O Estado moderno e o trabalho informal

AutorLourival José de Oliveira
CargoDoutor em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professor de Direito do Trabalho da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Professor do Curso de Mestrado em Direito Negocial da UEL. Professor dos cursos de graduação e pós-graduaç&ati
Páginas11-16

Page 11

1 A História do Trabalho no Século XX

São várias as publicações que evidenciam as mudanças de paradigmas ocorridas durante o século XX no mundo1. São transformações observadas que alteraram as referências que se tinham sobre determinados objetos, como, no caso, as relações de trabalho. As novas formas de prestação de serviços, a presença feminina na fábrica, os novos hábitos e locais de trabalho fizeram com que o Estado fosse também redesenhado em sua estrutura e formação. Após a Segunda Grande Guerra Mundial, principalmente na Europa, houve a reorganização das nações, com disputas internas (nacionais) em torno da própria identidade nacional. Após a chamada formação dos blocos econômicos e um novo alinhamento, uma realidade bastante diferente da anterior descortinou-se no mundo do trabalho, concentrando a atenção dos estudiosos do assunto.

Na periferia do mundo, sob a hegemonia dos países ditos desenvolvidos, assistiu-se ao incremento de novos sistemas produtivos, atrelados aos países centralizadores com seus processos de industrialização em massa. O Estado nacional passou por um estágio de desgaste frente aos fatores econômicos. Buscam-se atualmente os melhores resultados econômicos, nem que para isso necessitem ser valores sociais e interesses regionais remanejados para um segundo plano. A crença de que o mercado econômico seria o novo fator de regularização social fez surgir o chamado neoliberalismo, que trouxe a internacionalização do mercado consumidor, na busca incessante pela própria homogeneização dos costumes.

Personifica-se o mercado, que precisa ser considerado um ente dotado de um valor, de uma identidade, como se tratasse de um sujeito dotado de vontade e de ações conscientes, ainda que dentro de um anonimato e sem um local definido. O mercado impõe o preço deste ou daquele produto, do valor da mão-de-obra. Mas quem ou o que é o mercado?

Quanto à tecnologia, os avanços criam "significativas" transformações no conceito de trabalhador. A aplicação das inovações tecnológicas ocorre com surpreendente velocidade, na maioria das vezes criticadas pela desconsideração às questões sociais, éticas e demais valores imanentes na própria cultura de uma dada

Page 12

sociedade, contribuindo sobremaneira para a redistribuição das competências e da escala de valores. As novas dimensões do emprego são redesenhadas com o avanço tecnológico, surgindo a possibilidade do trabalho a domicílio, da competição interempresarial, da necessidade do trabalhador criativo com várias atribuições, das atividades informais e, quem sabe, com o uso crescente da robotização, o surgimento das chamadas "fábricas escuras"2. Já foi asseverado por Jacques Généreux (1997, p. 139):

Em suma, a ausência radical de trabalho, de que fala Viviane Forrester, não é para amanhã! Muito menos para hoje! Existe uma constatação evidente que todo mundo pode verificar: durante o último quarto do século XX, marcado pelo aumento do desemprego e da pobreza, o trabalho ainda é a regra majoritária e a falta do trabalho, o desvio reservado às minorias.

Fica difícil, ainda que no decorrer do séc. XXI, pensar no fim do trabalho, mesmo com processos de robotização, fator que contribui significativamente para a provável redução da necessidade do trabalho humano desqualificado. A própria essência do homem enquanto ser social faz com que para sua sobrevivência necessite interagir-se. E homem sozinho ou homem com robôs não se interagirão por certo. Trata-se das relações que serão mantidas entre empregados e empregadores, membros da mesma família, da mesma religião, do mesmo grupo social, ainda que diante de uma automação devastadora para o emprego. A automação por completo das relações de trabalho parece negar a própria essência do homem, que é um ser social, o que leva ao descarte da tese do "fim do emprego".

Como conceber então este novo ou contínuo embate do capital x trabalho no século XXI? Talvez seja através do estudo das diversas funções que cada um irá passar a ocupar no novo cenário social, formal ou informalmente, das diversas técnicas de organização interna e externa do trabalho3. Compreender a nova divisão do trabalho, os processos de fragmentação das atividades produtivas, a inegável força de acumulação do capital, o poder de descontrolar economias produtivas, as desigualdades sociais surgidas de forma abrupta em várias partes do mundo, a crescente exclusão social mesmo com o trabalho, o surgimento das novas atividades produtivas e outras variáveis que por certo merecerão ser estudadas.

Dentre as variáveis, destaca-se aqui o trabalho informal. Principalmente nos países de terceiro mundo, é detectada a crescente informalidade do trabalho. Talvez o desequilíbrio econômico, o crescente avanço científico, com o uso das inovações científicas, o novo papel do Estado e outros, sejam fatores que apontam para algumas explicações em torno do trabalho informal, justificando-se assim o presente estudo.

2 Da Informalidade no Trabalho

Muito já se tem proposto acerca do trabalho informal no Brasil. Em visita feita pelo então Diretor Geral da Organização Internacional do Trabalho ao Brasil, Samovía expôs o seguinte:

Temos que ver como transferir a informalidade para o mundo formal, e isso passa principalmente pelo tema da micro e da pequena empresa. A economia informal é uma coisa extraordinária. É uma enorme criatividade empresarial [afirmou ele]. Quanto mais se capacite o mundo informal, mais será possível levá-lo a se aproximar do mundo formal. Temos feito contatos com governos - inclusive o brasileiro - e realizado pesquisas [afirmou Samovía].

Sobre reformas trabalhistas, Samovía disse não se opor, pois "o tema principal é como dar trabalho decente às pessoas". O importante, para ele, é não ver o trabalho "como mercadoria", mas como "fonte social, de dignidade, que afeta a estabilidade das famílias, a paz nas comunidades". Samovía define os últimos anos como "a década perdida para o crescimento do emprego". E faz cinco sugestões aos governos: liberar as economias, abrindo as sociedades; adotar políticas de expansão que dêem prioridade à criação de empregos, e não a aspectos monetários; priorizar a produtividade e a qualificação educativa; reforçar as redes de segurança social; fomentar o diálogo social (GERCHAMANN, 2003).

Para estudiosos do assunto, não existe mais como polarizar o emprego formal x emprego informal. As novas relações de trabalho acenam para a informalidade no...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT