O poder judiciário e a jurisdição neoliberal: por uma crítica constitucional à liberdade contra a igualdade na ascensão antidemocrática no brasil

AutorAdamo Dias Alves, Diogo Bacha e Silva, Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira
Páginas263-294
263
COLEÇÃO DIREITO CONSTITUCIONAL
Adamo Dias Alves1
Diogo Bacha e Silva
2
Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira
3
CAPÍTULO 8
O PODER JUDICIÁRIO E A JURISDIÇÃO
NEOLIBERAL: POR UMA CRÍTICA
CONSTITUCIONAL À LIBERDADE
CONTRA A IGUALDADE NA ASCENSÃO
ANTIDEMOCRÁTICA NO BRASIL
1 Professor Adjunto de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da UFMG,
Doutor e Mestre em Direito pela UFMG. E-mail: adamodias@ufmg.br.
2 Professor em estágio de pós-doutorado em Direito pela UFMG, Doutor em Di-
reito pela UFRJ, Mestre em Direito pela FDSM, Professor. E-mail: diogoba-
cha@gmail.com.
3 Professor Titular de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da UFMG,
Doutor e Mestre em Direito pela UFMG. Estágio pós-doutoral com bolsa da
CAPES na Università degli Studi di Roma III. Bolsista de Produtividade do
CNPq – Nível 1 D. E-mail: mcattoni@gmail.com.
RESUMO
Este texto pretende ofertar algumas reexões sobre o contexto
político-econômico da ascensão antidemocrática que atinge a or-
dem político-constitucional brasileira. Por meio de uma primeira
etapa problematizadora, são analisados casos concretos julgados
pelo Poder Judiciário, durante a pandemia do coronavírus, para
DEMOCRACIA E RESILIÊNCIA NO BRASIL A DISPUTA EM TORNO DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
COLEÇÃO DIREITO CONSTITUCIONAL
PATRÍCIA PERRONE CAMPOS MELLO | THOMAS DA ROSA DE BUSTAMANTE ORGANIZADORES
264
INTRODUÇÃO
Partiremos do problema especíco de que, no contexto da pandemia do
coronavírus, multiplicou-se em todo o território nacional decisões proferidas
pelo Poder Judiciário ao longo do ano de 2020, e mesmo no início do ano 2021,
em meio a uma segunda onda, que possibilitaram a reabertura dos comércios que
não estavam caracterizados como atividades essenciais na disciplina jurídica da
pandemia. Na fundamentação, ainda que por vezes implícita, estava a ideia de
uma liberdade econômica que não deveria ser sufragada mesmo no contexto da
decretação de lockdown.
De onde vem essa suposta liberdade? Qual é a ideia de liberdade que
anima essas decisões? Qual o fundamento losóco-político dessa liberdade? A
quem essa liberdade irá beneciar e/ou prejudicar?
Este texto pretende ofertar algumas reexões no contexto político-eco-
nômico da ascensão antidemocrática, que atinge a ordem político-constitucio-
nal brasileira. Por meio de uma etapa problematizadora, são analisados, em um
primeiro momento, casos concretos julgados pelo Poder Judiciário, durante a
mostrar como uma concepção neoliberal de liberdade se inltra
no discurso jurídico e pretende seu reconhecimento como direi-
to fundamental. Em um segundo momento, são reconstruídos os
argumentos centrais de Wendy Brown em sua obra Nas ruínas do
neoliberalismo, como um marco teórico importante para entender,
especialmente, esse discurso neoliberal e neoconservador, que cria
uma disputa em torno do sentido da liberdade contraposto ao da
igualdade. Essa reconstrução teórica abre um campo para se re-
etir, em um terceiro momento, sobre a disputa interpretativa em
torno do projeto constitucional de 1988 e do papel do Supremo
Tribunal Federal, em especial, para lidar com esses assédios auto-
ritários à normatividade constitucional.
PALAVRAS-CHAVE
Neoliberalismo, jurisdição, Estado Democrático de Direito.
8 O PODER JUDICIÁRIO E A JURISDIÇÃO NEOLIBERAL: POR UMA CRÍTICA CONSTITUCIONAL
À LIBERDADE CONTRA A IGUALDADE NA ASCENSÃO ANTIDEMOCRÁTICA NO BRASIL
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ADAMO DIAS ALVES | DIOGO BACHA E SILVA | MARCELO ANDRADE CATTONI DE OLIVEIRA
COLEÇÃO DIREITO CONSTITUCIONAL
pandemia para mostrar como uma concepção neoliberal de liberdade se inltra
no discurso jurídico e pretende seu reconhecimento como direito fundamental.
Em um segundo momento, iremos reconstruir os argumentos centrais de
Wendy Brown em sua última obra Nas ruínas do neoliberalismo4 como um marco
teórico importante, mas não só, para entendermos esse discurso neoliberal e neo-
conservador, que cria uma disputa em torno do sentido da liberdade contraposto
ao da igualdade.
Em um terceiro momento, essa reconstrução teórica nos abre um campo
para reexão, sobre a disputa interpretativa em torno do projeto constitucional
de 1988 e do papel do Supremo Tribunal Federal, em especial, para lidar com
esses assédios autoritários à normatividade constitucional.
Nossa hipótese parte da premissa de que a democratização não é infensa
a assédios autoritários e que, para-doxalmente, o único remédio contra as preten-
sões antidemocráticas é apostar ainda mais na democracia e no projeto consti-
tucional. Além disso, qualquer formulação teórico-política que propague uma
nova Constituição para o combate à ascensão antidemocrática no Brasil ressoa
como uma descrença na normatividade constitucional e, ao m e ao cabo, uma
desvalorização da própria ideia da Constituição. De qualquer sorte, o papel do
Poder Judiciário, sobretudo do Supremo Tribunal Federal (STF), é entender que
a Constituição tem ambições para si própria (Dworkin) e se constitui como um
guia principiológico seguro cujo âmbito os direitos fundamentais constituem
trunfos contra maiorias políticas ocasionais.
1. A PANDEMIA, A LIBERDADE E O PODER
JUDICIÁRIO: OU DE COMO A «DESSUBLIMAÇÃO
REPRESSIVA» PARECE LIBERDADE
Quando ainda não se contava com nenhum infectado ocial pelo co-
ronavírus em território nacional, na data de 06 de fevereiro de 2020, a Lei nº
13.979/2020 foi promulgada com o objetivo de se constituir em um parâmetro
4 BROWN, Wendy. Nas ruínas do neoliberalismo: a ascensão da política antide-
mocrática no ocidente. São Paulo: Editora Filosóca Politeia, 2019.

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