Mulheres na sala de aula': um estudo acerca do processo de feminização do magistério primário na Corte Imperial (1854-1888)

AutorMarina Natsume Uekane
Páginas35-64
Niterói, v. 11, n. 1, p. 35-64, 2. sem. 2010 35
“MULHERES NA SALA DE AULA”:
UM ESTUDO ACERCA DO PROCESSO DE
FEMINIZAÇÃO DO MAGISTÉRIO PRIMÁRIO
NA CORTE IMPERIAL (1854-1888)
Marina Natsume Uekane
Universidade Federal Fluminense
E-mail: alefrotaschueler@gmail.com
Res umo : A questão da fem iniza ção do
mag istér io prim ário no s éculo X IX tem
co mpa reci do, enqu ant o probl ema na
pr oduç ão his tori ográ fica , com al guma
regul aridade ao longo dos últ imos anos.
A centralidade desta temát ica nos estudos
brasileir os mostra -se impos ta pelo próprio
obje to, pois “hist oricam ente o papel de
formação das novas gerações, tanto no interior
do espaço doméstico, quanto nos espaços
formais de educação, foi sendo naturalizado
como atribuição feminina” e, assim, “uma
cons trução socia l t eria sido subme tida a
uma leitura biologizante” a qual relaciona as
mulheres ao exercício de funções no âmbito
priva do, e m dec orrência de uma suposta
natureza. O presente estudo problematiza a
questão da feminização do magistério primário
no século XIX, na Capital do Império, a partir
da reflexão acerca dos modelos de formação
de professores. Utilizei como base para esta
discussão dados referentes à formação de
professores primários nesta localid ade, por
meio do modelo legitimado pelo Regulamento
de 17 de Fevereiro de 1854 e por intermédio
do modelo instituído pela Escola Normal da
Corte. A temática da feminização se insere em
um panorama de difusão e estabelecimento
da instituição escolar como espaço privilegiado
para fo rmar futuro s c idadãos , a qua l s e
encontrava em processo de formação.
Palav ras-c have: escola norm al; educação
imperial e gênero.
36 Niterói, v. 11, n. 1, p.35-64, 2. sem. 2010
Introdução
Este trabalho analisa a questão da feminização do magistério primário no século
XIX, a partir da reflexão acerca dos modelos de formação de professores. Assim, utilizei
como base dados referentes à formação de professores primários nesta localidade,
por meio do modelo legitimado pelo Regulamento de 17 de Fevereiro de 1854 e
pelo instituído pela Escola Normal da Corte, em 1880. Esta temática se insere em
um panorama de difusão e estabelecimento da instituição escolar enquanto espaço
privilegiado para formar cidadãos, a qual se encontrava em processo de formação
ao longo deste século, o que demonstra a relevância da mesma.
Para esta análise, utilizei como fontes documentos encontrados na série “Ins-
trução Pública” do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro e do “Ensino Primário
– IE5” do Arquivo Nacional; Leis e Regulamentos da Instrução Primária da Corte;
Relatórios do Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Império; produções
da historiografia recente no que tange à formação de professores no século XIX, bem
como referentes à problemática da feminização do magistério primário.
É importante ressaltar que os estudos acerca desta problemática se encontram
em processo de desenvolvimento, especialmente os que se referem ao século XIX.
Em levantamento acerca das produções da área,1 pude observar a existência de
trabalhos que tratam ou se assemelham à questão da formação de professores no
Oitocentos, os quais servem como indicativo da discussão relativa a este tema. A
fim de organizar este estudo, primeiramente apresento um quadro acerca da forma
como a instrução primária estava estabelecida na Capital do Império, analisando a
formação pela prática com a figura dos adjuntos, maneira pela qual os professores
eram formados para tal ofício. Em seguida, trato da formação na Escola Normal da
Corte, trazendo para a discussão seu regulamento e o seu funcionamento. E, por
último, analiso a questão da feminização do magistério na Corte, tendo como base
estudos realizados acerca desta temática.
Na esfera e nos limites de execução desta análise, o tema do preparo dos
professores se constituiu em uma constante, que pode ser evidenciada em um
duplo registro fortemente articulado. O primeiro implica pensar a diferença entre o
programa da formação prévia e a aprendizagem profissional pela prática, via figura
dos adjuntos. A escola moderna, de acordo com as representações que procurou
criar acerca de si, precisava se afastar dos métodos antigos, artesanais, considerados
arcaicos e desprovidos de ciência. Desse modo, a polaridade ciência e arte, escola
1 Os trabalhos e artigos aqui analisados pertencem aos quatro Congressos Brasileiros de História da
Educação, à Revista Brasileira de História da Educação e à Revista de História da Educação. De acordo
com os objetivos deste estudo, alguns trabalhos foram mencionados no texto e outros utilizados como
referência.

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