O licenciamento ambiental: mecanismo central de prevenção dos riscos associado à exploração dos minerais marinhos?

AutorRaquel Araújo Lima
Ocupação do AutorProfessora Adjunta da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Doutora em Direito pela Universidade de Brasília (UnB) e mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Páginas373-412
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O LICENCIAMENTO AMBIENTAL: MECANISMO CENTRAL
DE PREVENÇÃO DOS RISCOS ASSOCIADO À EXPLORAÇÃO
DOS MINERAIS MARINHOS?
L'AUTORISATION ENVIRONNEMENTALE: OUTIL CENTRAL
DE LA PREVENTION DES RISQUES LIES A L'EXPLOITATION
MINERALE DANS LE MILIEU MARIN?
Raquel Ara újo Lima*
Introdução
O licenciamento ambiental é um instrumento de política ambiental
e tem natureza dupla, de gestão pública e de poder de polícia. A partir dessa
natureza dupla observou-se alguns limites na sua operacionalização. No
que tange à natureza de gestão pública do licenciamento, há desconexões
das normativas ambientais com o setor minerário e há uma falta de
articulação do órgão ambiental com a entidade de outorga minerária. Em
relação à natureza de poder de polícia do licenciamento, há ausência de
controle ambiental das licenças ambientais ao longo do procedimento de
outorga da lavra, além de que, embora obrigatórias, as condicionantes
ambientais muitas vezes não são fiscalizadas no regime de outorga
minerário. Diante desses descompassos na natureza do licenciamento
ambiental enfraquecem o instrumento como meio de consecução da gestão
sustentável dos recursos minerais marinhos. Anunciar o que será abordado
abaixo. O licenciamento ambiental faz parte do planejamento ambiental
brasileiro, uma vez que é instrumento da Política Nacional do Meio
Ambiente (PNMA)1. A função de planejamento está presente entre os
* Professora Adjunta da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Doutora
em Direito pela Universidade de Brasília (UnB) e mestre em Direito pela Universidade
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
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instrumentos designados pela PNMA, pois trazem nítida característica de
gestão ambiental, sendo o licenciamento ambiental um deles2. Essa gestão
ambiental é composta de sustentabilidade, uma vez que assegurará que a
atividade econômica se realize com conformidade ambiental, sem causar
prejuízos ao meio ambiente e em concordância com o princípio do
desenvolvimento sustentável3.
Ademais, a integração do espaço marinho4 é um meio para o
alcance da gestão sustentável, que parte do conceito de desenvolvimento
1 A própria PNMA em seu art. 2º, ca put, preceitua que “tem por objetivo a preservação,
melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País,
condições ao desenvolvimento sócio -econômico, aos interesses da segurança nacional e à
proteção da dignidade da vida humana”. Por isso, ela visa compatibilizar o
“desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e
do equilíbrio ecológico” (art. 4º, I). Como o licenciamento ambien tal é um instrumento da
PNMA, seu objetivo também se coaduna com a política que o institucionalizou. Nesses
mesmos termos, Paulo Affonso Leme Machado esclarece que “os valores ambientais
valorizados nos arts. 170 e 225 da Constituição podem e devem coexistir com a liberdade
de iniciativ a econômica, que poderá sofrer o procedimento de licenciamento ambiental.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileir o. 24. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2016, p. 183.
2 “Considerando a necessidade de revisão dos procedimentos e critérios utilizados no
licenciamento ambiental, de forma a efetivar a utilização do sistema de licenciamento como
instrumento de gestão ambiental, instituído pela Política Nacional do Meio Ambiente”.
CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (CONAMA). Resolução nº 237, de 19
de dezembro de 1997. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res97/res
23797.html>. Acesso em: maio 2019. Nesse sentido, o Ministério do Meio Ambiente
destaca o caráter de gestão do licenciamento ambiental, quando ponta que ele é “um dos
mecanismos de que o Poder Público dispõe para assegurar que os empreendimentos
produtivos levem em consideração os riscos que sua instalação pode trazer ao meio
ambiente”. MINISTÉRIO DO M‐IO AMBI‐NT‐ (MMA). Ca derno de licenciamento
ambiental. Programa Nacional de Capacitação de Gestores Ambientais Brasília, 2009, p. 7.
