Lu�s eduardo magalh�es - Vara dos feitos de rela��es de consumo, c�veis e comerciais

Data de publicação25 Agosto 2022
Número da edição3164
SeçãoCADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE LUIS EDUARDO MAGALHÃES
DECISÃO

8003383-86.2022.8.05.0154 Tutela Cautelar Antecedente
Jurisdição: Luís Eduardo Magalhães
Requerente: Rafael Zanini
Advogado: Mariane Regina Coneglian (OAB:BA42518)
Advogado: Oliverio Gomes De Oliveira Neto (OAB:BA29329)
Requerido: Uendel Hillebrand De Matos

Decisão:

PROCESSO: 8003383-86.2022.8.05.0154

CLASSE: TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE (12134)

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA

Vistos, etc.

Trata-se de Tutela Provisória de Urgência de Natureza Antecipada Requerida em Caráter Antecedente, ajuizada por Rafael Zanini em face de Uendel Hillebrand de Matos.

Na exordial, o Autor esclarece que celebrou com o Requerido contrato de compra e venda com cláusula de reserva de domínio, no qual o Requerente vendeu ao Demandado 01 (uma) Plantadeira SS Transportável JM8090PD EX39 PANT 36 LINHAS, da marca Jumil, ano 2016, nº de série 2016/452977-1, cujo preço de aquisição do bem foi contratualmente fixado no valor R$ 550.000,00 (quinhentos e cinquenta mil reais).

Conforme convencionado no instrumento contratual, o Requerido se comprometeu a pagar o montante através de parcela de entrada no valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais) e o montante remanescente mediante o pagamento de 02 (duas) prestações pecuniárias, a primeira no valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) com data de pagamento convencionalmente estabelecida para até o dia 30/04/2022 e a segunda no montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais) com data de vencimento em 30/10/2022, ambas acrescidas de juros remuneratórios anuais.

Não obstante, aduz o Autor que transcorreu a data de adimplemento da primeira parcela e o Demandado não cumpriu com sua obrigação sinalagmática de pagamento. Assim, por convenção das partes – com a cláusula contratual de vencimento antecipado –, o Requerente esclarece que também ocorreu o vencimento extraordinário da prestação subsequente, ocasionando, portanto, o inadimplemento total do débito remanescente.

Argumentando que foram esgotadas as vias ordinárias de notificação do Requerido, o Autor demostrou a constituição em mora do devedor através da notificação realizada por meio de protesto por edital do débito perante a Serventia de Registro de Títulos e Documentos, conforme instrumento juntado no id n° 222326804 – pág. 2.

Assim, com a inadimplência contratual e após argumentar acerca da presença comprovada dos requisitos legais, o Requerente pleiteia liminarmente, em sede de tutela provisória de urgência, a Busca e Apreensão da máquina agrícola objeto da cláusula de reserva de domínio.

A petição inicial foi instruída com procuração e documentos inerentes ao pleito.

Custas de ingresso recolhidas.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. Decido.

Após acurada análise dos autos, constata-se que a exordial preenche os pressupostos e requisitos exigidos pelo art. 319 do CPC (não sendo o caso de indeferimento da petição inicial e/ou improcedência liminar do pedido) e estão presentes as condições da ação (art. 17, do CPC), razão porque a recebo em seus termos, deferindo-a o seu processamento.

Cinge-se a controvérsia da lide, neste momento, acerca da análise dos fundamentos do requerimento de tutela provisória de urgência de natureza antecipada requerido em caráter antecedente.

Ora, nos termos do art. 300 da Lei n° 13.105/2015, a concessão da tutela antecipada impõe a presença de dois pressupostos genéricos, quais sejam: plausibilidade do direito e perigo da demora do provimento final, de modo a suscitar no julgador, em sede de cognição sumária, o convencimento de que o autor merece, nesse momento, antes mesmo de ouvir a parte ré, a prestação jurisdicional pleiteada.

Para que o juiz conceda a Tutela Provisória, é necessário que ele esteja convencido, ao menos, da possibilidade, da probabilidade da existência do direito pleiteado. É claro que, nesta situação, o juiz deverá valer-se do Princípio da Proporcionalidade a fim de ponderar as consequências que poderão advir da concessão ou não da medida. Consoante magistério do Prof. Fredie Didier Jr., “a probabilidade do direito a ser provisoriamente satisfeito/realizado ou acautelado é a plausibilidade de existência desse mesmo direito” (DIDIER JR., 2016, p. 608).

Pois bem.

Inicialmente, é extremamente forçoso esclarecer que a pretensão formulada pelo Autor está consubstanciado em contrato de compromisso de compra e venda com cláusula de reserva de domínio, razão pela qual a situação descrita não se confunde com a alienação fiduciária em garantia – regida pelo Decreto-Lei n° 911/69.

