A profissionalização no jornalismo e o mercado de trabalho para mulheres no estado de São Paulo

AutorPaula Melani Rocha
CargoGraduada em jornalismo pela Fundação Cásper Líbero e em Ciências Sociais pela USP
Páginas1-10

Graduada em jornalismo pela Fundação Cásper Líbero e em Ciências Sociais pela USP; mestre em Sociologia Política pela UFSCar; doutora em Sociologia Política pela UFSCar; cursou pós-graduação lato sensu em multimídia pela Universidade de Harvard/EUA. Professora e coordenadora do curso de jornalismo das Faculdades COC.

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Introdução

A carreira de jornalismo registrou um aumento na feminização após o seu processo de profissionalização, iniciado no século passado, mais especificamente a partir do final da década de 30, com a criação das associações e sindicatos, passando pelo surgimento dos cursos de credenciamento, exigência do diploma para o exercício da profissão, divisão por editorias nas redações até as inovações tecnológicas. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo foi criado em 1937. O primeiro curso superior de jornalismo é de 1947. Em 17 de outubro de 1969, em plena ditadura militar, foi aprovado o Decreto-Lei 972, com alterações posteriores (Decreto 65.923 e Decreto 83.284) regulamentando a profissão e consagrando a exigência de curso superior de jornalismo para o exercício da profissão. Em seguida, aumentou a remuneração salarial e foram criadas editorias, acarretando maior especialização do profissional por áreas, acrescido da exigência de um profissional com maior conhecimento de todo o conjunto de uma redação. Houve também mudanças tecnológicas, como a introdução dos computadores nas redações, o surgimento do jornalismo on-line e da televisão na internet. Todas essas transformações vêm alterando o perfil do profissional, além de propiciarem a inserção de mulheres nas redações. Mas o Page 2 processo de profissionalização não está sedimentado, quando comparado a carreiras como medicina e direito.

A obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo está sob disputa legal no âmbito da justiça.1 Os registros profissionais obtidos por estudantes de jornalismo e pessoas que atuavam na área durante essa querela estão ameaçados. Esses registros são conhecidos como precários e estão sendo cassados pela Fenaj - Federação Nacional dos Jornalistas - e pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo. Dados do Sindicato mostram que no estado de São Paulo foram solicitados aproximadamente 4 mil registros precários e no país mais de 6 mil registros. Devido ao fato de o jornalismo não ser uma profissão consolidada, houve uma facilidade no ingresso feminino de profissionais, possibilitando uma competição equiparada entre os gêneros pelo mercado de trabalho.

Dados levantados pelo Ministério do Trabalho revelaram que em 1986 as mulheres jornalistas representavam 36% do quadro de profissionais do país. Em 1996, a proporção era de quatro profissionais do sexo feminino para cada grupo de 10 profissionais. No entanto, dentro da carreira, ainda há diferenças entre os gêneros com relação ao piso salarial, à jornada de trabalho, às funções e aos veículos de comunicação.

A profissionalização e sua especialização estão interligadas ao processo histórico, às mudanças políticas, sociais e econômicas. A história das profissões tem seu marco no industrialismo capitalista do século XIX, quando aumentou a competitividade no campo de trabalho. As ocupações começaram a buscar um lugar seguro na economia e a disputa levou à criação de associações e instituições próprias. Surgiram as associações, os credenciamentos, a licença, o registro e os cursos superiores. São esses fatores que elevaram o status de algumas ocupações para a esfera da profissão.

A história da feminização do jornalismo no estado de São Paulo

A feminização no jornalismo também se iniciou no século passado, depois da crise econô- mica de 1930. No início, foi um movimento tímido e isolado. O ingresso de mulheres na carreira de forma acentuada só foi ocorrer na década de 1970. RIBEIRO (1998) documentou a história da imprensa paulista, no período de 1937 a 1997, e da fundação do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo. Um dos aspectos citados na obra é a participação da mulher na carreira de jornalismo. Em 1937 era praticamente inexistente mulheres atuando no jornalismo:

