A Nova Escola

AutorAntônio Celso Alves Pereira
Páginas39-56
39
A NOVA ESCOLA
Antônio Celso Alves Pereira
INTRODUÇÃO
Do extraordinário avanço das tecnologias da informação, iniciado nas
últimas décadas do século passado, e que prossegue acelerado nestes primeiros
tempos do Terceiro Milênio, resultou, como se sabe, uma virtualidade
profundamente transformadora, que encolheu os horizontes do mundo e, em sua
paradoxal duplicidade, para o bem, integra culturas, divulga a ciência, facilita o
processo de ensino/aprendizagem, portanto, educa, comunica, informa, diverte,
facilita serviços e revoluciona o comércio, ao mesmo tempo em que realiza a
combinação dos tempos artificiais produzidos pela tecnologia com os ritmos, ruídos
e todos os interesses e afazeres humanos. Para o mal, propiciou a criação esgotos
virtuais globais, nos quais mentirosos e farsantes destroem reputações, pedófilos e
pornógrafos ultrajam a dignidade humana e fundamentalistas propagam intolerância
e terror em todo o mundo. “A fragmentação e proliferação das diver sas noções de
tempo que hoje possuímos diz o sociólogo catalão, Salvador Giner, professor na
Universidade de Cambridge , enfraquecem as categorias temporais básicas, que
ordenavam nossa concepção da história assim como do tempo mesmo, seja humano,
divino ou cósmico”.1 Em razão disso, assegura Klaus Schwab, fundador e presidente
executivo do Fórum Econômico Mundial, as mudanças são tão profundas, que, na
perspectiva da história da humanidade, nunca houve um momento tão
potencialmente promissor e, ao mesmo tempo, tão potencialmente perigoso2.
Vivemos, na contemporaneidade, tempos de mudanças científicas e tecnológicas que
conduzem a humanidade a uma nova Era, à Quarta Revolução Industrial, ao domínio
da inteligência artificial, da introdução dos veículos autônomos, da impressão em
3D, dos sucessos da nanotecnologia, da biotecnologia, dos novos materiais, e da
1 GINER, Salvador. O tempo do poder: a propósito da filosofia histórica de Giacomo Marr amao.
Prólogo à obra de Giacomo Marramao, Poder e Secularização As Categorias do Tempo. Tradução de
Guilherme Alberto Gomes de Andrade. São Paulo: Editora UNESP, 1995, p. 15.
2 SCHWAB, Klaus. Quarta Revolução Industrial - 4.0 Apresentação: Cesar Sanson UFRN/IHU
Diagramação: Jonathan Camargo IHU. Ver em:
http://www.ihu.unisinos.br/images/ihu/apresentacoes_palestrantes/30_05_17_cesar_sanson_revoluca
o_4.0.pdf Acesso em 25 jan 2019.
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decifração do código genético, conquistas que até recentemente eram compreendidas
apenas nas esferas da ficção, do sonho e da fantasia. O surgimento, e m 1990, do
Google, e da Wikipédia, em 2001, bem como a disponibilização por parte das
grandes bibliotecas online, como a Gallica Biblioteca Digital da Biblioteca
Nacional da França, entre dezenas de outras, de seus recursos virtuais de consulta
livre, informações e acervos à disposição de todos, expressam hoje o que o genial
escritor argentino Jorge Luis Borges, de certa forma, vaticinara em um dos
maravilhosos contos reunidos em seu livro Ficciones, de 1944, intitulado Biblioteca
Babel. Trata-se de um texto metafísico, que expressa a realidade de um mundo
constituído por uma biblioteca infinita, congregando livros de todos os tempos,
passado e futuro, à espera de quem quiser consultá-los e decifrá-los. A Biblioteca
Babel de Borges pode ser vista, portanto, como uma antevisão da Sociedade da
Informação.
Em todos os períodos da história da trajetória humana em que se
processaram transformações sociais intensas, decorrentes, em parte, da emergência
de tecnologias disruptivas, ocorreram mudanças fundamentais na cultura e na
economia e, evidentemente, nos processos de ensino e aprendizagem. Nesse sentido,
achando-se a sociedade contemporânea em fase de transição, chamada, entre outros
epítetos, de sociedade do conhecimento, nela vigoram novas formas de socialização,
novas estruturas sociais e novas profissões despontam periodicamente. A família,
fundamento da sociedade e partícipe, juntamente com o Estado e a sociedade, do
processo educativo3 não é mais singular, é plural, como explicita o artigo 226 da
Constituição Federal, Valores tradicionais que nortearam a vida familiar por séculos
desapareceram. Discutindo a nova estrutura familiar, o filósofo Luc Ferry aponta que
o “advento do amor como único fundamento legítimo dos casais e das famílias logo
ultrapassa o âmbito do casamento e se torna a regra de todas as uniões amorosas,
quer as pessoas sejam casadas ou não, quer sejam do mesmo sexo ou não”.4
Considerando o fato de que mudou o mundo, mudou a sociedade, mudou a
família, é fundamental mudar a escola. Seu papel hoje é oferecer adequadas
ferramentas pedagógicas que deem condições ao educando para aprender a aprender,
eleger seus interesses, compreender o mundo em constante transformação e,
principalmente as suas próprias circunstâncias. Determinante disso, é evidente que
essas novas ferramentas pedagógicas não podem conviver com as metodologias de
ensino e aprendizagem do século XIX que, ainda hoje, preponderam na grande
3 Artigo 205 da Constituição Federa de 1988.
4 FERRY, Luc. Do Amor: uma filosofia para o século XXI. Rio de Janeiro: DIFEL, 2013, p. 151.

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