Lauro de freitas - 2ª vara da fazenda pública

Data de publicação09 Fevereiro 2023
Número da edição3273
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª V DE FAZENDA PÚBLICA DE LAURO DE FREITAS
SENTENÇA

8003490-16.2020.8.05.0150 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Lauro De Freitas
Autor: Dilza Pereira Matos Da Silva
Advogado: Joana Maria Voss Salinas (OAB:BA27824)
Reu: Estado Da Bahia
Reu: Bahia Secretaria De Saude Do Estado
Reu: Santa Casa De Misericordia Da Bahia
Advogado: Candice De Almeida Rocha Ledo (OAB:BA17653)

Sentença:

DILZA PEREIRA MATOS DA SILVA, devidamente qualificada, ajuizou AÇÃO DECLARATÓRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM RESSARCIMENTO DAS DESPESAS MÉDICO-HOSPITALARES EM DOBRO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS em face do ESTADO DA BAHIA, do PLANSERV e do HOSPITAL SANTA IZABEL, também qualificados, aduzindo que foi diagnosticada de Câncer CID PRINCIPAL: CI82 - Neoplasia Maligna do Colon Ascendente e precisou ser operada com urgência.

Relata que em 20/12/2019, às 12h53min, foi internada no Hospital Santa Izabel para a realização da cirurgia de COLECISTECTOMIA PARCIAL POR VIDEOLAPAROSCOPIA. No entanto, afirma que o Planserv não autorizou o procedimento, razão pela qual, como única solução para amenizar o sofrimento, foi indicada a cirurgia de COLECTOMIA PARCIAL POR VIDEOLAPAROSCOPIA, sendo obrigada a desembolsar o montante de R$ 9.000,00 (nove mil reais) para a sua realização.

Pontua que o procedimento por videolaparoscopia é menos invasivo, sendo indicado para o caso da autora, eis que possui 77 anos de idade e histórico de doenças.

Ressalta que se dirigiu anteriormente ao Hospital Aeroporto, onde foi informada que não havia médico especialista para realizar o procedimento cirúrgico. Por esse motivo, foi encaminhada ao Hospital Santa Izabel, que também atende pelo Convênio PLANSERV, onde foi negada a autorização, obrigando a autora a custear o procedimento.

Requer que o acionado seja condenado a proceder ao imediato ressarcimento das despesas médico-hospitalares, decorrentes da cirurgia de urgência de PPP COLECTOMIA PARCIAL POR VIDEOLAPAROSCOPIA, que totalizam o valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais), em dobro, bem como a pagar-lhe indenização por danos morais no importe de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).

Com a inicial, documentos foram acostados.

Indeferida a gratuidade, a autora requereu a reconsideração da decisão.

Deferido, provisoriamente, o pedido de justiça gratuita.

Citado, o Estado da Bahia ofereceu contestação. Sustenta que inexiste dever de ressarcimento do Estado decorrente de cirurgia custeada por particular em rede privada, pois ausentes os requisitos da responsabilidade civil. Alega que não restou configurado o nexo causal, eis que a autora optou por contratar médico cirurgião, sem prova da prévia negativa do Planserv. Afirma que a autora não provou as alegações no sentido de que teria ido ao hospital do aeroporto e de lá teria sido encaminhada ao Hospital Santa Isabel, bem como que no Hospital Santa Isabel teria sido negado atendimento pelo planserv e que teria sofrido dano moral. Argumenta que os documentos juntados pela autora demonstram que não houve negativa de internamento no hospital ou da realização de exames, bem assim que o médico foi da escolha da autora e a cirurgia não foi de urgência. Ressalta que o documento bancário, que demonstra pagamento de R$9.000,00 a CG4 Médicos Associados, vai datado de 20/12/2019, mesmo dia da cirurgia e que, curiosamente, o médico que emite o relatório é sócio da empresa que recebeu o pagamento. Logo, aponta que tudo leva a crer que a autora escolheu com antecedência seu cirurgião, não recebeu qualquer negativa do Planserv e fez o pagamento em dinheiro no dia do ato cirúrgico. Roga pela improcedência da demanda.

A SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DA BAHIA, mantenedora e administradora do Hospital Santa Izabel ofereceu contestação. Preliminarmente, aventa a sua ilegitimidade passiva ad causam, aduzindo que os argumentos e fatos narrados pela autora tratam dos dissabores vivenciados junto à sua médica, que cobrou de forma direta os valores para a realização do procedimento. Pontua que tais fatos não tem relação com os equipamentos, acomodações ou funcionários da ré, que foram cobertos pelo plano de saúde. Anota que apesar da autora afirmar que a unidade realizou uma cobrança, conforme recibo de transação juntado para comprovar o gasto no valor de R$ 9.000,00, verifica-se que o pagamento foi realizado em favor da CG4 MÉDICOS ASSOCIADOS e não à unidade de saúde. Frisa que o médico não é funcionário da unidade e realizou a cobrança de forma direta à paciente. No mérito, reitera a alegação de ausência de responsabilidade, arguindo não poder responder por cobranças realizadas por terceiros. Pleiteia a improcedência dos pedidos.

