O ecletismo do paradigma da sustentabilidade: construção e análise a partir dos estudos organizacionais

AutorLuciano Munck - Rafael Borim de Souza
CargoVice-Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Estadual de Londrina (PPGA-UEL). Doutor em Administração pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP). End.: Rodovia Celso Garcia Cid ? Pr 445 Km 380 ? Campus Universitário, Londrina ? PR. Cx. Postal 6001. CEP: 8605...
Páginas202-242
202 Revista de Ciências da Administração • v. 13, n. 29, p. 202-242, jan/abr 2011
Luciano Munck • Rafael Borim de Souza
O Ecletismo do Paradigma da Sustentabilidade:
construção e análise a partir dos estudos
organizacionais
Luciano Munck1
Rafael Borim de Souza2
Resumo
Este artigo possui dois objetivos principais: (1) investigar as nuanças que um
paradigma da sustentabilidade, como proposição de lente de observação da
realidade para os contextos organizacionais deve assumir; e (2) apresentar e definir
um paradigma da sustentabilidade, eclético, dialógico e flexível, por meio do qual
o desenvolvimento sustentável possa ser assumido como um fenômeno de pesquisa
coerente junto aos estudos organizacionais. Realizou-se um estudo qualitativo,
exploratório e bibliográfico. Foi desenvolvido um referencial teórico com o intuito
de observar possíveis inter-relações entre algumas discussões sobre o
desenvolvimento sustentável e contribuições específicas extraídas dos estudos
organizacionais. O paradigma da sustentabilidade, em suma, é concebido pelo
estudo da relação entre o desenvolvimento sustentável e os estudos organizacionais,
uma vez que compreende o desenvolvimento sustentável como um fenômeno de
investigação que importa ao contexto das organizações.
Palavras-chave: Desenvolvimento Sustentável. Estudos Organizacionais.
Paradigma.
1. Introdução
Conceder um lócus paradigmático aos fenômenos de pesquisa relacio-
nados aos estudos organizacionais torna-se, cada vez mais, um exercício ana-
lítico que ganha níveis de complexidade que reforçam a capacidade limitada
1Vice-Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Estadual de Londrina (PPGA-UEL). Doutor em
Administração pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP). End.: Rodovia Celso
Garcia Cid – Pr 445 Km 380 – Campus Universitário, Londrina – PR. Cx. Postal 6001. CEP: 86051-980 – Brasil. E-mail: munck@uel.br.
2Doutorando em Administração pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Paraná (PPGADM-UFPR) e Mestre em Admi-
nistração pelo Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Estadual de Maringá em consórcio com a Universidade Esta-
dual de Londrina (PPA-UEM/UEL). End.: Rua Senador Souza Naves, 2677, apto.1601, Londrina – PR. CEP: 86015-430 – Brasil.
E-mail: rafaborim@yahoo.com.
Artigo recebido em: 09/06/2010. Aceito em: 14/02/2011. Membro do Corpo Editorial Científico responsável pelo processo editorial: Emerson
Antonio Maccari.
Esta obra está sob a Licença Creative Commons Atribuição-Uso.
DOI: 10.5007/2175-8077.2011v13n29p202
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da racionalidade humana. Ao se identificar com uma determinada escola do
conhecimento ou ao defender os preceitos que regem uma abordagem
epistemológica específica, inconscientemente, por vezes conscientemente, o
pesquisador assume uma identidade que despreza uma quantidade conside-
rável de contribuições científicas, as quais poderiam incrementar as informa-
ções coletadas em quantidade e qualidade, e, principalmente, conceder
melhor qualificação às categorias de análise a serem pesquisadas (LICOLN;
GUBA, 2006).
No que se refere ao tratamento do desenvolvimento sustentável por
diretrizes estabelecidas em algumas ramificações dos estudos organizacionais
que buscam pesquisar tal expressão, é possível identificar dois parâmetros
discursivos marcadamente distantes: (1) o primeiro foca a operacionalização
de indicadores e mensurações que comprovem, quantitativamente, a exis-
tência de comportamentos organizacionais orientados para o desenvolvimento
sustentável; e (2) a segunda busca fundamentar uma discussão teórica que
desqualifique os trabalhos empíricos desenvolvidos na primeira vertente, ao
qualificá-los como reducionistas e simplistas (MEBRATU, 1998; MILNE;
KEARINS; WALTON, 2006).
