A mídia e a produção do consenso em torno das políticas educacionais: o caso do novo ensino médio

AutorMaria Carolina Andrade - Vânia Cardoso Motta
CargoDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro - Professora Associada da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Páginas46-61
A MÍDIA E A PRODUÇÃO DO CONSENSO EM TORNO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS: o caso
do Novo Ensino Médio
Maria Carolina Andrade
1
Vânia Cardoso Motta
2
Resumo
O artigo apresenta uma análise das propagandas veiculadas por canais de mídia, especialmente de televisão, acerca da
principal política educacional em voga, qual seja, o No vo Ensino Médio. A partir dos conceitos de ideologia, em Marx e
Engels, e de hegemonia e ideologia em Gramsci, analisa o car áter ideológico das propagandas, buscando demonstrar como
as m esmas retratam a realidade agregada de elementos de mistificação e como isto constitui tarefa de classe. Aborda,
ainda,o caráter usurpador e retrógrado da reforma, relacionando-a à ascensão ultraliberal e conservadora do Brasil
contemporâneo. Conclui que a mídia se gue sendo veículo essencial de disseminação da ideologia dominant e, e que se fora
importante em todo tempo histórico, hoje é absolutamente imperativa.
Palavras-chave: Políticas públicas. Empresariamento da educação de novo tipo. Novo Ensino Médio. Ideologia.
Propaganda.
THE MEDIA ANT THE PRODUCTION OF CONSENSUS AROUND EDUCATION AL POLICIES: the case of the New High
School
Abstract
The article presents an analysis of advertisements broadcast by media channels, especially television, about the main
educational policy in vogue, namely, the New High School. From the concepts of ideology, in Marx and Engels, and
hegemony and ideology in Gramsci, analyzes the ideological character of advertisements, seeking to demonstrate how they
portray the aggregated reality of elements of mystification and how this constitutes a class task. It a lso approaches the
usurping and retrograde character of the reform, relating it to the ultraliberal and conservative rise of contempor ary Brazil.
Concluding that the media continues to be an essential vehicle for the dissemination of the dominant ideology, and that if it
had been important in all historical times, today it is absolutely imperative.
Keywords: Public policies; new type of education entrepreneurship; New High School; ideology; advertising
Artigo recebido em: 21/12/2021 Aprovado em: 20/05/2022
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v26n1p46-61
1
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação d a Universidade Federal do Rio de Janeiro, E-mail:
carolina.andradep@gmail.com
2
Professora Associada da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail:
vaniacmotta@gmail.com
Maria Carolina Andrade e Vânia Cardoso Motta
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1 INTRODUÇÃO
“Tempos difíceis” é muito pouco para caracterizar o que vivemos hoje – se é que,
enquanto trabalhadores, podemos falar em vida. No Brasil, notadamente desde 2016, a expectativa da
massa trabalhadora tem sido tão somente sobreviver a uma avalanche de perdas: perdas econômicas,
políticas e sociais; perdas de direitos, lazer, espaços, saúde, empregos, moradias, alimentação, como
corolário, a perda de mais de 600 mil vidas ao final de 2021.
Nesse sentido, é urgente salientar que a despeito da gravidade e letalidade do vírus da
Covid-19, a ascensão ultraliberal-conservadora que se gesta no Brasil no período do golpe
empresarial-parlamentar que depôs a então presidente petista, é fulcral nesse conjunto de perdas.
Ainda em 2016, quando a possibilidade de uma pandemia habitava apenas nossos pesadelos mais
longínquos, promoveu-se o desmonte das leis trabalhistas, medidas de (contra)reforma na educação
via Medida Provisória e o congelamento dos gastos públicos, corrigidos apenas pela inflação, por vinte
anos – medida sem igual em qualquer país do planeta.
A atual crise orgânica do capitalismo brasileiro, consolidada em 2015, é um marco notável
nesse processo. Como demonstra Motta e Andrade (2020), entender a complexidade do que o período
carrega em seu ventre exige mais do que atentar para a grave crise econômica. A crise de hegemonia
que se desenhara paralelamente, sobressaltada pela descolagem das massas dos partidos e
ideologias tradicionalmente dominantes, torna a situação “delicada e perigosa, pois abre-se o campo
para as soluções de força [...] representadas pelos homens providenciais ou carismáticos (GRAMSCI,
2007, p. 60).
A questão não se reduz, porém, a um problema político entre dominantes e dominados,
embora este exista de fato. Na crise orgânica, há também um problema de hegemonia no interior das
classes: se os trabalhadores enfrentam problemas de organização que os tornam incapazes de
aproveitar a desordem a seu favor, a classe dominante apresenta dificuldades de reestabelecer a
mínima homogeneidade necessária para redefinir a direção a seguir, abrindo o caminho para
pensamentos que contêm os “perigosos fermentos ideológicos” que alimentam e engrandecem os
monstros (GRAMSCI, 1999, p.323). Não surpreendentemente, é precisamente nessas crises de
distensão dos vínculos entre estrutura e superestrutura que emergem a descrença nas instituições, na
política e na própria democracia; a apresentação de velhas ideias como inovações e, ainda, as
tentativas mais bizarras de solucionar o problema.
Não desejamos, nem poderíamos, esgotar a complexidade do tema. No escopo desse
texto, abordamos suas relações com as políticas públicas de educação. Demonstramos que, meio ao

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