A parte autora replicou.

As partes não requereram a produção de outras provas.

Vieram-me os autos conclusos.

I. Das preliminares.

A) Da ausência de personalidade jurídica do PLANSERV.

A ação foi intentada contra o Planserv, o Estado da Bahia e o Hospital Santa Izabel.

A Lei Estadual nº 9.528/2005, que reorganiza o sistema de assistência à saúde dos servidores públicos do Estado da Bahia, cujo ingresso do servidor é facultativo (art. 1º, § 2º), prevê a edição de decreto regulamentando o sistema, o que foi feito mediante o Decreto Estadual nº 9.552/2005.

O Planserv – Plano de Custeio dos Servidores Públicos Estaduais é ente despersonalizado, eis que nos termos do Regulamento aprovado pelo Decreto Estadual nº 9.552/2005 constitui um conjunto de serviços de saúde no âmbito da promoção, prevenção, assistência curativa e reabilitação, prestados diretamente pelo Estado ou através de instituições credenciadas (art. 1º); sendo gerido pela Coordenação de Assistência à Saúde do Servidor - CAS, órgão da SAEB' (art. 2º).

Nessa toada, o Planserv é órgão destituído de personalidade jurídica o que indica a ausência de capacidade para ser parte no processo.

Em verdade, o Planserv é gerido por unidade integrante da Administração Pública Direta Estadual.

Desse modo, procedo à devida retificação do polo passivo da lide, para conste o Estado da Bahia, gestor do Planserv.

B) Da inaplicabilidade do CDC.

Em regra, os contratos de seguro de saúde inserem-se nas relações tuteladas pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que o segurado é o destinatário final de serviço prestado pela acionada, do que se depreende os conceitos de fornecedor e consumidor trazidos pelos arts. e da Lei n° 8.078/90.

O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Bahia tinha entendimento sumulado (súmula 9), no sentido de que o Código de Defesa do Consumidor seria aplicável na relação travada entre o PLANSERV e os seus filiados. Contudo, o enunciado foi cancelado pelo Tribunal Pleno em 31/10/2018, em atenção à Súmula 608 do STJ, que dispõe: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão".

Vejamos o quanto decidido pelo TJBA no julgamento da Apelação de n 0009832-93.2010.8.05.0001:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. ESTADO DA BAHIA. PLANSERV. ENTIDADE DE AUTOGESTÃO. INAPLICABILIDADE DO CDC. SÚMULA 608 DO STJ. ABUSIVIDADE. ART. 421 E 422 DO CÓDIGO CIVIL. TRATAMENTO MÉDICO. VÍTIMA DE PROJÉTIL DE ARMA DE FOGO. TRATAMENTO INTENSIVO DE FONOAUDIOLOGIA E EXAMES DE IMAGEM IMPRESCINDÍVEIS À SAÚDE DO AUTOR. RECUSA INJUSTIFICADA DE AUTORIZAÇÃO. DIREITOS FUNDAMENTAIS. SAÚDE COMO BEM DA VIDA. INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO BENEFICIÁRIO DO PLANO. DANO MORAL COMPROVADO. VALOR FIXADO EM CONSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. REFORMA EX OFFICIO EM RELAÇÃO AO PARÂMETRO DE FIXAÇÃO. ART. 85, §2º E 3º DO CPC. HONORÁRIOS RECURSAIS. APLICAÇÃO. ART. 85, §11 CPC.

1. A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça aprovou a Súmula 608 com o seguinte enunciado: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.

2. Inobstante seja o caso de inaplicabilidade das disposições insertas no CDC visto ser o apelante entidade de autogestão, devem ser observados os princípios da função social do contrato e da boa-fé contratual, previstos nos art. 421 e 422 do Código Civil.

3. Vale pontuar que inobstante o Apelado seja beneficiário o procedimento somente foi autorizado pelo PLANSERV no decorrer da ação, após a concessão da tutela antecipada, restando, assim a falha na prestação do serviço e sua abusividade, ante a demora no atendimento, impondo o dever de indenizar.

4. O direito à reparação do dano depende da concorrência de três requisitos, que estão delineados no artigo 186 do CC/02, razão pela qual, para que se configure o ato ilícito, será imprescindível que haja: (a) fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária, negligência, imperícia ou imprudência; (b) ocorrência de um dano patrimonial ou moral; (c) nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente. Presença de nexo causal verificado entre a conduta negligente da apelante e o prejuízo causado ao apelado.

5. O valor da indenização fixado a título de danos morais encontra-se em consonância com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, quantia que se revela significativa em face das peculiaridades do...

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