Lei de cotas: ação afirmativa para a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho

AutorCésar Eduardo Lavoura Romão e Denise De Stefano Guedes
Ocupação do AutorMestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Professor na Pós-Graduação de Governança Corporativa e Compliance da FMU. Instrutor do IN Movimento Inclusivo. Membro da Comissão de Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB/SP. / Pós-graduanda em Direito Digital e Proteção de Dados pela ESA/OAB. Integrante do grupo de estudos Empresas e ...
Páginas225-240
LEI DE COTAS: AÇÃO AFIRMATIVA PARA
A INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
NO MERCADO DE TRABALHO
César Eduardo Lavoura Romão
Mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Professor na Pós-Graduação de
Governança Corporativa e Compliance da FMU. Instrutor do IN Movimento Inclusivo.
Membro da Comissão de Direitos das Pessoas com Deciência da OAB/SP. Membro
do comitê jurídico da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down.
Advogado sócio do escritório Aversa Araújo Advogados, responsável pela área de
Inclusion Compliance.
Denise De Stefano Guedes
Pós-graduanda em Direito Digital e Proteção de Dados pela ESA/OAB. Integrante
do grupo de estudos Empresas e Direitos Humanos na Sociedade da Informação do
Mestrado da FMU. Instrutora do IN Movimento Inclusivo. Advogada, certicada em
Gestão de Riscos e Compliance pela FIA.
Sumário: 1. Os direitos humanos e as ações armativas no âmbito público – 2. A igualdade ma-
terial, a discriminação e o binômio inclusão-exclusão – 3. Os direitos fundamentais das pessoas
com deciência no Brasil – 4. O Estado como agente de desenvolvimento e da justiça social – 5.
Políticas públicas para a promoção dos direitos fundamentais da pessoa com deciência – 6.
Ações armativas e a postura ativa do Estado – 7. A legislação de incentivo à inserção da pessoa
com deciência no mercado de trabalho – 8. Lei de cotas (Art. 93 da Lei 8.213 de 24 de julho de
1991) – 9. Lei de licitações e contratos administrativos (Lei 14.133 de 1º de abril de 2021) – 10. Lei
do menor aprendiz (Lei 10.097 de 19 de dezembro de 2000) – 11. Lei de estágio (Lei 11.788 de 25
de setembro de 2008) – 12. Diretrizes nacionais sobre empresas e direitos humanos (Decreto 9.571
de 21 de novembro de 2018) – 13. Considerações nais – 14. Referências.
A igualdade de oportunidades para o ingresso ao mercado de trabalho e a pro-
gressão na carreira são direitos reivindicados por grupos de pessoas historicamente
discriminados em razão de suas características intrínsecas e imutáveis como gênero,
raça, etnia, orientação sexual, def‌iciência, classe social, entre outros.
A discriminação vivenciada desde o nascimento é limitadora do desenvolvi-
mento pleno desses indivíduos que são impossibilitados de competir em igualdade
de condições com os demais no mercado de trabalho.
Com o propósito de compensar disparidades, diversos países recorrem às polí-
ticas públicas de ação af‌irmativa por meio de “reserva de vagas”, “política de cotas”
ou “discriminação positiva”. A Lei de Cotas (art. 93 da Lei 8.213/91), assim como
outras em vigor no Brasil, é mecanismo que busca reduzir a desigualdade que as
pessoas com def‌iciência enfrentam no acesso ao trabalho.
A f‌inalidade deste texto é informar o leitor a respeito do direito fundamental
ao trabalho no âmbito global e doméstico e, para tanto, nossa jornada inicia com a
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CÉSAR EDUARDO LAVOURA ROMÃO E DENISE DE STEFANO GUEDES
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consolidação dos direitos humanos a partir do período pós Segunda Guerra e a sua
evolução no sentido de buscar assegurar a fruição do direito aos grupos de pessoas
que majoritariamente não concorrem por uma vaga nas mesmas condições que as
demais, especif‌icamente as pessoas com def‌iciência. Nesse sentido, o Brasil assumiu
o papel de protetor e promotor desses direitos ao incorporá-los à Constituição Fe-
deral e que resultou na promulgação de leis de incentivo ao ingresso de pessoas com
def‌iciência no mercado de trabalho, no âmbito público e privado.
1. OS DIREITOS HUMANOS E AS AÇÕES AFIRMATIVAS NO ÂMBITO
PÚBLICO
Os direitos humanos decorrem de um consenso universal de que todos são
merecedores de respeito, independente de diferenças biológicas, culturais, socioe-
conômicas, religiosas, étnicas e quaisquer outras que os distingam entre si.
Todos os seres humanos são singulares, diferenciados entre si e merecedores de
igual respeito, “como únicos entes no mundo capazes de amar, descobrir a verdade
e criar a beleza[...], em razão dessa radical igualdade, ninguém, nenhum indivíduo,
independente do gênero, etnia, classe social, grupo religioso ou nação pode af‌irmar-se
superior aos demais”1.
Em constante construção e evolução, entende-se por direitos humanos um
grupo de direitos protegido internacionalmente e resultante de lutas e confrontos
em prol de valores humanos universais.
Não há consenso a respeito de sua origem. Há correntes que apontam para a
vontade coletiva de protestar ante ameaças decorrentes de arbítrio e do nepotismo,
outras se fundamentam no pensamento protestante pós-reforma que defende a
separação entre Igreja e Estado, e há os que atribuem a uma origem simplesmente
histórica evolutiva universal. Independente da origem, a dignidade humana é o valor
básico para a existência dos direitos humanos.
Há inúmeros conceitos de dignidade humana. Immanuel Kant af‌irma: “[...] o
homem, em geral todo ser racional, existe como f‌im em si mesmo, não só como meio
para uso desta ou daquela vontade”2, ou seja, o ser humano é diferente dos demais
seres e não tem um preço como as coisas, portanto o seu valor está em si mesmo, em
sua própria existência e capacidades, daí a importância de que seus direitos sejam
sempre reaf‌irmados no tempo. Esse conceito
[...] é fruto de um longo processo sociocultural, denindo-se como o respeito mínimo à condição
de ser humano em cada momento histórico. É justamente esse respeito que impede que sua vida
ou sua integridade seja substituída por outro valor. Esta compreensão é fundamental para enten-
der a dignidade humana em todos os seus sentidos e alcance, [...] parece ser o único conceito
1. COMPARATO, Fábio Konder. A af‌irmação histórica dos direitos humanos. p. 13.
2. KANT, Immanuel. Fundamentos da metafísica dos costumes.
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