3 O licenciamento ambiental é um desses instrumentos de gestão da política ambiental, na
medida em que, por meio dele, a ad ministração pública exerce o controle sobre atividades
antrópicas que interferem no equilíbrio ambiental, em conformidade com o
desenvolvimento econômico e a proteção das condições ambientais. MILARÉ, Edis.
Direito do Ambiente: doutr ina, jurispr udência, glossário . 10. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2015, p. 789.
4 A zona costeira é formada por uma zona terrestre e uma zona marinha, a qu al é delimita
pelo mar territorial, de 12 milhas contadas a partir da costa. Já o espaço marinho, que no
caso brasileiro, tem início na região costeira do mar territorial, compreende a plataforma
continental marinha e a Zona Econômica Exclusiva (ZEE), que se alonga até 200 milhas da
costa. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE (MMA). Zona costeira e mar inha.
Disponível em <http://www.mma.gov.br/biodiversidade/biodiversidade-aquatica/zona-
costeira-e-marinha>. Acesso em jun 2019.
Art. 6º. A zona econômica exclusiva brasileira compreende uma faixa que se estende das
doze às d uzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para
medir a largura do mar territorial”. “Art. 11. A plataforma continental do Brasil compreende
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sustentável. O objetivo da gestão sustentável por meio dessa integração
está presente em documentos internacionais e na Política Nacional para os
Recursos do Mar (PNRM), em âmbito nacional5.
Dentro dessa perspectiva, para que se conheça o objeto de um
instituto jurídico do licenciamento ambiental, é necessário abordar a
determinação de sua natureza, para posteriormente determinar o centro em
torno do qual se realizará a pesquisa6.
O licenciamento tem natureza de gestão pública ambiental e de
poder de polícia. De gestão pública7 porque o licenciamento é ferramenta
que operacionaliza a PNMA e os objetivos nela existentes8, como “a
preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à
vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-
econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade
da vida humana”9.
Já a manifestação da natureza de poder de polícia do licenciamento
ambiental, traduzido nas suas características de comando e controle10,
o leito e o subsolo das áreas su bmarinas que se estendem além do seu mar territorial, em
toda a extensão do prolongamento natural de seu território terrestre, até o bordo exterior da
margem continental, ou até uma distância de duzentas milhas marítimas das linhas de base,
a partir das quais se mede a largura do mar territorial, nos casos em que o bordo exterior da
margem continental não atinja essa distância”. BRASIL. Lei n. 8.617, de 04 de janeiro de
1993. Dispõe sobre o mar territorial, a zona contígua, a zona econômica exclusiva e a
plataforma continental brasileiros. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
leis/L8617.htm>. Acesso em: jun 2019.
5 Agenda 21, Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), Conferência sobre os
Oceanos de 2017, ODS 14, Política Nacional para os Recursos do Mar (PNRM).
6 FARIAS, Talden. Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos. Belo Horizonte:
Fórum, 2013, p 147.
7 “A gestão ambiental pode ser definida como um conjunto de ações envolvendo políticas
públicas, setor produtivo e sociedade civil, para garantir a sustentabilidade dos recursos
ambientais, da qualidade de vida e do próprio processo d e desenvolvimento, dentro de um
complexo sistema de interações da humanidade com os ecossistemas”. BURSZTYN,
Marcel; BURSZTYN, Maria Augusta. Funda mentos de política e gestão ambiental: os
caminhos do desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamound, 2012, p. 200.
8A gestão ambiental se instrumentaliza em vários instrumentos institucionais e jurídicos,
uma vez q ue a política ambiental requer, em contrapartida, a estruturação de um sistema
administrativo sob coordenação unitária, ainda que possa ser descentralizado, como é o caso
do Sistema Nacional do Meio Ambiente. SILVA, José Afonso da. Direito ambiental
constitucional. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 211.
9 BRASIL. Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente. Art. 2o. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.htm>
Acesso em: set 2019.
10 “São instrumentos de controle ambiental todos aqueles atos e medidas destinados a
verificar a observância das normas e planos que visem à defesa e recuperação da qualidade

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