Poções - Vara cível

Data de publicação19 Outubro 2022
SeçãoCADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA
Número da edição3201
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE POÇÕES
SENTENÇA

8000981-28.2021.8.05.0199 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Poções
Autor: Elza Coutrim De Sousa
Advogado: Lisia Cunha De Magalhaes (OAB:BA46121)
Reu: Banco Mercantil Do Brasil S/a
Advogado: Felipe D Aguiar Rocha Ferreira (OAB:BA68751)
Advogado: Carlos Eduardo Cavalcante Ramos (OAB:BA37489)
Reu: Banco Bradesco Sa

Sentença:

Vistos etc.

Dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei n° 9.099/95.

Dispõe o art. 6º da Lei nº 9.099/95 que “o juiz adotará em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum”.

Fundamento e Decido.

1. Da preliminar de carência de ação por ilegitimidade passiva do Banco Mercantil

A suscitada preliminar de ilegitimidade passiva ad causam deve, de logo, ser rejeitada. Recentemente a 3° Turma do Superior Tribunal de Justiça reconheceu que, por integrarem a mesma cadeia de fornecimento, todas as instituições financeiras envolvidas são solidariamente responsáveis por reparar o prejuízo decorrente de fraude na portabilidade de empréstimo consignado. No caso em tela a Autora questiona a validade do empréstimo, logo, a portabilidade também é questionada.

2. Da preliminar de falta de interesse processual - ausência de pretensão resistida

É sabido que a ausência do interesse de agir recai em nulidade processual, por se tratar de um dos pressupostos da ação.

Ocorre que, a alegação da necessidade de haver prévio requerimento administrativo antes da propositura da ação como requisito para configurar o interesse de agir, vai de encontro ao direito fundamental do acesso à justiça previsto no inciso XXXV do Artigo da Constituição Federal.

Nesse sentido, segue entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Bahia:

Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 PROCESSO Nº: 0010641-09.2019.8.05.0150 RECORRENTE: JOSE SIDICLEI SANTOS SILVA RECORRIDA: SEGURADORA LIDER DOS CONSÓRCIOS DO SEGURO DPVAT SA RELATOR: JUIZ PAULO CÉSAR ALMEIDA RIBEIRO EMENTA RECURSO INOMINADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. SEGURO DPVAT. AUSÊNCIA DE CONSTATAÇÃO DE INVALIDEZ/INCAPACIDADE PERMANENTE. COMPROVAÇÃO DE DESPESAS MÉDICAS. COBERTURA DEVIDA NOS MOLDES DA LEI Nº 6.194/74. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. RELATÓRIO Trata-se de Recurso Inominado (ev. 20), interposto pelo Demandante, contra Sentença que julgou improcedentes os pedidos lançados na exordial. Contrarrazões apresentadas (ev. 28). VOTO Presentes as condições de admissibilidade do Recurso, uma vez que foi interposto dentro do prazo legal e concedida a justiça gratuita, conheço do mesmo. Inicialmente, rechaço a tese de falta de interesse de agir, ventilada nas contrarrazões, pois, conforme determinação constitucional, a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, não se podendo afastar o controle jurisdicional sob o fundamento de ausência de requerimento administrativo. [...] Pelo exposto, voto pelo PROVIMENTO PARCIAL do Recurso para condenar a Acionada ao pagamento da quantia de R$ 800,99 (oitocentos reais e noventa e nove centavos), acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação, e correção monetária incidente dos respectivos desembolsos. Sem custas e honorários, eis que não há Recorrente vencido. PAULO CÉSAR ALMEIDA RIBEIRO JUIZ RELATOR. (Classe: Recurso Inominado. Número do Processo: 0010641-09.2019.8.05.0150. Relator(a): PAULO CESAR ALMEIDA RIBEIRO. Publicado em: 13/11/2020) (grifos acrescidos).

Isto posto, afasto a preliminar levantada pela defesa de ausência de requerimento administrativo.

3. Da inépcia da inicial - ausência de documentos obrigatórios.

Aduzem os Réus que a Autora anexou à sua inicial comprovante de residência em nome de terceiro, não fazendo prova do seu domicílio fornecido na inicial.

