Paramirim - Vara cível

Data de publicação17 Agosto 2021
Número da edição2922
SeçãoCADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE PARAMIRIM
INTIMAÇÃO

8000874-20.2021.8.05.0187 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Paramirim
Interessado: Jose Marques Cardoso Registrado(a) Civilmente Como Jose Marques Cardoso
Advogado: Jose Oliveira Dos Anjos (OAB:0039036/BA)
Interessado: Estado Da Bahia

Intimação:

I – RELATÓRIO

1.Trata-se de ação de procedimento comum com pedido de tutela antecipada, ajuizada por JOSE MARQUES CARDOSO, em face do ESTADO DA BAHIA, sob o argumento de ser portador da síndrome de Guillain Barré, um distúrbio autoimune, postulando a concessão judicial de medicamento.

2. Relata que o sistema imunológico de seu corpo ataca parte do seu sistema nervoso. A síndrome, consoante relatório médico, surgiu há aproximadamente 04 (quatro) meses, como consequência de procedimento cirúrgico na cabeça. Para tratamento, necessita do uso contínuo de IMUNOGLOBULINA HUMANA 2G/KG, medicamento aprovado pela Anvisa. O mesmo relatório indica a necessidade de administração de altas doses de medicamentos, por infusão endovenosa, sem fornecimento pelo SUS.

3. Em dois pedidos anteriores, o SUS negou-se ao fornecimento do medicamento, que não pode ser adquirido pelo autor, em decorrência do seu custo elevado, não dispondo de recursos financeiros suficientes, sendo beneficiário da previdência social, com renda familiar mínima de um salário mínimo.

4. Ao final, requer o deferimento da tutela antecipada para compelir o réu ao fornecimento do medicamento.

5. Com a inicial vieram documentos em anexo, entre os quais: indeferimento pelo SUS e relatórios médicos.

É o relatório. Fundamento e decido.

II – FUNDAMENTAÇÃO

6. Em análise superficial, inerente às medidas tidas como urgentes, como é o presente de tutela de urgência antecipatória, verifico que merece lograr êxito a requerente em suas razões, eis que a probabilidade do direito invocado (fumus boni iuris) e o risco da ineficácia de se aguardar até provimento final (periculum in mora) está demonstrada de plano.

7. A pretensão amolda se ao conceito de tutela de urgência, sendo uma das modalidades da tutela provisória prevista no artigo 294 e seguintes do Código de Processo Civil. As tutelas provisórias (de urgência e de evidência), vieram sedimentar a teoria das tutelas diferenciadas, que rompeu com o modelo neutro e único de processo ordinário de cognição plena. São provisórias porque as possibilidades de cognição do processo ainda não se esgotaram, o que apenas ocorrerá no provimento definitivo.

8. Os requisitos da tutela de urgência estão previstos no artigo 300 do CPC, sendo eles: probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. No caso dos autos a cognição sobre os pedidos e os fundamentos da demanda precisa ser sumária porque não há tempo para fazê-lo de forma mais aprofundada, em razão da urgência.

9. Assim, em juízo de probabilidade, não se exige certeza quanto aos fatos, mas uma provável existência do direito invocado. “Para análise do requisito, o Magistrado não se aprofunda na verificação da existência do direito invocado ou a ser invocado. Sendo a sumariedade da cognição característica das tutelas provisórias, basta um juízo hipotético, de probabilidade, a respeito da pertinência da pretensão principal.” (Gajardoni, Fernando. Comentários ao Código de Processo Civil, 4a Ed., Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 417/418).

10. Os documentos juntados pela parte autora, por hora, satisfazem a pretensão formulada. Há indicativos de que lhe assiste o direito à antecipação da tutela pretendida, é a verossimilhança identificada pelo cotejo entre o narrado e o verificado, condição essencial para a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.

11. Os documentos anexos são cristalinos ao exteriorizar que o paciente autor foi diagnosticada com “deficit apendicular ascendente, evoluindo para tetraparesia”, caracterizando CID: G610 – síndrome de Guillan Barré, necessitando realizar pulsoterapia com imunoglobulina 2g/kg, dividido em 5 dias, sendo que o “não uso implicará de modo severo na qualidade de vida do paciente quiça na própria sobrevida”. Restou, assim, identificada a probabilidade do direito.

12. Dos relatórios médicos e das prescrições médicas em anexo, está devidamente comprovada nos autos a necessidade do medicamento referido, bem como a gravidade do caso em questão, o que dispensa a necessidade de oitiva da parte contrária para a concessão da medida requerida, especialmente ante a aparente omissão estatal que se apresenta externada pelas recusadas operadas pelo SUS.

