Paripiranga - Vara cível

Data de publicação18 Fevereiro 2022
Gazette Issue3043
SectionCADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE PARIPIRANGA
INTIMAÇÃO

8001124-18.2019.8.05.0189 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Paripiranga
Autor: Raimundo Jose Goncalves
Advogado: Ubirajara Dias Rabelo Andrade (OAB:BA46341)
Reu: Centrape - Central Nacional Dos Aposentados E Pensionistas Do Brasil
Advogado: Juliano Martins Mansur (OAB:RJ113786)

Intimação:

Vistos etc...

Dispensado o relatório, conforme preceito da Lei nº 9.099/95.

D E C I D O.

Na exordial, a parte autora afirma ser beneficiária de pensão por morte rural junto ao INSS, com recebimento de valores na instituição aqui ré. Ao solicitar extrato de consignados, foi surpreendida com a informação de existência de empréstimo na modalidade RMC, no valor de R$ 1.197,60 (mil e cento e noventa e sete reais e sessenta centavos), contrato nº 20199005268000070000, supostamente celebrado em 17 de maio de 2019, com parcelas no valor de R$ 55,00 (cinquenta e cinco reais), ocorrendo descontos entre junho e outubro de 2019 e se encerrando em novembro do mesmo ano. Aponta ainda que os extratos bancários da conta de titularidade do requerente não demonstraram crédito referente ao negócio jurídico discutido, durante o período citado.

Em sua contestação (Id. n. 110099967), o demandado apenas defende a legitimidade da contratação, aduzindo a anuência da parte autora com os termos do contrato e serviço. Entretanto, NÃO acostou aos autos contrato instrumento da suposta relação jurídica, NEM comprovante de disponibilização de crédito na conta do autor.

Cumpre destacar que fora oportunizado à parte ré, por duas vezes, trazer aos autos o contrato objeto dos autos, bem como comprovante de disponibilização de crédito (Ids. n. 114133266 e n. 126421606), entretanto, os prazos transcorreram sem manifestação do demandado.

Nas relações de consumo, como é o caso dos autos, o ônus probatório é da parte ré/fornecedor, nos termos do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, notadamente por se tratar de fato negativo (juntada de contrato).

Nesse caso, o réu não comprovou fato extintivo, modificativo ou impeditivo do direito da parte demandante, notadamente porque se trata de uma prova negativa para esta, consistente em trazer aos autos o contrato que legitimaria os descontos perpetrados nos rendimentos do autor.

Além, não consta na peça contestatória ilação ou prova capaz de refutar a sustentação feita na peça inaugural de que a parte autora não fizera a contratação ou tivera disponível o valor referente ao cartão de crédito. A empresa ré, pois, furta-se ao ônus da impugnação especificada dos fatos, presente no art. 341 do CPC/15.

Não há, dessa forma, outro caminho a ser tomado, a não ser o de procedência da ação autoral, no sentido de declarar a inexistência do contrato objeto da ação, bem como ser o réu condenado a restituir em dobro à parte autora os valores indevidamente descontados em razão do cartão crédito consignado objeto dos autos e, ainda, ser condenado o réu a indenizar o autor pelo dano moral suportado.

Neste sentido é a Jurisprudência:

Apelação cível. Direito do Consumidor. Alega a autora ausência de contrato de empréstimo bancário realizado junto à instituição financeira, sentença de procedência parcial condenando o réu a pagar em favor da parte autora a quantia de R$ 10.000,00 a título de danos morais, com correção monetária e juros de 1% ao mês a partir da publicação dessa sentença, declarando a inexistência de relação jurídica entre as partes e o débito impugnado, confirmando-se a antecipação de tutela e ainda condenando o réu no pagamento de custas e honorários advocatícios em 15% sobre o valor da condenação. Falha no exercício da atividade financeira. É do fornecedor o ônus de comprovar a inexistência de defeito na prestação do serviço. Honorários fixados em 15% sobre o valor da condenação que se mantém, porém, ao contrário do determinado na sentença do juízo a quo, os juros de mora devem ser propostos a partir do fato danoso. Súmula 54 do STJ. Precedente desta corte. Recurso provido. (TJ-RJ – APL: 00093979020108130208 Rio de Janeiro Meier Regional 4 Vara Civel, Relator: Fernanda Fernandes Coelho Arrabida Paes, Data de Julgamento: 07/006/2017, Vigéssima Sétima Câmara Cível Consumidor, Data de Publicação: 12/06/2017)”. (Sem grifo no original).

