Lençóis - Vara crime, júri, execuções penais, infância e juventude

Data de publicação09 Maio 2022
Número da edição3092
SeçãoCADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL DE LENÇÓIS
INTIMAÇÃO

0000388-95.2015.8.05.0151 Ação Penal - Procedimento Ordinário
Jurisdição: Lençóis
Testemunha: Cleuton Lima Silva
Advogado: Etienne Costa Magalhães (OAB:BA11663)
Advogado: Roberta Correia Alves Ribeiro (OAB:BA33837)
Terceiro Interessado: Emily Silva Ferreira
Terceiro Interessado: Marineide De Jesus Silva
Terceiro Interessado: Lourivaldo Jesus Dos Santos
Testemunha: Ministerio Publico Do Estado Da Bahia - Lençois

Intimação:

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

VARA CRIMINAL DE LENÇÓIS



Processo: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) n°0000388-95.2015.8.05.0151
Órgão Julgador: VARA CRIMINAL DE LENÇÓIS
AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA - LENÇOIS
Advogado(s):
RÉU: CLEUTON LIMA SILVA:
Advogado(s):

SENTENÇA

Vistos e examinados.

Cuida-se de ação penal ofertada pelo MINISTÉRIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA em desfavor de CLEUTON LIMA SILVA, qualificado nos autos, imputando-se a prática de infração penal descrita no art. pela prática do crime previsto no art.217-A c/c art. 71, caput, do Código Penal brasileiro.

Narra-se na peça acusatória (DOC ID 164371037) que:

(...) em datas e horários não determinados dos meses de agosto e setembro de 2015, no Município de Lençóis, mas em locais variados, o denunciado praticou, por cinco 5 (cinco) vezes, conjunção carnal com a adolescente EMILY SILVA FERREIRA, nascida em 29/10/2001, menor de 14 (quatorze) anos à época dos fatos. Consta do inquérito policial que o denunciado e a vítima se conheceram pelo facebook e iniciaram um relacionamento amoroso que durou cerca de 3 (três) meses. Apurou-se que no oitavo encontro, no mês de agosto de 2015, ocorreu a primeira conjunção carnal praticada pelo denunciado com a vítima e que se repetiram por mais quatro vezes.”

A Denúncia foi recebida em 18 de outubro de 2016 sob ID 164371051.

Devidamente intimado, o réu apresentou defesa prévia em ID 164371057, juntando documentos.

Audiência de instrução realizada em 27 de setembro de 2017, ocasião em que foram colhidos os depoimentos das testemunhas arroladas, a oitiva da vítima e o interrogatório do acusado (DOC ID 164371869).

Em alegações finais (DOC ID 164371872) o Parquet sustentou o pedido de condenação conforme requerido em sede de Denúncia.

O réu, em alegações finais, sustentou a possibilidade de relativização da presunção de vulnerabilidade da vítima, e, em acréscimo, aduziu tese de erro de tipo, pleiteando assim a sua absolvição.

Vieram-me os autos conclusos.

Presentes os pressupostos processuais, bem como as condições da ação, não havendo nenhuma nulidade a ser sanada de ofício, e tendo sido concluída a fase instrutória, passo ao exame do mérito.

Cuida-se de ação penal pública incondicionada, em que se busca apurar a responsabilidade criminal pela prática do delito previsto no art. 217-A, na forma do art. 71, todos do Código Penal.

A infração penal em questão possui a rubrica de “estupro de vulnerável”, tendo sido incluída no Estatuto Repressivo pela Lei nº 12.015/2009 com a finalidade de resguardar, como bem jurídico, a dignidade sexual da pessoa menor de 14 anos ou que esteja nas condições do §1º do retrocitado artigo. A pena prevista no seu tipo fundamental é a de reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

No caso dos autos, no que concerne à MATERIALIDADE DELITIVA, resta esta comprovada, de forma cabal, consoante aduzem: Certidão de Nascimento da vítima (DOC ID 164371043) indicativa de que a menor possuía, na época dos fatos, menos que 14 anos; Laudo Médico-Pericial constatando que a vítima praticara conjunção carnal, ostentando “sinais de rotura himenal antiga” (DOC ID 164371048); bem como os depoimentos colhidos pelas partes do processo, incluindo a vítima e o acusado.

Noutro giro, a AUTORIA DELITIVA ressona igualmente evidente. Todos os depoimentos obtidos em sede de contraditório indicam que Cleuton Lima, ora réu, manteve relações sexuais com a vítima quando esta ainda não tinha completado 14 (catorze anos).

Com efeito, narra a adolescente que:

que começou o relacionamento com Cleuton em junho de 2015 e durou três meses, terminando em agosto do mesmo ano; que se conheceram pelo Facebook e começaram a conversar; que depois de um tempo marcaram para sair, saíram e continuaram se encontrando; que Cleuton lhe pediu em namoro e a depoente não aceitou e os dois ficavam sem compromisso; que a depoente ia a pé até determinada lugar e depois se encontravam; que a relação era escondida de todos; que no inicio ninguém sabia; que depois as amigas da depoente ficaram sabendo, antes de chegar à policia; que após dois meses de relacionamento, mantiveram relações sexuais; que se encontravam numa casa, mas não era de Cleuton; que manteve relações sexuais com Cleuton por cinco vezes” (DOC ID 164371867 - Pág. 3).

