Morro do chap�u - Vara crime, j�ri, execu��es penais, inf�ncia e juventude

Data de publicação29 Junho 2023
Número da edição3361
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL DE MORRO DO CHAPÉU
SENTENÇA

8003920-34.2022.8.05.0170 Ação Penal - Procedimento Ordinário
Jurisdição: Morro Do Chapéu
Autor: Ministério Público Do Estado Da Bahia
Reu: Neurandy Rosa Da Silva
Advogado: Antonio Soares Da Silva Neto (OAB:BA51972)
Vitima: G. V. D. S. S.
Testemunha: Celia Maria Barbosa De Sousa
Testemunha: Cicera Danubia Barbosa De Sousa
Testemunha: Aldeneide Fernanda Ferreira De Oliveira

Sentença:

Vistos etc.

1. RELATÓRIO

O Ministério Público Estadual ofereceu denúncia contra NEURANDY ROSA DA SILVA, qualificado nos autos, como incurso nas sanções penais do artigo 217-A do Código Penal.

Segundo consignado na inicial:

"Consta do incluso Inquérito Policial, constante no ID 321549391, que o denunciado violentara sexualmente, de modo reiterado, a sua ex-enteada, aqui vítima, a pessoa de Geovanna Vitória de Souza Soares, quando a menor tinha entre 07 e 11 anos de idade, vindo a materializar ato de conjunção carnal com a vítima. O denunciado manteve relação de união estável com a avó da vítima, num período em que a vítima também residira sob o mesmo teto de sua avó, tendo exercido, por isso, a função de avô (por afinidade) da vítima. A notícia de crime fora evidenciada em decorrência da mudança de comportamento da vítima, a partir dos seus 12 anos de idade, expressando desejo suicida, executando atos de auto-mutilação, demonstrando isolamento social e baixa auto-estima. Mencionada mudança comportamental fora notada pela genitora da vítima, pela avó da vítima (ex-companheira do denunciado) e pelos professores da vítima. Assim, após indagar da vítima os motivos para a sua mudança comportamental, a sua genitora, bem como a sua avó, conseguiu descobrir os abusos sexuais praticados pelo denunciado.”.

O Inquérito Policial (ID 321549394) tem como peças principais o relatório do CREAS (fls.12), o Laudo de exame pericial (fls. 17), termos de depoimento das testemunhas (fls. 20/25), termo de interrogatório (fls. 26).

No relatório final, a Autoridade Policial representa pela prisão preventiva do réu.

O MP apresenta denúncia e opina pelo deferimento da prisão preventiva do réu.

Denúncia recebida em 11/05/2023 bem como a prisão preventiva foi decretada.

O réu foi citado (fls. 13), preso em 25/05/2023 (fls. 17). Não apresentou defesa e lhe foi nomeado defensor dativo (fls. 21).

Apresentou defesa prévia (fls. 26).

Durante a instrução criminal, foram ouvidas a vítima e a mãe da vítima. Não foram arroladas testemunhas de defesa. Em seguida, o réu foi interrogado, em audiência realizada por videoconferência, consoante termo de ID 396364028.

O Ministério Público, em alegações finais pugnou pela condenação do acusado conforme a denúncia, com o reconhecimento da continuidade delitiva e da agravante do art. 61, alínea “f” do Código Penal. A defesa requereu a absolvição e, em caso de condenação, a aplicação da pena no mínimo legal

Relatados, decido.

2. FUNDAMENTAÇÃO

Inicialmente, constato que os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, bem como as normas referentes ao procedimento, foram cumpridas.

Passo, então, à análise da materialidade, autoria e responsabilidade penal do acusado.

A) Da materialidade

A materialidade encontra-se comprovada através do laudo de exame pericial, constante às fls. 17 do Inquérito Policial, que “há sinais de desvirginamento antigo”.

Some-se o depoimento da vítima junto ao CRAS, às fls.12/13, onde relata que:

Segundo relato de Geovana os abusos ocorreram durante um período na sua infância, não sabe precisar a idade que tinha, mas acredita que aconteciam quando Geovana tinha entre 07 anos e 11 anos de idade”. E ainda que: “Em acolhimento psicológico Geovana, chorou bastante e com muita dificuldade relatou que os abusos eram toques, carícias e uso da força com ela e tentativas com sua irmã Júlia. E que muitas vezes, ao perceber a movimentação do suposto abusador para iniciar os abusos, se colocava para a situação, na tentativa de proteger a irmã Juba da violência. Geovana foi encaminhada por esse CREAS para realização de psicoterapia, visto que necessita de suporte em saúde para tratar de sintomas decorrentes da violência sofrida. Relata ainda, medo do suposto agressor que afirmava que mataria sua mãe e padrasto caso essa, contasse algum dia do ocorrido”.

B) Da autoria

Todas as provas contidas nos autos convergem para demonstrar que o acusado foi, de fato, o autor dos abusos e estupro praticados contra a vítima, conforme descrito na denúncia.

