Lauro de freitas - 1� vara criminal

Data de publicação29 Junho 2023
Número da edição3361
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE LAURO DE FREITAS
INTIMAÇÃO

0501683-74.2019.8.05.0150 Ação Penal - Procedimento Ordinário
Jurisdição: Lauro De Freitas
Autoridade: Ministério Público Do Estado Da Bahia
Reu: Fabiano Marques Cordeiro
Advogado: Carolina Santiago Macedo (OAB:BA59045)
Vitima: Em Segredo De Justiça

Intimação:

Vistos.

Trata-se de Ação Penal ajuizada pelo Ministério Público da Bahia em face de FABIANO MARQUES CORDEIRO, imputando a este a prática do crime de lesão corporal no ambiente doméstico (art. 129, §9º do CP), no contexto da lei 11.340/06.

Narra a denúncia que o acusado, no dia 19/12/2018, por volta das 22h na rua Dr. Barreto, nº 203, apt 502, Pitangueiras nesta cidade, agrediu fisicamente sua então companheira Gislaine Brito de Matos apertando-lhe fortemente a região do pescoço, causando-lhe equimoses nas clavículas direita e esquerda e nos antebraços direito e esquerdo, conforme exame pericial.

Denúncia recebida em 8/3/2019 (id. 307434988).

Audiência de instrução e julgamento ocorrida em 30/5/2022, oportunidade na qual foi ouvida a vítima, uma testemunha de defesa e, em seguida, procedido ao interrogatório do réu.

Em seguida, em alegações finais por memoriais, o órgão ministerial pugnou pela condenação do réu, nos termos da denúncia.

Por sua vez, também em alegações finais orais, a defesa pugnou pela absolvição do réu por insuficiência de provas e, subsidiariamente, caso condenado, que a pena seja aplicada em seu mínimo legal.

Virtualizados os autos, vieram estes conclusos para julgamento.

É o relatório. Passo a fundamentar e decidir.

De início, é importante consignar que o feito tramitou de forma absolutamente regular, em conformidade com o devido processo legal e o sistema acusatório.

Neste feito, há prejudicial de mérito que, em razão de seu acolhimento, cria óbice intransponível para o exame do mérito: a prescrição.

É importante ressaltar que a prescrição, por ser instituto expresso em norma cogente e representar matéria de ordem pública - cuja consequência é a extinção da punibilidade (art. 107, IV do CPB) - pode ser alegada a qualquer tempo e grau de jurisdição, bem como reconhecida de ofício pelo estado nas mesmas circunstâncias (art. 61 do CPP).

Com efeito, do contexto fático processual, infere-se que a pretensão punitiva estatal estará prescrita ao final do processo se considerada a hipotética sentença condenatória, em juízo não meramente de prognose, mas, sobretudo, em um juízo de eficiência visando imperativos de economia processual.

É que, conforme o histórico processual, constata-se que do recebimento da denúncia (8/3/2019) até a presente data já se passaram mais de 4 anos.

A prescrição virtual permite ao magistrado antever que, em caso de condenação e aplicação da pena mínima, ao final da marcha processual, eventual pena imposta seria alcançada pela prescrição retroativa.

Trata-se de uma criação jurisprudencial e doutrinária que poupa a utilização do maquinário estatal de realizar uma persecução penal inútil e onerosa, tendo em vista a perda do direito material de punir. Assim, se o Poder Judiciário não for capaz de, dentro do prazo que lhe é designado, dar fiel cumprimento à lei, não deverá ocupar-se inutilmente naquele caso já prescrito virtualmente e possibilitar que com outros o mesmo ocorra.

Por outro lado, é certo que existe entendimento dos tribunais de convergência no sentido de ser incabível o reconhecimento da prescrição virtual, sobretudo expresso em verbete sumular do Superior Tribunal de Justiça (nº 438) a vedação da aplicação do instituto. O fundamento central da corte para este entendimento é a inexistência de previsão legal do instituto.

Ocorre que este órgão judicial possui entendimento contrário a tal enunciado, pois, de fato, embora haja ausência de expressa previsão em lei, tal fundamento não se mostra suficiente para a exclusão de instituto que atende a diversos outros princípios caros da república, tais como o da Razoável Duração do Processo, Princípio da efetividade da prestação jurisdicional e Segurança Jurídica.

A legalidade é garantia estatal conferida aos cidadãos em face ao Estado e, a meu sentir, não pode ser utilizada como argumento de autoridade isolado para excluir para estes o direito de ter extinta uma pretensão penal acusatória cuja utilidade se perdeu com o passar do tempo, até porque este confiou que o Estado o processaria criminalmente em demanda com razoável duração e dentro do prazo prescricional, nos termos garantidos constitucionalmente.

Assim, tem-se que tal justificativa nada mais é do que um argumento de autoridade e, inequivocamente, consolida interpretação inconstitucional e inconvencional, notadamente em se tratando do poder judiciário Brasileiro, onde o número de processos é imensamente maior ao número de Juízes para julgá-los em definitivo, pois ignora a existência de outros postulados e princípios igualmente fundamentais que permitem entendimento em contrário.

A propósito, não se pode olvidar que o controle de convencionalidade é missão constitucional de todos os juízes, independentemente do grau de jurisdição. Dessa forma, além de constitucionalizada (art. 5º LXXVIII da CRFB/88) a garantia da razoável duração do processo possui, igualmente, previsão convencional (art. 8.º, 1, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos) e presta obséquio ao princípio da segurança jurídica.

Sobre tal garantia, pede-se vênia para colacionar abaixo os ensinamentos de MARINONI (2018, p. 1119), com os meus grifos:

O direito à duração razoável do processo não constitui e não implica direito a processo rápido ou célere. As expressões não são sinônimas. A própria ideia de processo já repele a instantaneidade e remete ao tempo como algo inerente à fisiologia processual. A natureza necessariamente temporal do processo constitui imposição democrática, oriunda do direito das partes de nele participarem de forma adequada, donde o direito ao contraditório e os demais direitos que confluem para organização do processo justo ceifam qualquer possibilidade de compreensão do direito ao processo com duração razoável simplesmente como direito a um processo célere. O que a Constituição determina é a eliminação do tempo patológico – a desproporcionalidade entre duração do processo e a complexidade do debate da causa que nele tem lugar. Nesse sentido, a expressão processo sem dilações indevidas, utilizada pela Constituição espanhola (art. 24, segunda parte), é assaz expressiva. O direito ao processo justo implica sua duração em “tempo justo”.

Dentro desta perspectiva de se cotejar a garantia fundamental da duração razoável do processo como um trâmite processual adequado à complexidade da demanda, mutatis mutandis, tal garantia encontra respaldo concretizador no instituto da prescrição que, sob a perspectiva criminal, é calculada exatamente de acordo com a complexidade do caso penal subjudice, pois encontra na pena máxima cominada ao delito o seu parâmetro.

E, como cediço, no direito penal pátrio, pretensões estatais punitivas de crimes com penas máximas maiores prescrevem após lapsos temporais maiores, por uma presunção relativa de que tais crimes exige um esforço maior do estado sob a perspectiva temporal.

O critério da definição do lapso prescricional é a pena máxima, por conveniência legislativa e, exatamente, pela mera possibilidade de após o devido processo legal a pena concreta coincidir com o máximo abstratamente previsto. Veja-se que tal possibilidade – de uma pena concreta no patamar máximo in abstrato - é tida apenas como uma possibilidade, pois a instrução processual penal pode revelar conclusão diversa.

Nesse sentido, a fixação de uma pena mínima também é uma possibilidade. E na espécie é mais que uma mera possibilidade, tratando-se de um fato crível: o réu é tecnicamente primário e ostenta bons antecedentes, o grau de sua culpabilidade é normal, nada há nos autos para analisar sua personalidade, sendo que nenhuma das circunstâncias judiciais merecem valoração significativa para aumentar a pena base para além do mínimo legal, valendo lembrar a ausência de agravantes ou causas de aumento.

Assim, por mais bem instruído que esteja este feito, dificilmente a pena definitiva a ser aplicada, em caso de condenação, não seria inferior a 1 ano.

Desta forma, o legislador, ao definir o critério do cômputo da prescrição, optou por parametrizar a pena máxima, desconsiderando a pena mínima, mesmo quando ambas as possibilidades, in concreto, sejam possíveis, exatamente para viabilizar o julgamento em um prazo razoável.

Nessa linha, pede-se vênia para colacionar, abaixo, entendimento firmado por BUSATO (2020, p. 864), com os meus grifos:

a solução para o caso seria tomar, de entrada, a pena mínima como referência já para a prescrição da pretensão punitiva, abolindo-se completamente a ideia de uma prescrição retroativa. Isso obrigaria, sem lugar a dúvidas, a que houvesse uma aceleração nos processos e logo, uma demanda por mais Juízes, Promotores de Justiça e Defensores públicos, providência que já há muito é reclamada pelas próprias instituições, com total razão.

Contudo, não se pode olvidar que para além da legalidade estrita, o direito penal deve, sobretudo, prosseguir em conformidade com as...

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