A propósito, também é importante preliminarmente consignar que, com o advento do novo Código de Processo Civil, algumas ações de procedimentos especiais, a exemplo da ação de “Vendas a Crédito com Reserva de Domínio” (anteriormente disciplinada nos arts. 1.070 e seguintes do CPC/73), não foram contempladas no novo diploma processual, de modo que, por conseguinte, deverão ser processadas segundo o procedimento comum, não restando, todavia, excluída a possibilidade ou necessidade de alguns ajustes no rito no afã de compatibilizá-lo com certas peculiaridades do direito material a ser tutelado.

Ora, a cláusula de reserva de domínio ou pactum reservati dominii é uma disposição inserida nos contratos de compra e venda que permite ao vendedor conservar para si a propriedade e a posse indireta da coisa alienada até o pagamento integral do preço pelo comprador, o qual terá apenas a posse direta do bem, enquanto não solvida a obrigação.

Consoante magistério do Prof. Flávio Tartuce, essa propriedade resolúvel do vendedor é condicional, ou seja "depende de evento futuro e incerto, em que a condição é o pagamento integral do preço ou da última parcela caso a venda não tenha sido à vista. Enquanto esse pagamento não ocorrer, a aquisição do domínio e a transmissão da propriedade ficarão suspensas." (TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, p. 638-639).

Assim, o domínio não se transmite com o contrato e entrega da coisa, mas automaticamente com o pleno pagamento. Neste caso, o comprador tem conhecimento que recebe a mera posse direta do bem e o vendedor, por pressuposto, sabe que a sua propriedade é resolúvel, uma vez que o primeiro poderá adquirir a propriedade do bem com o pagamento integral do preço, sendo franqueado à parte vendedora/credora optar pelo procedimento que melhor lhe convier a fim de ressarcir-se dos prejuízos havidos com o ajuste inadimplido.

Ademais, conforme Informativo de Jurisprudência n° 573 do STJ, a pretensão do Requerente não se trata da análise do ius possessionis (direito de posse decorrente do simples fato da posse), mas sim do ius possidendi, ou seja, do direito à posse decorrente do inadimplemento contratual, onde a discussão acerca da titularidade da coisa é inviabilizada, haja vista se tratar de contrato de compra e venda com reserva de domínio onde a transferência da propriedade só se perfectibiliza com o pagamento integral do preço.

Nos termos do art. 526 do Código de Civil, na hipótese de mora do comprador no adimplemento das prestações, abrem-se ao vendedor 02 (duas) possibilidades: a) o ajuizamento de ação para a cobrança das prestações vencidas e vincendas, com os acréscimos legais; ou, b) a recuperação da posse da coisa vendida. Como se extrai da literalidade do mencionado dispositivo legal, essas alternativas são excludentes entre si: cabe ao vendedor optar pela cobrança das prestações em atraso e do saldo devedor em aberto – o inadimplemento resulta no vencimento antecipado da dívida – ou pelo exercício de seu direito potestativo de desconstituição do negócio jurídico, por meio da recuperação da coisa vendida (o que não prejudica seu direito à compensação pela depreciação do bem e outras despesas decorrentes do inadimplemento, conforme o disposto no art. 527 do CC).

Independentemente da opção exercida pelo vendedor, é imprescindível “a constituição do comprador em mora”, que, nos termos do art. 525 do Código Civil, ocorre mediante protesto do título ou interpelação judicial. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1629000/MG (Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 04/04/2017), ampliou os meios de comprovação da constituição em mora, asseverando que “Não se vislumbra, entretanto, fundamento razoável para limitar os meios de comprovação da mora ao protesto e à interpelação judicial, pois os objetivos pretendidos pelo legislador – quais sejam, de documentar a mora e oportunizar ao comprador o pagamento das prestações, como forma de evitar a retomada do bem – podem ser também alcançados mediante notificação extrajudicial enviada por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos ao endereço do devedor”.

Após análise dos autos, constata-se que, de fato, as partes expressamente pactuaram a cláusula de reserva de domínio no momento da constituição do negócio jurídico escrito, conforme se extrai da Cláusula Quarta do instrumento contratual adequadamente celebrado entre as partes (id n° 222326800).

Por seu turno, os documentos colacionados aos autos também comprovam a constituição em mora do devedor, através de instrumento de protesto por edital do título, perante o Cartório de Registro de Títulos e Documentos (id n° 222326804).

Com efeito, restaram satisfatoriamente demonstrados, portanto, todos os elementos estabelecidos pelo artigo 300, do CPC para o deferimento da tutela de urgência: o contrato escrito com cláusula de reserva de domínio e o seu respectivo protesto evidenciam a probabilidade do direito do Autor decorrente da inadimplência do Requerido, bem como o perigo de...

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