A vítima, quando ouvida em Juízo, afirmou que o réu era marido de sua avó e ele morava com a declarante; que o réu começou a mexer com ela quando esta tinha 10 anos e perdurou até a declarante ter 11 anos; que o réu lhe fazia ameaças que ia fazer pior caso a declarante falasse algo; que tentou falar quando o réu foi embora pra Minas; que quando ele voltou, a declarante contou pra mãe; que sua avó acreditou na declarante e foram fazer corpo de delito; que a declarante mudou de comportamento; que começou a se cortar e gerou muita dor; que não quis ir pra psicóloga.

Disse que não sabe a frequência, mas sempre acontecia quando estavam a sós até ele ir embora; que o réu era seu padrinho de consideração; e afirma que o réu lhe constrangeu a ter conjunção carnal.

Na sequência, foi ouvida a mãe da vítima. Esta disse que a sua filha mudou o comportamento; que sua filha se escondia quando o réu chegava em casa, pois ele frequentava a casa pois ele tinha sido companheiro de sua mãe; que o réu era como um avô por afinidade; que confiava nele; que era padrinho do filho de seu esposo; que seus filhos o chamavam de padrinho.

Ouvido o réu, este disse não se lembrar se aconteceu algo ou não entre ele e a vítima; que costumava beber e não se lembrava de nada.

Diante de todo exposto, dúvidas não pairam quanto a autoria e a responsabilidade penal do réu na prática do delito em exame. O depoimento da vítima e de sua mãe, além do laudo pericial juntados aos autos são provas suficientes.

O Ministério Público ressalta a continuidade delitiva, o que ficou demonstrado. No seu depoimento, a vítima informa que os abusos se deram desde os 10 anos até os 11 anos e o laudo pericial informa o desvirginamento antigo.

Os requisitos do art. 71 do CP traz como requisitos: a pluralidade de ações, mesma espécie de crimes e mesmas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, restando, assim, caracterizada a continuidade delitiva, eis que o nosso Código Penal, nessa matéria, adotou a teoria puramente objetiva, conforme esclarece no item 59 de sua Exposição de Motivos.

Ressalta, ainda, a agravante descrita no art. 61, alínea f do CP, quando o crime é praticado prevalecendo-se da relação doméstica de coabitação e hospitalidade, o que também restou demonstrado. O réu conviveu com a avó da vítima e, mesmo depois de separado, frequentava a casa; que era uma pessoa de confiança, inclusive era padrinho do filho do marido da mãe da vítima e seria o padrinho da irmã mais nova da vítima, mas não deu tempo de batizar.

3. DISPOSITIVO

Diante do exposto, julgo PROCEDENTE a ação penal, para CONDENAR NEURANDY ROSA DA SILVA, já qualificado, como incurso nas sanções penais do artigo 217-A c/c art. 71 e 61, alínea f, todos do Código penal.

4. DOSIMETRIA DA PENA

Passo à dosimetria da pena, em observância ao princípio constitucional da individualização da pena, art. 5º, XLVI, da Constituição Federal de 88, nos termos dos artigos 59 e 68, ambos do CP.

Na primeira fase, examino as circunstâncias judiciais:

a) Culpabilidade: a reprovabilidade da conduta não vai além daquela inerente ao tipo legal.

b) Antecedentes: não há registros de antecedentes criminais

c) Conduta social: os elementos colhidos nos autos não são desfavoráveis à avaliação da conduta social do réu.

d) Personalidade: não há elementos seguros para aferir a personalidade do réu.

e) Motivos: os motivos do crime são os inerentes ao tipo penal.

f) Circunstâncias: inerentes ao tipo penal.

g) Consequências: graves pois além da violência sofrida pela vítima, deixou traumas psicológicos impulsionando, inclusive, que a vítima se cortasse, mudasse seu comportamento na escola afetando, de forma profunda, a sua vida.

h) Comportamento da Vítima: o comportamento da vítima em nada contribuiu para a conduta ilícita.

Ponderadas as circunstâncias judiciais, tendo em vista que uma delas se apresenta desfavorável ao réu, fixo a pena-base em 09 (nove) anos de reclusão.

Das circunstâncias agravantes e atenuantes

Presente a circunstância agravante do art. 61, alínea f do CP, conforme já fundamentado, agravo a pena em 1 (um) ano de reclusão. Ausentes circunstâncias atenuantes, passo à terceira fase da dosimetria.

Das causas de aumento e de diminuição de pena

Presente a causa de aumento da pena prevista no art. 71 do CP (continuidade delitiva), conforme já evidenciado e fundamentado nos autos. Assim, aumento a pena em ½ (metade).

Fica o réu, portanto, condenado definitivamente à pena de 15 (quinze) anos de reclusão.

Regime inicial: o regime inicial de cumprimento da pena é o fechado, com base no art. 33, §2º, "a", do CP.

Substituição da pena ou suspensão condicional da pena: inaplicável a substituição da pena privativa de liberdade e a suspensão da pena em...

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