Mineração e intervenção na propriedade privada

AutorAdriano Drummond Cançado Trindade
Ocupação do AutorMestre em Direito e Política dos Recursos Naturais (Distinction) pelo Centro de Direito e Política Energética, Mineral e do Petróleo (CEPMLP) da Universidade de Dundee, Reino Unido
Páginas279-296
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MINERAÇÃO E INTERVENÇÃO NA
PROPRIEDADE PRIVADA
Adriano Drummond Cançado Trindade1
SUMÁRIO: I. Introdução. II. Mineração e propriedade superciária. III. Inter-
venção na propriedade privada e infraestrutura. IV. Mineração e intervenção na
propriedade privada. (a) ação de avaliação de renda e indenização. (b) servidão mi-
nerária. (c) outros modos de intervenção na propriedade privada. V. Considerações
nais. VI. Referências bibliográcas.
i. intrOduçãO
Grandes empreendimentos de infraestrutura enfrentam diversos desaos.
Esses desaos compreendem desde os mecanismos de nanciamento do pro-
jeto e o licenciamento ambiental, com a adoção de medidas mitigatórias e
compensatórias, passando pela análise de impactos sociais e como abordar os
anseios da população antes e durante o empreendimento (a chamada “licença
social”), até a própria operação desse mesmo empreendimento.
Talvez um dos aspectos de maior preocupação em empreendimentos de
infraestrutura – ainda que certamente não o único – diz respeito à delimita-
ção da área a ser usada e da área que sofrerá os impactos da operação, e o
acesso e uso dessas mesmas áreas. Pela própria natureza de empreendimen-
tos de infraestrutura, grandes áreas serão exigidas para a implementação e
operação do empreendimento. Cite-se, como exemplo, empreendimentos de
geração de energia elétrica, rodovias e ferrovias, portos e aeroportos, entre
tantos outros.
1 Mestre em Direito e Política dos Recursos Naturais (Distinction) pelo Centro de Direito e Política
Energética, Mineral e do Petróleo (CEPMLP) da Universidade de Dundee, Reino Unido; advogado
e professor voluntário da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB) e de cursos de
pós-graduação do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
mineração
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adriano drummond cançado trindade
Na mineração esse aspecto não é diferente. A depender do porte do em-
preendimento mineiro e das estruturas de apoio que serão necessárias para
a lavra – barragens de rejeitos, área para deposição de estéreis, plantas de
processamento, além da própria cava, quando se trata de mina a céu aberto
– a superfície necessária para a implantação e operação do empreendimento
pode ser considerável. A depender da geograa do local e de outros usos
atribuídos ao solo, o acesso e uso da superfície podem ser mais complexos e,
em alguns casos, podem até mesmo inviabilizar o próprio empreendimento.
A mineração, contudo, apresenta algumas circunstâncias especícas que
merecem um estudo mais detido. O fato de que o concessionário da lavra
não precisa ser o proprietário do solo (comumente referido como “dualidade
da propriedade”)2 é uma dessas circunstâncias. A inexistência de alternativa
locacional é outro fator que, no setor mineral, adquire contornos muito par-
ticulares.3 O objetivo deste artigo é analisar essas diculdades de acesso e
uso do solo em empreendimentos mineiros e as respostas e instrumentos de
que dispõe o ordenamento jurídico brasileiro.
ii. minerAçãO e prOpriedAde SuperFiciáriA
O regime dominial atualmente adotado pelo ordenamento jurídico bra-
sileiro no tocante aos recursos minerais acarreta algumas consequências.
A primeira delas é a propriedade da União com relação aos recursos mine-
rais. A segunda é a relação jurídica entre aquele que recebe da União o dever
de pesquisar e lavrar e o proprietário ou possuidor do solo.
A propriedade dos recursos minerais foi conferida à União por força dos
artigos 20, inciso IX, e 176 da Constituição Federal. Ao assim estabelecer,
o ordenamento jurídico busca corrigir “distorções” da natureza representa-
das pela distribuição irregular dos recursos minerais ao longo do território
nacional, pois caberá à União, e não ao proprietário imobiliário, beneciar-
se da exploração de recursos minerais, na qualidade de representante dos
interesses da coletividade.
2 TRINDADE, Adriano D.C. Princípios de Direito Minerário Brasileiro. In Souza, Marcelo Mendo
Gomes de. Direito Minerário em Evolução. 1ª ed. Belo Horizonte: Mandamentos, 2009, p. 62.
3 Admite-se que a rigidez ou inexistência de alternativa locacional não seja uma circunstância inerente
apenas ao setor mineral. O aproveitamento de potenciais hidráulicos, por exemplo, tem a mesma carac-
terística. Não obstante, o setor mineral se depara com desaos decorrentes da rigidez locacional com
grande frequência, mesmo em casos de empreendimentos de pequeno porte, que precisam se adaptar
às circunstâncias do local onde será conduzida a operação (tanto no aspecto ambiental como no aspecto
social e no uso do solo). Há casos notórios em que comunidades inteiras tiveram que ser reassentadas
em outro local para que empreendimentos mineiros pudessem ser implementados.
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