônus da prova.

Nesse passo, no campo civil, a condição de idoso, os assim definidos pela lei como os maiores de 60 (sessenta) anos, por si só, não leva a incapacidade jurídica, ou seja, não há previsão legal de incapacidade de tal sujeito do direito.

Sabemos que a denominada escada ponteana pode ser vista sobre três aspectos: o plano da existência, o plano da validade e o plano da eficácia.

O plano da existência é marcado pela presença dos seguintes elementos constitutivos, a saber: manifestação de vontade; agentes emissores da vontade; objeto; e forma. Sem tais elementos o negócio jurídico sequer pode nascer.

O plano da validade, por seu turno, complementa o plano da existência, sendo caracterizado pelos seguintes elementos integrativos: a manifestação deve ser livre, consciente e de boa-fé; os agentes emissores da vontade devem ser capazes e legitimados para o negócio; o objeto (conteúdo) deve ser lícito, não contrário a lei, aos bons costumes e a boa-fé; e a forma pela qual a declaração de vontade se exterioriza deve ser a prescrita em lei (art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir).

Em sede de direito contratual, os seus mais importantes princípios são: autonomia da vontade – significa ampla liberdade de contratar, liberdade que a pessoa tem para regular os próprios interesses. Têm as partes a faculdade de celebrar ou não contratos, sem qualquer interferência do Estado. Tal princípio teve o seu apogeu após a Revolução Francesa, com a predominância do individualismo e a pregação da liberdade em todos os campos, inclusive no contratual; consensualismo – decorre da moderna concepção de que o contrato resulta do consenso, acordo de vontades, independentemente da entrega da coisa.

O contrato tem uma função social, sendo veículo de circulação da riqueza e centro da vida dos negócios. O Código Civil de 2002 tornou explícito que a liberdade de contratar só pode ser exercida em consonância com os fins sociais do contrato, implicando os valores primordiais da boa-fé e da probidade (art. 421 e 422).

A boa-fé objetiva não é um fato, é uma norma, mais precisamente um princípio, ou seja, o fundamento hermenêutico da regra, segundo o qual os comportamentos humanos devem estar pautados em um padrão ético de conduta. É a norma que impõe que o comportamento seja em conformidade com um padrão ético de conduta. Pouco importa se o sujeito está ou não de boa-fé íntima. A boa fé objetiva é o princípio da boa-fé.

Contrariamente, a boa-fé subjetiva é um fato da vida. Alguém acredita que está agindo licitamente. Por exemplo, o caso da posse, “o possuidor de boa-fé tem direito aos frutos”.

Se a pessoa pratica um ato e esse seu ato gera a outra pessoa uma expectativa de coerência na sua condução, atuação, se ele vier a frustrar isso, esse comportamento será contraditório. É a proibição do "venire contra factum proprium". Vedação de comportamento contraditório com as próprias atitudes.

A concepção social do contrato apresenta-se, modernamente, como um dos pilares da teoria contratual. Tem por escopo promover a realização de uma justiça comutativa, aplainando as desigualdades substanciais entre os contraentes.

Se no processo de interpretação da lei o aplicador (juiz) encontrar lacunas, omissões, deverá se valer dos métodos de integração na seguinte ordem: a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Tais regras que expressam os chamados princípios gerais do direito, de caráter genérico, orientam a compreensão do sistema jurídico, em sua aplicação e integração, estejam ou não incluídos no direito positivo. Muitos deles passaram a integrar o nosso direito positivo, como o princípio de que ninguém pode valer-se da própria torpeza (venire contra factum proprium).

O princípio da autonomia contratual deixa evidente também que não se exigem formalidades sacramentais para a exteriorização dos negócios jurídicos, salvo se a lei assim determinar, como na compra e venda de imóveis.

Destarte, em matéria de empréstimos consignados, o idoso está sujeito a todos os invocados princípios. Não pode ajuizar ação visando a invalidação de negócio jurídico se consentiu em utilizar o numerário depositado, uma vez que sua vontade no negócio jurídico foi manifestada sem qualquer imposição de forma.

Com efeito, é comezinho neste Juizado o exercício de pretensões que têm como causa de pedir a invalidade do negócio jurídico pela ocorrência de fraude, que não se presume, sem qualquer prova. Salienta-se que a simples possibilidade de inversão do ônus da prova nas relações de consumo não obsta o idoso de comprovar a fraude, que, repito, não se presume. As partes, segundo mandamento estabelecido pelo princípio da boa-fé objetiva, devem agir com probidade, com cooperação para atingir os fins determinados no negócio jurídico.

Pois bem. Cabia ao réu a comprovação de que houve uma...

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