Em interrogatório, o acusado, por sua vez, confirma “que começaram a namorar, e mais ou menos um mês após o inicio do namoro, ele dois tiveram relações sexuais; que mantiveram relações sexuais poucas vezes; que ficaram juntos durante mais ou menos três meses” (DOC ID 164371869).

Diante da constatação da autoria e da materialidade estar-se-iam presentes os requisitos para configuração da tipicidade, caso o direito penal pátrio adotasse a responsabilidade objetiva no âmbito do direito penal

Ocorre, no entanto que não é esta a baliza teórica que norteia a política criminal em vigor.

Com efeito, diante da presença dos elementos objetivos do tipo: ação ou omissão prevista como crime, autor da ação/omissão censurada por lei, resultado e nexo causal, tem-se a subsunção da conduta ao modelo legal.

Todavia, conforme cediço, o tipo penal não ostenta tão somente elementos objetivos, reunindo, outrossim, em seu bojo, na toada da teoria finalista adotada pelo CPB, extraída da doutrina de Hans Welzel, o dolo integra a própria conduta típica, sem o qual não há que falar em tipicidade e, por conseguinte, em crime punível.

Embora o requerido tenha alegado ausência de presunção de vulnerabilidade no caso vertente, a procedência desta matéria defensiva esbarra em entendimento sumulado do Eg. STJ no sentido de que:

Súmula 593: O crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente.

A tese ainda é reiterada no bojo do Recurso Repetitivo 1.480.881, expressando igual teor.

Deste modo, queda afastada a argumentação do requerido no sentido de que a vulnerabilidade não seria presumida na hipótese sob lume.

Noutro giro, no entanto, merece atenção a alegação de erro arguida pelo requerido em sede de audiência e em suas alegações finais.

Como se sabe, o dolo, enquanto elemento subjetivo do tipo penal, representa o encontro entre o aspecto volitivo da conduta analisada com o cognitivo. Noutras palavras, o dolo é a vontade – consciente – de realizar os elementos previstos no tipo penal.

O artigo 217-A, em cujas penas se pretende sancionar o acusado, apresenta a seguinte redação:

Estupro de vulnerável

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

Extrai-se, da leitura do dispositivo encimado, que a idade da vítima é elemento típico objetivo que, no bojo da teoria finalista, deve encontrar-se no âmbito de conhecimento e consciência do autor do fato, sob pena da conduta ter-se por atípica.

Em sede de Defesa Prévia o requerido trouxe aos autos imagens de redes sociais da vítima (DOC ID 164371058).

A prova sob comento ostenta acentuada relevância, considerando que vítima e réu se conheceram por intermédio desta ferramenta, conforme reiterado por estes em seus respectivos depoimentos.

Na primeira imagem, é possível observar o perfil criado pela menor Emily, constando informações como o seu nome, apelido, local onde estudou e a data do seu nascimento. Embora a vítima tenha nascido em 29/10/2001, na rede social sob comento consta como data de nascimento 29 de outubro de 1998 (note-se que por esta informação a ofendida teria 16 anos na época dos fatos sob apuração, ocorridos nos idos de agosto/setembro de 2015).

Adiante, consta dos fólios mensagem encaminhada pela vítima ao suposto autor do fato, ostentando o seguinte teor (transcrição ipsis litteris):

Desculpa por mente para vc por nao te dizer que eu tinha 13 anos eu falei que tinha 16 foi o medo de vc nao querer fica cm migo eu tinha muito medo de nao fica com você mim sentia sozinha minha mae mim maltrata muito mim faz de escrava por isso enventei a historia da gravidez so queria sair de casa por isso te coloquei nessa historia eu so queria sua ajuda alem disso ja fiquei cm homem de 35 anos e tambem nao queria da queixa minha mae quase mim matou e eu nao posso fala cm juiz isso ela vai ta perto de mim e ta mim ameacando se eu dizer algu.mim ajuda por favor!!!”

A leitura conjunta e minuciosa das informações acima indicadas deixa claro que a adolescente escondeu a sua verdadeira idade, fazendo se passar por pessoa com dezesseis anos, caso em que não haveria, em princípio, qualquer censura penal incidente ao caso, eis que não se contesta nos autos que todas as relações foram consensuais.

Embora a genitora da vítima, ouvida como testemunha, afirme que o suposto autor dos fatos tinha ciência da idade da menor, por ser seu colega de escola, em seu depoimento, titubeia nas afirmações, concluindo “que nunca conversou especificamente com o réu sobre a idade dos filhos, e essa conversa sobre a idade dos filhos ela...

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