Joguei a toalha!': a realidade de executivas que decidiram retornar ao lar: uma discussão sobre o fenômeno opt-out

AutorSally Joice Reis, Carolina Maria Mota-Santos, Marcella Barbosa Miranda Teixeira
CargoPrograma de Pós-Graduação em Administração PUC Minas/Programa de Pós-Graduação em Administração PUC Minas/Programa de Pós-Graduação em Administração PUC Minas
Páginas8-26
Sally Joice Reis • Carolina Maria Mota-Santos • Marcella Barbosa Miranda Teixeira
R C A
Esta obra está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso.
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RESUMO
O presente artigo tem o objetivo de compreender os motivos
que levaram algumas executivas a desistirem da carreira e
optarem pelo retorno ao lar. Trata-se de estudo com uma
abordagem qualitativa, por meio do método história de vida.
A coleta de dados ocorreu a partir de entrevista em profun-
didade, utilizando como sujeitos duas mulheres executivas. A
pesquisa traz uma reexão sobre esse posicionamento de de-
sistência, uma vez que historicamente há uma divisão entre os
sexos, aspecto que permite compreender porque as mulheres
encontram muitos desaos no que diz respeito à ascensão e à
manutenção de suas carreiras no mundo corporativo. A grande
contribuição deste estudo foi a de avançar nos motivos que
levam ao fenômeno opt-out, pouco explorado na literatura.
Palavras-Chave: Mulheres; Executivas; Retorno ao lar; Fenô-
meno opt-out.
ABSTRACT
The present study aims at understanding the reasons that
led some executives to give up their careers and choose to
return home. It is a qualitative study through the life history´s
methodology. The data collection took place from an in-depth
interview using as subjects two executives women. The resear-
ch brings to a reection about this position of abandonment,
since, historically, there is a division between the sexes, aspect
that allows to understand why women nds many challenges
with respect to the ascension and the maintenance of its race in
the corporate world. The great contribution of this study was to
advance in the reasons that result in the opt-out phenomenon,
little explored in the literature.
Key-words: Women; Executives; Return home; Opt-out phe-
nomenon.
JOGUEI A TOALHA!”: a realidade de executivas
que decidiram retornar ao lar. Uma discussão
sobre o fenômeno opt-out
“THROW IN THE TOWEL!”: reality of executives women that decide
to return home. Discussion about opt-out phenomenon
Sally Joice Reis
Programa de Pós-Graduação em Administração PUC Minas.
email: sally.reis@arcelormittal.com
Carolina Maria Mota-Santos
Programa de Pós-Graduação em Administração PUC Minas.
email: cmmotasantos@gmail.com
Marcella Barbosa Miranda Teixeira
Programa de Pós-Graduação em Administração PUC Minas.
email: marcellabmt@gmail.com
DOI: https://doi.org/10.5007/2175-8077.2020.e77598
Recebido em: 19/07/2019
Aceito em: 20/11/2020
Revista de Ciências da Administração • v. 22, n. 56, p. 8-26, Abril. 2020 9
R C A
“JOGUEI A TOALHA!”: a realidade de executivas que decidiram retornar ao lar. Uma discussão sobre o fenômeno opt-out
1 INTRODUÇÃO
Muitos direitos foram adquiridos pelas mulhe-
res e melhoraram suas condições de trabalho, mas o
que se pode perceber é que ainda persiste o retrato
da divisão sexual do trabalho, ou seja, as construções
sociais do homem e da mulher resultaram na con-
cepção de que há atividades consideradas masculinas
e outras femininas, o que signica, historicamente,
que às mulheres é atribuída a responsabilidade pela
reprodução e cuidado ao lar, enquanto que do homem
se espera a manutenção das despesas nanceiras da
casa (NEVES, 2013).
Devido ao árduo caminho percorrido pelas
mulheres em busca de ascensão prossional, reconhe-
cimento e valorização, da dupla ou tripla jornada de
trabalho, este estudo busca compreender os motivos
que levaram algumas executivas a desistirem da car-
reira e optarem pelo retorno ao lar. Esse fenômeno é
denominado opt-out e normalmente uma das causas
é a impossibilidade de conciliar a vida prossional
com a pessoal, devido à exagerada sobrecarga de
trabalho (MAINIERO; SULLIVAN, 2006; POWELL;
BUTTERFIELD, 2013).
Verica-se que a maternidade ainda é conside-
rada pelas organizações brasileiras como uma ques-
tão negativa na carreira das mulheres (ALMEIDA;
SANTOS, 2018). Somado a isso, não há políticas por
parte das organizações para o impacto do trabalho na
maternidade, como uma exibilização no regime de
trabalho e uma melhora na qualidade no ambiente
de trabalho (OLIVEIRA et al, 2011). Assim, cabe
destacar a importância do presente estudo e indagar
a ocorrência do fenômeno opt-out, uma vez que es-
tamos falando de mulheres muito qualicadas e que
investiram fortemente em suas carreiras.
Para tal, serão descritas e analisadas duas
histórias de vidas de executivas, apresentando as
semelhanças e particularidades de cada uma delas,
com o objetivo de compreender a vivência dessas
entrevistadas, além de responder o seguinte proble-
ma de pesquisa: Por que algumas mulheres com alta
escolaridade e bem-sucedidas decidiram desistir de
sua carreira e retornaram ao lar?
2 HERANÇAS PATRIARCAIS
E AS MULHERES NO
MERCADO TRABALHO
O trabalho muitas vezes teve conotação diferen-
te para a mulher e para o homem de classe média/alta.
Enquanto o homem exercitava seu domínio sobre o
público para viver e sustentar sua família, a mulher
se restringia ao espaço privado com os cuidados aos
lhos e ao lar (GONÇALVES, 2000). Essa distinção
de papéis pode ser explicada pela herança patriarcal,
ressaltada por diversos autores como a dominância
masculina diante da feminina, em que a mulher é
representada como submissa, frágil e dependente. Já
o homem é o detentor da autoridade e do poder. Esse
fenômeno social se fez e faz presente em diversas esfe-
ras: familiar, social, econômica, política e prossional
(GOULART; PAPA FILHO, 2013).
De acordo com Perrot (1970), a história por
muito tempo se esqueceu das mulheres, pois eram
vistas exclusivamente como um objeto para car
restrita ao lar com a função de procriar, amamentar
e cuidar. Porém, os movimentos feministas foram um
marco da luta das mulheres contra a subordinação e
todas as formas de opressão impostas pela sociedade
patriarcal. No Brasil, com uma conjuntura de um
processo de industrialização e urbanização acelerados,
a partir da década de 1970, as mulheres começaram
a participar da atividade econômica (HOFFMAM;
LEONE, 2004; ALMEIDA, 2012).
Nos últimos anos da década de 1970, elas pude-
ram ingressar nas universidades e, dessa forma, tive-
ram alternativas diferentes da vida doméstica, o que
auxiliou a inserção feminina no mercado de trabalho.
Aliado a isso, passaram a controlar a natalidade, a se
tornarem mães mais tarde e a terem menos lhos ou
sequer serem mães. Tais fatores geraram transforma-
ções no mercado de trabalho e nas relações familiares
(LOSADA; ROCHA-COUTINHO, 2007).
Esse cenário abriu espaço para a intensicação
da participação feminina na esfera pública. O tra-
balho para as mulheres passou a ter outro sentido:
deixou de ser uma questão de necessidade econômica
e passou a ser uma necessidade de armação da iden-
tidade, pois ela passou a compreender que, ao desem-
penhar sua atividade prossional, poderia também
ocupar o papel de um sujeito ativo na sociedade, em

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