Esses dois movimentos extremistas não dialogam entre si, logo, não tro-
cam conhecimentos e, por consequência desse distanciamento, ficam isola-
dos em suas convenções paradigmáticas, as quais são assumidas e aceitas
por aqueles que as defendem como verdades absolutas e inquestionáveis.
A incompatibilidade entre essas posições radicais não é exclusiva à discus-
são do desenvolvimento sustentável e não é de propriedade única dos fenô-
menos estudados pela Administração, mas sim, conforme admoestações de
Mattos (2009), é inerente à proposição de relacionar quaisquer fenômenos
que quando analisados separadamente produzem inúmeras dissenções.
Kuhn (1970) em suas discussões já previa que toda análise sobre temas
em desenvolvimento exigiria a evolução de padrões de pensamentos crista-
lizados pelo tempo, os quais, pela devoção de seus seguidores, continuariam
sendo gradativamente perpetuados e protegidos, mesmo que por meio de
comprovadas manifestações da realidade fique denunciada a incongruência
de suas contribuições para com aquele momento histórico.
Esse comportamento protecionista promove uma relativização das evo-
luções conceituais ocorrentes nestes círculos elitistas, situação esta que não
permite, ao menos no curto prazo, a tramitação de conceitos e métodos entre
perspectivas extremas do conhecimento (LAUDAN, 1996; KUHN, 1970).
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Tal isolamento epistemológico, em que cada abordagem busca conhe-
cer o que há no mundo à sua maneira sem a consideração de vieses conside-
ravelmente importantes, exige o que Lincoln e Guba (2006) denominam de
exercício da interdisciplinaridade. Por ele, os estudos que se vinculam aos
contextos organizacionais conseguem ter seus respaldos científicos continua-
mente reforçados. Sem uma efetiva relação de compartilhamento de conhe-
cimentos não é possível um desenvolvimento teórico efetivo junto aos pro-
blemas de pesquisa investigados pela Administração.
Por tais considerações foi desenvolvido o presente artigo com o interes-
se de alcançar dois objetivos principais: (1) investigar as nuanças que um
paradigma da sustentabilidade, como proposição de lente de observação da
realidade para os contextos organizacionais deve assumir; e (2) apresentar e
definir um paradigma da sustentabilidade, eclético, dialógico e flexível, por
meio do qual o desenvolvimento sustentável possa ser assumido como um
fenômeno de pesquisa coerente junto aos estudos organizacionais.
Mediante a necessidade de conceder resposta aos objetivos
supramencionados foram selecionadas algumas contribuições específicas de
discussões oriundas dos estudos organizacionais, de categorizações para aná-
lise do desenvolvimento sustentável e de posturas epistemológicas. Em rela-
ção aos estudos organizacionais foram selecionados os paradigmas sugeri-
dos por Burrell e Morgan (1979), os pontos de interseção propostos por Reed
(2007) e a segmentação teórica apresentada por Marsden e Townley (2001).
No que concerne às categorizações para a análise do desenvolvimento sus-
tentável foram escolhidas as correntes paradigmáticas abordadas por Gladwin,
Kennelly e Krause (1995), a análise conceitual desenvolvida por Mebratu
(1998) e a estrutura semântica do desenvolvimento sustentável conferida por
Fergus e Rowney (2005) e Lélé (1991). Sobre as posturas epistemológicas,
as que são privilegiadas por Denzin e Lincoln (2006) e Schwandt (2006)
foram brevemente introduzidas, sendo elas: o positivismo, as filosofias
interpretativistas e o construcionismo social.
Pelo caráter interdisciplinar extraído da relação entre todas as contri-
buições supramencionadas, a teoria do agir organizacional (MAGGI, 2003a)
foi acatada como o corpo teórico que concede sustentação para esta
vinculação entre desenvolvimento sustentável e estudos organizacionais por
meio da proposição de um paradigma da sustentabilidade. Considerações
sobre a diferença entre o desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade
são apresentadas na última seção do artigo, na qual será introduzido o
paradigma discutido.

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