Liquidação da sentença

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Ocupação do AutorAdvogado - Juiz aposentado do TRT da 9ª Região
Páginas10-52
10 Manoel Antonio Teixeira Filho
CAPÍTULO II
Liquidação da sentença
1. Nótula introdutória
OCódigoCivilanterioremseuartdiziaserlíquidaaobrigaçãoque
se apresentasse certa quanto à sua existência, e determinada no tocante ao seu
objeto. Ainda que o Código atual não tenha reproduzido o aludido conceito, este
deve ser preservado. A propósito, como vimos no Capítulo anterior, o próprio
CPC faz menção aos requisitos de certeza e determinação da obrigação contida
notítuloexecutivoparaqueestepossuaecáciaexecutiva
Em um plano ideal, as obrigações consubstanciadas em títulos executivos
judiciais deveriam ser sempre líquidas, ou seja, conter todos os elementos neces-
sários à sua imediata execução, porquanto a certeza do credor, em relação ao
montante do seu crédito — e, em contrapartida, a do devedor, quanto ao total
da dívida —, propiciaria uma execução rápida, livre, e boa parte dos incidentes
que a entravam, dentre os quais se incluem os respeitantes à determinação do
quantum debeaturaLeinqueacrescentouasletrasA a H ao art
852 da CLT, para instituir o procedimento sumaríssimo, exige que nas ações
sujeitas a esse procedimento o valor dos pedidos conste da inicial). Não esta-
mosarmandocom issoque hánaprática sentençasque serevelamincertas
quanto à existência do crédito, pois semelhante anomalia corresponderia à não
sentença, ao nihil jurisdicional, sabendo-se que, em nosso sistema de processo,
o provimento emitido pelo juiz deve ser sempre certo, mesmo quando resolva
relação jurídica condicional (CPC, art. 492, parágrafo único). Nula será, conse-
guintemente, a sentença que subordinar o acolhimento dos pedidos formulados
pelo autor à eventualidade de ser constatada, na fase de liquidação, a existência
do direito por ele alegado.
Com o advento do estatuto processual civil de 1973 deixou de haver
lugar, em nosso meio, para as sentenças incompletas, ou condicionais, a que
ValentinCarrion dedicara proveitosamonograa ( “As Sentenças Incomple-
tas”, Universidad de Madrid, 1971).
A incerteza, pois, que se possa irradiar da sentença exequenda liga-se exclu-
sivamente ao montante, ao quantum da dívida, situação que exigirá a prática de
certos atos antecedentes à execução propriamente dita — e dela preparatórios
destinadosàquanticaçãodovaloraserexigidoaodevedorAesseconjunto
Cadernos de Processo do Trabalho n. 30 11
de atos dá-se o nome de liquidação — que, em rigor, não é da sentença, e sim da
obrigação, nela contida.
São múltiplos os fatores que impedem o juiz de proferir, no procedimento
comumsentençascontendoobrigaçõeslíquidasoradecorredapróprianatureza
do pedido; ora da absoluta ausência de elementos nos autos (máxime da inicial e
na contestação); ora da vasta quantidade de pedidos deduzidos pelos litigantes;
ora das próprias circunstâncias em que a sentença foi prolatada (em audiên-
cia, e. g., quando o juiz possuía pouco tempo para compulsar, detidamente, os
autos, com o objetivo de encontrar elementos que ensejassem uma condenação
líquida) etc. Não é de grande interesse, para este livro, investigarmos as causas
que conduzem ao proferimento de sentenças ilíquidas (obrigações ilíquidas), e
sim estudarmos o procedimento judicial a ser observado quando isso acontece.
