A legitimação da intervenção judicial em políticas públicas e o princípio da transformação social

AutorRafael Moreno Rodrigues Silva Machado, Juvêncio Borges Silva
CargoUniversidade de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP, Brasil/Universidade de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP, Brasil
Páginas37-55
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Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
A LEGITIMAÇÃO DA INTERVENÇÃO JUDICIAL EM POLÍTICAS
PÚBLICAS E O PRINCÍPIO DA TRANSFORMAÇÃO SOCIAL
THE LEGITIMIZATION OF JUDICIAL INTERVENTION IN PUBLIC POLICIES
AND THE PRINCIPLE OF SOCIAL TRANSFORMATION
Rafael Moreno Rodrigues Silva MachadoI
Juvêncio Borges SilvaII
Resumo: O artigo aborda o histórico da cidadania brasileira
com o objetivo de contextualizar as disposições constitucionais
definidoras de direitos sociais. Examina-se a legitimidade
jurídica da abordagem sobre as políticas públicas por Poderes
ou órgãos não inicialmente designados para tanto, utilizando-
se a metodologia de revisão bibliográfica. Posteriormente,
defende-se a existência de uma obrigação constitucional de
redução das desigualdades e progresso social, denominado
de princípio da transformação social, o qual condiciona a
atuação estatal e impõe a obrigação de implementação de
políticas públicas. Em seguida, são examinadas as principais
críticas à intervenção judicial em políticas públicas, quais
sejam, crítica da teoria da constituição, filosófica, operacional
e financeira. Ao final, defende-se que as críticas servem não
como impeditivo da intervenção, mas como parâmetros
mínimos de sua realização.
Palavras-chave: cidadania, desigualdade social,
transformação social, políticas públicas.
Abstract: In order to contextualize the constitutional
provisions that define civil rights, the article addresses the
history of Brazilian citizenship. e legitimacy of policy
intervention by Powers that are not initially designed to
intervene is examined, using the bibliographic review
methodology. Subsequently, it is said that there is a
constitutional principle of social development which results
in an obligation to reduce inequalities and social progress.
is constitutional principle conditions state action and
imposes an obligation to implement social policies. en,
the main criticisms of judicial intervention in public policies,
which are constitutional theory, philosophical, operational
and financial are examined. In the end it is argued that those
criticisms do not serve as an obstacle to judicial intervention,
but as minimum parameters for its implementation.
Keywords: citizenship, social inequality, social development,
social policies.
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v18i45.1280
Recebido em: 20.03.2023
Aceito em: 08.08.2023
I Universidade de Ribeirão Preto,
Ribeirão Preto, SP, Brasil. E-mail:
rafaelmoreno19@gmail.com
II U Universidade de Ribeirão Preto,
Ribeirão Preto, SP, Brasil. E-mail:
juvencioborges@gmail.com
Revista Direitos Culturais, Santo Ângelo, v. 18, n. 45, p. 37-55, maio/agos. 2023.
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1 Introdução
A
intervenção judicial em políticas públicas e seus limites são temas que vêm
recebendo atenção especial da doutrina e jurisprudência brasileiras1. Neste contexto,
sobressaem críticas sobre a legitimidade de tal intervenção, existindo críticas filosóficas, na teoria
da constituição e operacionais2. Além disto, o próprio conceito jurídico de políticas públicas é
impreciso, uma vez que não há uma definição legal ou constitucional de seus principais aspectos.
Neste contexto, o objeto principal deste artigo é examinar a legitimidade da intervenção
em políticas públicas diante de constatações fáticas e jurídicas na realidade brasileira. Sob o
prisma fático, contrapõem-se as críticas citadas à necessidade de intervenção diante da inação
estatal na promoção de direitos sociais e sobretudo na busca da erradicação das desigualdades
sociais no Brasil. Juridicamente, será averiguado se é possível extrair do texto constitucional uma
obrigatoriedade na intervenção judicial em políticas públicas após a inação do Poder executivo
e seus eventuais limites.
As críticas sobre a intervenção judicial em políticas públicas possuem relevância, na
medida em que podem estabelecer parâmetros para sua realização. No entanto, a aceitação de
uma impossibilidade de intervenção pode perpetuar o contexto de desigualdade social existente
na sociedade brasileira, bem como tornar irrealizável o projeto constitucional brasileiro pós-
redemocratização. Sendo assim, o exame da constitucionalidade deve “ter como norte uma teoria
histórico-factuais de cada Estado nacional. Nesse sentido, absorvidas as críticas ao modelo original-
dirigista da Constituição do Brasil, é preciso entender as especificidades do país”3.
O exame da realidade fática onde será aplicada a norma é, portanto, imprescindível para
a averiguação de sua legitimidade e o grau de intervenção judicial em políticas públicas.
Justifica-se a pesquisa em decorrência da necessidade de se perscrutar a existência de
alguma obrigatoriedade jurídica que dê fundamento legítimo à intervenção judicial em políticas
públicas. O problema examinado, por sua vez, é a legitimidade jurídica da abordagem sobre as
políticas públicas por Poderes ou órgãos não inicialmente designados para tanto. A metodologia
utilizada foi a da revisão bibliográfica. O método, por sua vez, é o hipotético-dedutivo.
2 As espécies de cidadania e a correlação com a experiência brasileira - a
cidadania insurgente e o déficit de cidadania
A noção de cidadania como elemento essencial para o estado nacional é experiência
recente na histórica ocidental, iniciando-se com o iluminismo e o desenvolvimento das cidades
e suas novas classes sociais, como a burguesia. O surgimento deste novo estrato social permitiu
a contraposição entre o estado de direito nascente o estado de privilégios ou de nascimento,
1 BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em direito In BUCCI, Maria Paula Dallari (org.).
Políticas Públicas: reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo, Saraiva, 2006.
2 BARCELLOS, Ana Paula de. Constitucionalização das políticas públicas em matéria de direitos fundamentais:
o controle político-social e o controle jurídico no espaço democrático In SARLET, Ingo Wolfgang e TIMM,
Luciano Benetti: Direitos Fundamentais orçamento e “reserva do possível”. Ed. Livraria do Advogado.
Porto Alegre, 2008 pp. 111-147
3 STRECK, Lênio Luiz e MORAIS, José Luiz Bolzan de in CANOTILHO, J.J. Gomes, et al. Comentários à
Constituição do Brasil. São Paulo, Almedina, 2013.

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