Atente-se que tangente à condenação em restituição em dobro, assim se deu porque não se vislumbra no caso dos autos engano justificável, única hipótese prevista no Código de Defesa do Consumidor (art. 42, parágrafo único). Importante mencionar, ainda, que a conduta contrária à boa-fé objetiva por parte do fornecedor é suficiente à sua responsabilidade de pagar em dobro os valores cobrados indevidamente. Assim, é o entendimento do STJ:

“[...] A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. […]” (STJ. Corte Especial. EAREsp 676608/RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 21/10/2020). (Sem grifo no original).

Passo à fixação do quantum em relação aos danos morais requeridos pela parte demandante.

Danos morais, na definição de Wilson Mello da Silva, que entre nós é o clássico monografista da matéria, “são lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição a patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico”.

O dano moral existiu diante dos descontos realizados no benefício previdenciário da parte autora de forma indevida, eis que não se tem comprovação da lisura no negócio jurídico, notadamente o fato da não apresentação de contrato e comprovante de disponibilização de crédito do cartão objeto dos autos.

Então, presentes os requisitos ensejadores da responsabilidade por danos morais em face da ré, devem estes ser fixados em R$ 3.000,00 (três mil reais).

Ressalto ainda que fora fixado tal valor, tendo em vista que na fixação dos danos morais devem ser levados em conta o sofrimento da vítima, a condição econômica do causador do dano e o caráter punitivo e educativo da condenação.

Impende consignar que o valor arbitrado a título de dano moral fora reduzido em comparação ao valor geralmente arbitrado por este Juízo em demandas congêneres, em vista de não estar demonstrado nos autos de forma incontestável a tentativa da parte autora de resolver a lide administrativamente (reclamação), sendo insuficiente a afirmação de que o fez, o que consubstanciaria a ocorrência do dano moral, notadamente na resistência do réu em resolver a questão, demonstrando a necessidade de se valer do Judiciário para dirimição da questão.

ANTE O EXPOSTO, com fulcro na legislação vigente, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos principais contidos na inicial, DECLARANDO a inexistência do contrato de cartão de crédito, objeto da presente ação, devendo o réu restituir à parte autora, de forma dobrada, os descontos havidos indevidamente, quantitativo a ser apurado em sede de cumprimento de sentença, incidindo correção monetária, pelo índice INPC, desde quando efetuado cada desconto e juros moratórios de 1% ao mês a partir do evento danoso, como também CONDENO o réu ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais), a título de indenização por danos morais, em favor da parte autora, devendo incidir a correção monetária a partir desta decisão, tendo como índice o INPC, e juros moratórios em 1% ao mês, a partir do evento danoso.

CONCEDO, nesta oportunidade, a tutela provisória requerida na exordial, no sentido de determinar ao réu que se abstenha de realizar, no prazo de 10 (dez) dias, os descontos referentes ao contrato objeto destes autos, sob pena de multa por desconto no valor de R$ 100,00 (cem reais). Atente-se a Escrivania para a necessidade de intimação pessoal do réu para cumprimento da tutela aqui concedida, ante o teor do enunciado nº 410 da súmula de jurisprudência do STJ.

RESOLVO o mérito.

Sem condenação ao pagamento de custas e de honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei n° 9.099/95.

Ocorrendo a oposição de Embargos de Declaração, certifique-se pela Escrivania a tempestividade.

Caso haja recurso inominado interposto, considerando o que preceituam o art. 203, §4º, do CPC e o art. 42, §2º, da Lei 9099/95, proceda à Secretaria, em sendo o caso, com a confecção da taxa a recolher, correspondente ao preparo e as custas processuais ou, havendo requerimento de gratuidade pelo(s) recorrente, certifique tal pleito nos autos. Em seguida, deverá a escrivania: 1- Intimar o(s) recorrido(s) para, no prazo de 10 (dez) dias, apresentar contrarrazões ao recurso interposto; 2- Após, certificar se houve ou não a tempestividade do recurso, do preparo, da manifestação do(s) recorrido(s), bem como do transcurso do prazo para a apresentação de eventuais recursos e contrarrazões. 3- Ato contínuo, remeter os autos à Turma Recursal para análise dos pressupostos de juízo de admissibilidade e da concessão dos...

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