Sobre o tema, cito o seguinte julgado:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - INDEFERIMENTO DA INICIAL - COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA EM NOME PRÓPRIO E ATUALIZADO - AUSÊNCIA - DOCUMENTO DESNECESSÁRIO AO DESLINDE DA AÇÃO - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - IMPOSSIBILIDADE. Tendo a parte autora se qualificado na forma exigida em lei, fornecendo nome e sobrenome, número do CPF, profissão, endereço de sua residência e domicílio, não há razão para o indeferimento da petição inicial e extinção do processo, diante da falta de comprovante de residência em nome próprio ou atualizado, tratando-se de exigência sem respaldo legal. (TJ-MG - AC: 10000200031938001 MG, Relator: Claret de Moraes, Data de Julgamento: 26/05/2020, Data de Publicação: 03/06/2020)

Assim, por entender que o comprovante de residência não é um documento indispensável à propositura da ação, a não juntada deste não implica na extinção do processo sem resolução do mérito desde que a parte autora tenha se qualificado na forma exigida no art. 319, inciso II do CPC, o que foi cumprido pela Autora no caso em tela. Isto posto, afasto a preliminar levantada.

Sem mais, passo a analisar o mérito.

Antes, porém, verifico que a relação travada entre as partes é consumerista, afinal, os Réus prestam serviços no mercado de consumo, sendo considerados fornecedores, nos moldes do artigo 3º, do CDC.

A parte autora, por sua vez, é destinatária final, de modo que se caracteriza como consumidora (artigo 2º, do CDC).

Destarte, imperiosa a aplicação da legislação consumerista, por ser matéria cogente (artigo 1º, do CDC), cujo entendimento já foi devidamente sumulado pelo STJ, senão vejamos:

Súmula 297/STJ - O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Nesse caso, equiparando-se o autor ao consumidor, conforme arts. 14 e 17 do CDC, a obrigação de indenizar é de ordem objetiva, independentemente de culpa, in litteris:

Art. 14: O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

(...)

Art. 17: Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.

No mérito, a ação é procedente.

O Requerente nega a contratação do empréstimo em questão, solicitando, ainda, autorização para depositar em juízo os valores creditados em sua conta.

Os Requeridos apresentaram contestações iguais, defendendo a regularidade da contratação, juntando cópia do suposto contrato de empréstimo consignado (ID n°187402175) nº 016550233-9, formalizado em 22 de janeiro de 2021, originalmente celebrado junto ao Banco Mercantil, sendo o mesmo cedido ao BANCO BRADESCO S/A, sendo este o atual detentor do contrato e responsável pelas cobranças do mesmo.

A Autora, instada a se manifestar sobre as peças contestatórias, impugnou o contrato juntado pelos Demandados, alegando que as assinaturas nele presentes são falsas.

Sobre a temática, é importante destacar que recentemente a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos especiais repetitivos (Tema 1.061), definiu que, nas hipóteses em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a ela o ônus de provar a veracidade do registro.

No acórdão do mencionado Recurso Especial Repetitivo, em seu voto, o ministro Marco Aurélio Bellizze foi cirúrgico em seu fundamento ao esclarecer que:

A parte que produz o documento é aquela por conta de quem se elaborou, porquanto responsável pela formação do contrato, sendo quem possui a capacidade de justificar ou comprovar a presença da pessoa que o assinou

(...)

Aqui não se cuida de inversão do ônus probatório com a imposição de a casa bancária arcar com os custos da perícia, mas sim quanto à imposição legal de a parte que produziu o documento suportar o ônus de demonstrar a veracidade da assinatura constante no contrato e oportunamente impugnada pelo mutuário, o que abrange a produção da perícia grafotécnica.

Assim sendo, considerando que os documentos juntados pelos Réus, por si só, não atestam a validade do contrato em questão, ônus que lhes incumbia, e considerando que a tese fixada pelo STJ sob o rito dos recursos especiais repetitivos (Tema 1.061) deve ser aplicada ao presente caso, a procedência da ação é a medida que se impõe, concluindo pela nulidade da contratação impugnada nesta demanda e a consequente inexistência da dívida.

Face à declaração de nulidade, as partes devem retornar ao estado anterior. Com isso, os demandados deverão restituir À demandante todos os valores indevidamente descontados de seu benefício previdenciário, por força dos fatos descritos na inicial.

No presente caso, em que não foi comprovada a ausência de má-fé pelos Réus, de fato, deve a devolução ser feita em dobro, nos termos do artigo 42 do Código de Defesa ao Consumidor, em que esclarece:

O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso,...

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