Nota Marginal: 'A Produção Poética dos Anos 70, no Brasil' Nos Periódicos Culturais, Alternativos: Opinião, O Acadêmico e Universitário

AutorRegiane Regis Momm
Páginas121-137
Nota Marginal: "A produção poética dos anos 70, no Brasil – Regiane Regis Momm Boletim de Pesquisa NELIC v. 10 n. 15 2010.2
olho muito tempo o corpo de um poema
até perder de vista o que não seja corpo
e sentir separado dentre os dentes
um filete de sangue nas gengivas.
Ana Cristina César
A través de la frase
que es ritmo, que es imagen, el hombre-
ese perpetuo llegar a ser – es.
La poesia es entrar en el ser.
Octávio Paz
Poetry strips the veil of familiarity from
the world, and lays bare the naked and
sleeping beauty, which is the spirit of
it forms.
Percy Bysshe Shelley
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Nota Marginal: "A produção poética dos anos 70, no Brasil – Regiane Regis Momm Boletim de Pesquisa NELIC v. 10 n. 15 2010.2
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Revela-se inquietante. Surge e se apresenta mediante a
convocação dos anseios dos desesperados. Vem pela
contramão, escrita em meios por vezes menos nobres, por
vezes menos glamorosos, mas com certeza nada pobres.
Aparece ainda do aquém das idéias convencionais, em meio a
críticas mudas, silenciadas. É, sobretudo, contundente e vem
quebrar paradigmas, sendo não apenas instrumento para
exploração do passado; é antes, o meio para que se consiga
visualizar se apenas foi; ou se é, e caso continue sendo, o que a
torna após tanto tempo, ainda atual, o que se exprime através
dos restos casuais daqueles que, sem pretensão, deixaram para
o sempre, algo que não é eterno, mas sim, imutável e
extremamente assertivo: uma queixa, um grito, um manifesto
feito em um arroubo de humanidade, em que o algoz do papel
larga a dita espada de tinta, e se joga de corpo e alma em algo
que nem sempre se traduz com facilidade. Aliás, o objetivo da
produção, de cada poesia que circula na imprensa periódica dos
anos 70, não é chegar a uma única resposta, mas mostrar que
antes mesmo da mensagem ter de fato a linguagem, há algo
que transcende com a imagem, que convida a recriá-la e,
literalmente, a revivê-la. Isto é, a imagem poética não traz à tona
apenas o reflexo das experiências vivificadas, ao estilo do
filósofo Georg Wilhelm Friedrich Hegel1, que a vê como um
labirinto de espelhos, ao regressar até Heráclito, mas vem
iluminar, contudo, aquilo que não está aí, diante dos olhos - a
vida mais obscura e remota. É justamente disso, que fala o
crítico Octávio Paz2, da tarefa de resgatar o não visível. Cada
imagem, cada poema, para ele, não apenas representa, ou
desvenda o real, mas, sobretudo, busca apreender a essência
desse real. Vindo assim, desvelar um real mais pungente que a
própria realidade. O que se pode perceber são visões, que
apesar das dissonâncias que as separam, elas têm em comum a
preservação da pluralidade de significados, mas, afinal, o que é,
então, imagem poética? Qual pode ser o sentido da imagem nos
versos, nas frases, espalhadas pelos tablóides dos anos 70?
Por imagem poética compreende-se um ir além das
palavras, ou seja, até o limite com o intuito de dizer o que, por
natureza, parece escapar da linguagem. É o invisível que está
por detrás do visível, de forma iminente ou eminente, onde a
lacuna que marca o seu lugar, não é senão um dos pontos de
1 HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. 1770-1831. Cursos de estética
[Vorlesungen über die ästhetik]. Tradução: Marco Aurélio Werle e Oliver Tolle.
Consultoria: Victor Knoll. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo:
Editora da Universidade de São Paulo, 2000, v. 2, p. 135.
2PAZ, Octávio. O arco e a lira. Tradução: Olga Savary. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1982, pp.119-128.

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