Uma das situações mais tenebrosas que havia na imprensa de São Paulo (e do Brasil), em 1937, era a discriminação contra a mulher. As empresas jornalísticas eram pensadas e construídas como ambiente de sauna brega: só para homem. Nem havia banheiro feminino. No "Estadão", à noite, quando fervia o trabalho jornalístico, as mulheres não eram aceitas nem na mesa telefônica. Havia mulheres como telefonistas mas só durante o dia. À noite, um homem é que operava. Mulher podia ser telefonista, faxineira ou servia para fazer o café: circulava na área de serviço. (RIBEIRO 1998, p.31)

Nos jornais, na década de 30, segundo dados oficiais do Sindicato de São Paulo, trabalhavam mulheres que escreviam crônicas e crônica social, mas a pioneira na reportagem foi Margarida Izar. Em 1937, os jornalistas não tinham jornada de trabalho definida, não havia prérequisitos delimitando o ingresso na atividade, não tinham férias, previdência social e nem piso salarial. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo foi fundado no dia 15 de abril de 1937, em uma reunião à noite no Centro do Professorado Paulista. Participaram 52 jornalistas, entre eles Margarida Izar, a única mulher fundadora da entidade. Nesta reunião, foram definidos os critérios que a pessoa tinha que seguir para se associar ao sindicato:

1) Ser maior de 14 anos; Page 3

2) Ser assalariado de empresa jornalística;

3) Exercer efetivamente a função de redator, revisor ou fotógrafo.

O estatuto elaborado ainda em abril de 1937 dizia que as atividades do Sindicato eram:

1) Reunir os que exercem a profissão de jornalista como empregados;

2) Promover a melhoria das condições de trabalho;

3) Colaborar com o Estado na solução dos problemas referentes à profissão;

4) Defender os associados entre os Poderes Públicos;

5) Coordenar os direitos e deveres recíprocos entre empregados e patrões;

6) Oferecer serviço jurídico e de beneficência.

Em 30 de novembro de 1938, com a assessoria dos sindicatos de jornalistas de São Paulo e Rio de Janeiro, o Governo Getulio Vargas criou a primeira legislação sobre a profissão de jornalistas no Brasil. O Decreto-Lei 910 determinou que a jornada de trabalho seria de cinco horas, tanto de dia como de noite. Ela poderia ser contratualmente prolongada para sete horas, ocorrendo compensação financeira. O decreto também diz que o jornalista precisa ser brasileiro (nato ou naturalizado), maior, não pode ter antecedente criminal, nem estar respondendo a processos na Justiça. O pedido dos sindicatos de exigir formação universitária para o exercício da profissão, protegendo o candidato e a categoria, não foi inserido no decreto.

A licença para a Escola Superior de Jornalismo saiu em setembro de 1939 e foi concedida pelo Conselho Nacional de Educação. Ela seria sediada no Rio de Janeiro, mas nunca chegou a funcionar. A primeira escola de jornalismo, instalada em 1947, foi a Fundação Casper Líbero. A faculdade de jornalismo da Universidade de São Paulo (USP), Escola de Comunicação e Arte (ECA) foi criada em 1966, em São Paulo.

Em 1953, segundo números do Sindicato, havia em São Paulo 1.500 jornalistas atuando. No entanto, os dados do Ministério do Trabalho estampam outra realidade: 5.028 jornalistas registrados. O registro dos jornalistas feitos pelo Ministério era concedido mediante falsos atestados de emprego (RIBEIRO, 1998).

Em São José do Rio Preto, uma mulher destacou-se no jornalismo: Dinorath do Valle. Aos poucos, o número de mulheres foi aumentando. Outro nome de destaque é o da jornalista da Folha de S.Paulo Isa Leal. Ela participou da greve dos jornalistas de 1961, que durou cinco dias e terminou no dia 5 de dezembro. Esta greve consagrou o piso profissional estabelecido pelo Tribunal Regional de São Paulo de dois salários mínimos na época. As empresas recorreram ao Tribunal Superior do Trabalho e perderam. Acordo publicado em Brasília, em 1964, dizia que era legítimo o TRT fixar um salário-piso profissional.

Na década de 1950, a Editora Abril contrata a primeira jornalista da empresa: Micheline Gaggio Frank, de origem francesa. Quando Micheline começou, só havia mais três funcionários na editora. Depois...

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