13. O provável perigo decorre do risco à saúde da autora, até mesmo porque a demora no caso em tela poderá ter consequências irreparáveis, por se tratar de tratamento de saúde que não pode ser interrompido, sendo que a presente solução não pode aguardar a demora normal do desenvolvimento da marcha processual.

14. No caso em apreço o quesito está presente porque uma vez negada a liminar, o risco de dano irreparável à saúde da demandante é não só presente, como sobretudo provável, o que, em nenhuma hipótese, pode ser admitido, eis que o valor a se proteger in casu, prevalece sobre qualquer respeito burocrático administrativo para o fornecimento dos medicamentos ao paciente.

15. A saúde, como bem de extraordinária relevância à dignidade da pessoa humana, e indissociável do direito à vida, foi elevada pela Constituição Federal de 1988 à condição de direito fundamental do homem (CF, arts. 1º, III; 6º; 23, I; 196; e, 198, II).

16. Dos referidos preceitos constitucionais, conclui-se que a Constituição assegura à generalidade dos cidadãos, independentemente de sua condição econômica e/ou social, o direito à saúde, impondo ao Poder Público o dever constitucional de garanti-lo, por meio de políticas públicas, ações e serviços que permitam o acesso de todos à assistência hospitalar, ambulatorial, médica e farmacológica.

17. A Lei n. 8.080/90, em seu art. 2º, no mesmo sentido, destacou ser o direito à saúde um direito fundamental do ser humano, incumbindo ao Estado prover as condições ao seu pleno exercício, disciplinando o SUS, incumbindo aos entes referidos a prestação de serviços de saúde à população.

18. Logo, o direito constitucional à saúde deve ser garantido por meio das ações do SUS, sendo dever do Estado, aí incluído os três níveis da federação, prestar assistência terapêutica integral e gratuita, até mesmo, farmacológica, àqueles que dela necessitam.

19. A assistência farmacêutica, contida expressamente na Lei Orgânica da Saúde, é tratada pelo Ministério da Saúde por meio da Portaria n.º 3.916, de 30/10/1998, que criou a Política Nacional de Medicamentos, sendo que no seu item 3.3, d, consta que o processo de descentralização não exime os gestores federais e estaduais da responsabilidade relativa à aquisição e distribuição dos medicamentos em situações especiais.

20. A Política Nacional de Medicamentos é parte essencial da Política Nacional de Saúde, garantindo a necessária segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, a promoção do uso racional e o acesso da população. Ademais, a integralidade de assistência, conforme dispõe o artigo 7º, inciso II, da Lei Orgânica da Saúde, define o dever do Estado em fornecer não só os medicamentos constantes da lista oficial, mas sim todos os que forem imprescindíveis às particularidades do caso concreto.

21. Indene de dúvida quanto ao dever do Estado de fornecer os medicamentos necessários para o tratamento de toda e qualquer enfermidade, seja eles constantes da lista oficial ou seja aqueles que não constem na mesma ou não sejam fornecidos pelo SUS. Cabe ao Poder Público, por meio dos recursos que se fizerem necessários ao tratamento das pessoas que padecem de doença, garantir a sobrevivência das mesmas e sua sadia qualidade de vida, aliviando as dores e os sofrimentos próprios dessa enfermidade.

22. Por fim, em atenção ao § 3º do artigo 300 do CPC, há a possibilidade de reversibilidade da medida pleiteada, visto que ao final do processo, com possível julgamento contra o requerente, este poderá ser condenado em realizar devolução de valores aos requeridos, enquanto o indeferimento da medida pode causar danos graves e permanentes ao autor que a mera conversão em pecúnia.

III – DISPOSITIVO

23. Ante o exposto, DEFIRO A LIMINAR PLEITEADA e DETERMINO ao ESTADO DA BAHIA que providencie, no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas, o fornecimento do medicamento IMUNOGLOBULINA HUMANA 2G/KG, necessários para a promoção da recuperação plena da parte autora-paciente, JOSE MARQUES CARDOSO nos termos dos Relatórios Médicos acostados aos autos, pelo período que perdurar a prescrição médica necessária ao seu tratamento.

24. Dada a gravidade irreversível que poderá ocasionar no estado de saúde do beneficiário em razão da ausência dos medicamentos, e para que não haja dúvida quanto ao caráter de urgência do cumprimento da medida liminar, fixo pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada ao montante de R$ 50.000,00, sem prejuízo de prática de ato atentatório ao exercício da jurisdição, aplicação da multa prevista no art. 77, §§ 2o e 5o, do CPC, e da responsabilização dos agentes envolvidos.

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