2. Conceito
Em sentido genérico, o verbo liquidar sugere a acepção de averiguar, tornar
líquido, tirar a limpo; na terminologia processual, entretanto, o substantivo liqui-
daçãoindica o conjunto de atos quedevemser praticados com a nalidade
de
estabelecer o exato valor da condenação ou de individualizar o objeto da obriga-
ção. Como assinala Moacyr Amaral Santos, pela liquidação se visa a estabelecer
o valor, a quantidade ou a espécie de obrigação, vale dizer, o que ou quanto é
devido (obra cit., pág. 2396); Edson Baccaria a tem como “a operação pela qual
atingimosumvalorabsolutoLiquidaçãodaSentençaTrabalhistaSãoPaulo
EdCargine pág paraAonso Fragaela representa oato judicial
pelo qual se determina o objeto da condenação”(“Teoria e Prática na Execução
dasSentençasSãoPauloPontesdeMirandaavêcomooprocessopelo
qual se torna líquido o objeto ilíquido do pedido da condenação” (“Comentá-
riospág Joséda SilvaPachecoarmaque sentençailíquidaéaquela
quenão xao valorda condenaçãonemlhe individuao objeto (“Execução”,
RepEncdoDirBrasRioEdBorsoivolpág
Pela nossa parte, conceituamos a liquidação como (a) a fase preparatória da
execução, (b) em que um ou mais atos são praticados, (c) por uma ou por ambas
aspartes dcom analidadede estabelecero valorda condenaçãoeou de
individuar o objeto da obrigação, (f) mediante a utilização, quando necessário,
dos diversos meios de prova admitidos em lei.
Examinemos, a seguir, individualmente, os elementos componentes do
conceito que enunciamos.
(a) Fase preparatória da execução. Embora a liquidação, no processo
do trabalho, do ponto de vista sistemático, integre a execução, sob o
aspectológico ela guracomofase destinada apreparar a execução, a
tornar exequível a obrigação contida no título judicial, seja precisando o
12 Manoel Antonio Teixeira Filho
valor da condenação ou individuando o objeto da obrigação. A liqui-
dação possui, portanto, caráter não apenas quanticante, mas também
individuante. Título judicial, cuja execução se promova sem prévia
liquidação — sempre que esta fosse imprescindível —, é legalmente
inexigível, rendendo ensejo a que o devedor argua a falta, em seus
embargos (CPC, art. 525, § 1.º, III).
(b) Em que um ou mais atos são praticados Este elementodadenição
que elaboramos tem o propósito de chamar a atenção ao fato de que
embora, no geral, credor e devedor pratiquem diversos atos conve-
nientes aos seus interesses, na liquidação há casos em que, às vezes, o
escopo da liquidação é atingido mediante a prática de um só ato pela
parte (o credor apresenta artigos de liquidação que não são impug-
nados pelo devedor).
(c) Por uma ou por ambas as partes. Nada obstante o devedor tenha sido
colocado em um ontológico estado de sujeição (ao comando sancio-
natório, que se esplende da sentença condenatória exequenda) pelo
legislador, não se deve tirar desse fato a equivocada conclusão de
que ele não possua, na liquidação, direito a praticar atos necessários a
fazer com que a execução não transborde do título executivo em que
se funda, ou que não se afaste do devido procedimento legal.
Tanto é verdadeira a assertiva que o Código lhe permite opor-se à exe-
cução, via embargos (CLT, art. 884); contestar os artigos de liquidação
(CPC, art. 509, II), e o mais.
(d) Comanalidade deestabelecero valordacondenação. Cuida-se aqui de
execução por quantia certa contra devedor solvente (CPC, art. 824), que
tem na expropriação judicial de bens do devedor o seu objeto (ibidem).
Bens atuais ou futuros (CPC, art. 789). Via de regra, as liquidações tra-
balhistastendema quanticarovalordacondenaçãopoisoquemais
se costuma pedir, no âmbito da Justiça do Trabalho, é a emissão de pro-
vimentos condenatórios do réu ao pagamento de certa quantia.
(e) Ou de individuar o seu objeto. Em alguns casos — algo infrequente no
processo especializado — o que se busca, na fase de liquidação, não
édeniro quantum debeatur e sim individuar o objeto da obrigação a
ser adimplida pelo devedor, ou seja, “qualidades e espécies, como nas
ações universais, nas alternativas e condicionais...” (Leite Velho, “Exe-
cuçãodeSentenças Rio págnota Em situaçõescomo
essas, a atividade que as partes deverão desenvolver, nessa fase pre-
paratóriadaexecuçãoconcentrasenaxaçãodogênero e da qualidade
do objeto obrigacional.
(f) Mediante a utilização, quando necessário, dos diversos meios de prova
admitidos em lei. Determinadas liquidações reclamam a abertura de fase

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