O tratamento internacional da propriedade intelectual: um panorama das divergências e complementaridades entre OMPI e OMC

AutorCarlos Augusto Sousa de Oliveira
CargoAdvogado. Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (2º/2007)
Páginas1-16
Regras para Citação:
OLIVEIRA, C. A. S. O Tratamento Internacional da Propriedade Intelectual: Um
panorama das Divergências e Complementaridades entre OMPI e OMC. Revista do s
Estudantes de Direito da Universidade de Brasília, n. 8, p. 175-207, 2009.
O TRATAMENTO INTERNACIONAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL: UM PANORAMA DAS
DIVERGÊNCIAS E COMPLEMENTARIDADES ENTRE OMPI E OMC
*
Carlos Augusto Sousa de Oliveira
**
R
ESUMO
:
O presente artigo tem por objetivo a descrição do estado da arte do tratamento internacional da
propriedade intelectual. Para apreciação desse tema, buscou-se com preender as condições que conduziram a uma
inserção do tema da propriedade intelectual nos debat es comerciais internacionais e ao traslado do palco central
de discussão a respeito do tema da OMPI para a OMC.
P
ALAVRAS
-
CHAVE
:
Propriedade intelectual. Política internacional. OMPI. OMC.
A
BSTRACT
:
The article presented aims at describing the current state of the international treatment of intellectual
property. To address such issue, the author sought to understand the conditions wh ich determined the insertion of
intellectual property in the international trade debates and the transition of the central stage for discussion of
intellectual property issues from WIPO to the WTO.
K
EYWORDS
:
Intellectual property. International politics. WIPO. WTO.
1. Introdução
O direito de propriedade intelectual é instrumento legal de incentivo à inovação e sua
divulgação. Durante o século XIX, o direito de propriedade intelectual assumiu os contornos
principiológicos e normativos com que hoje mormente se apresenta. Foi a partir da segunda
metade daquele século que, por decorrência de sua própria relevância e expansão, o tema da
propriedade intelectual foi objeto de internacionalização, mediante a formulação das
Convenções de Paris e de Berna. A partir de então, e durante a maior parte do século XX, a
administração de tais convenções, como também a regência institucional do tema no âmbito
internacional, ficou entregue a organizações internacionais que entre si se sucederam: as
Uniões de Paris e de Berna, que se aglutinaram sob a BIRPI, a qual, por sua vez, foi reformada,
dando lugar à OMPI.
Sob a égide da BIRPI/OMPI, das Convenções e de outros instrumentos normativos
formulados para reger temas afins, o tratamento internacional da propriedade intelectual se
resumia à designação de princípios gerais a serem obedecidos pelos países signatários. Em
decorrência de pressões o riundas de setores produtivos de países desenvolvidos, foram
depostas novas demandas inerentes ao tema da propriedade intelectual e acabou-se por
atrelá-lo a questões comerciais.
Quando da conclusão da Rodada Uruguai do GATT, com o advento da OMC e do acordo
TRIPs, estabeleceram-se limites m ínimos de proteção à propriedade intelectual a serem
observados por todos os Estados-parte daquela organização comercial mundial. Nos anos que
se seguiram o bservou-se o fortalecimento da OMC como centro de discussão sobre o tema,
*
Artigo produzido a partir de pesquisa de iniciação científica conduzida pelo autor no âmbito do PIBIC /UnB, entre
julho de 2006 e julho de 2007, como bolsista do CNPq.
**
Advogado. Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (2º/2007).
2
em substituição ao papel desempenhado pela OMPI até ali. O presente trabalho tem por
escopo apresentar uma reflexão a respeito das razões e das conseqüências da transição do
tema da OMPI para a OMC.
O artigo está dividido em cinco seções. A primeira se ção se destina a uma breve
apresentação dos direitos de propriedade intele ctual e, para tanto, se dedica a uma
apresentação da propriedade intelectual como corpo jurídico de princípios e regras. A segunda
seção trata da internacionalização do tema da propriedade intelectual, desde seus primó rdios
na primeira metade do século XIX até o regime da OMPI. A terceira seção apresenta o sistema
multilateral de comércio conforme desenvolvido no século XX até o advento da OMC. O
acordo TRIPs é apresentado nessa terceira etapa do trabalho, como desdobramento do regime
da OMC. A quarta seção se ocupa das atuais interfaces entre a OMPI e a OMC. Por fim, a
quinta seção procura apresentar críticas e alternativas propostas ao atual modelo de regência
da propriedade intelectual.
2. Propriedade Intelectual: considerações iniciais
É antiga a preocupação com a proteção jurídica de obras literárias, invenções, idéias e
demais obras do intelecto. Já em 1474 Veneza havia desenvolvido um sistema de proteção de
patentes e em 1 623 foi concebida na Inglaterra a Lei dos Monopólios (Statute of Monopolies),
que, delimitando os direitos sobre invenções, apenas permitiu a monopolização de métodos
de fabricação e somente por parte do inventor original e real
1
.
Nada obstante a antiguidade do interesse pela tutela jurídica e a atribuição de
titularidade sobre o bras do intelecto e a despeito de uma re lativa – e m ais recente
concordância em se designar tais criações pela denominação ge nérica de “propriedade
intelectual”, enunciar tal conceito é tarefa difícil, muitas vezes se apelando a definições
ostensivas para delimitar o campo semântico próprio da expressão
2
.
Roger Schechter e John Thomas definem o termo “propriedade intelectual” como sendo
(...) uma descrição apta para a matéria objeto dos direitos que dão origem a
interesses proprietários sobre criações da mente. As pri ncipais disciplinas legais
da propriedade intelectual são copyright
3
, que diz respeito a obras artísticas e
literárias; patentes, relativas a inovações práticas; e marcas, referentes a
símbolos comerciais
4
5
.
Não é a intenção do presente trabalho oferecer uma definição última, antes sendo o
conceito de “propriedade intelectual” acessório ao alcance dos objetivos buscados: a falta de
delimitação precisa do conceito não obsta a reflexão jurídica a respeito da política econômica
global referente à propriedade intelectual. Entretanto, é conveniente e imprescindível que se
designem, ao menos em linhas gerais, quais são as características normalmente atribuídas aos
1
Drahos, 1998, p. 3.
2
Drahos, 1998, p. 1.
3
É apenas c om base na proximidade de escopos que se poderia traduzir “copyright” por “direito de autor”. Em
princípio, há distinções entre tais institutos jurídicos, como há distinções entre os concertos jurídicos que lhes
permitiram a formação e em que têm aplicação. Em termos gerais, a diferença assenta na inclinação do copyright a
resguardar mais propriamente interesses comerciais de exploração sobre a obra, enquanto o direito autoral, sem
descurar da dimensão patrimoni al da tutela, também se desdobra em uma proteção da esfera moral do criador da
obra. Na tradição continental, em que surgido o direito autoral, para além do interesse econômico, manifesta-se o
entendimento de que é a obra intelectual expressão da personalidade de seu autor, o que justifica o especial
resguardo da esfera moral (Staut Júnior, 2006, notadamente a nota 164, constante da p. 97).
4
Schechter, 2003, p. 1.
5
Tradução livre de: “[intellectual property] is an apt description for the subject matter of the laws that give rise to
proprietary interests in creations of the mind. The principal legal intellectual property disciplines are copyright,
which concerns artistic and literary works; patent, pertaining to pragmatic innovations; and trademark, relating to
commercial symbols”.

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