Porto seguro - 1ª vara da fazenda pública

Data de publicação02 Maio 2022
Número da edição3087
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DE FAZENDA PÚBLICA DE PORTO SEGURO
SENTENÇA

8001666-63.2020.8.05.0201 Mandado De Segurança Cível
Jurisdição: Porto Seguro
Impetrante: Igor Domingues Stefanelli
Advogado: Igor Domingues Stefanelli (OAB:BA32557)
Impetrado: Claudia Silva Santos Oliveira
Advogado: Glauco Tourinho Rodrigues (OAB:BA19495)
Impetrado: Município De Portoseguro/ba
Advogado: Glauco Tourinho Rodrigues (OAB:BA19495)
Terceiro Interessado: Ministério Público Do Estado Da Bahia

Sentença:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

1ª Vara da Fazenda Pública

Comarca de PORTO SEGURO-BA

PROCESSO nº: 8001666-63.2020.8.05.0201

IMPETRANTE: IGOR DOMINGUES STEFANELLI

IMPETRADO: CLAUDIA SILVA SANTOS OLIVEIRA, MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO/BA

SENTENÇA


IGOR DOMINGUES STEFANELLI impetrou MANDADO DE SEGURANÇA contra ato praticado por CLÁUDIA SILVA SANTOS OLIVEIRA, Prefeita do Município de Porto Seguro-BA , aduzindo que em 29.06.2020, a autoridade coatora determinou publicação do Decreto 10.877/20, autorizando novas medidas para o controle e combate ao COVID-19 no município de Porto Seguro-BA, buscando regulamentar a Lei Estadual n.º 14.261/2020, de 29 de abril de 2020.


Afirmou que o referido decreto traz em seu bojo obrigação que fere direito líquido e certo do impetrante. Alegou , ainda, que não possui lastro em qualquer base científica, nem em análises sobre as informações estratégicas de saúde a referida medida.

Requereu que fosse concedida liminar para determinar que a autoridade coatora se abstenha de obrigar o impetrante a fazer uso de máscara durante o deslocamento pelo município de Porto Seguro-BA, não lhe sujeitando a pena de multa, no valor de R$ 100,00 (cem reais), conforme art. 10º do Decreto Municipal 10.877/2020. E, ao final, fosse concedida, definitivamente , a segurança requerida.

O Mandado de Segurança foi instruído com os documentos no ID 63266758, 63266803, 63266824, 63266853 e 63266877.

No ID 63269361 , despacho determinou que comprovasse a hipossuficiência aduzida.

No ID 64539990 foram prestadas informações, alegando preliminarmente , falta de interesse de agir , considerando que a parte autora aduziu que está sem trabalhar e que no interior da sua residência não é obrigatório o uso de máscaras. Informou que o Decreto Legislativo nº 2512/20, de 21/03/2020, dispõe sobre o estado de calamidade pública em todo o estado da Bahia, fato público e notório. Aduziu que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, confirmou o entendimento de que as medidas adotadas pelo Governo Federal na Medida Provisória 926/2020 (atual Lei 12.016/20) para o enfrentamento do novo coronavírus não afastam a competência concorrente, nem a tomada de providências normativas e administrativas pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios. Fez alusão a passagens contidas em documentos juntados pela própria Impetrante que afirma que o uso da máscara o é fundamental para a prevenção e controle para frear a propagação da COVID-19 . Informou que “ o controle à disseminação do coronavírus é de interesse público, bem como que o uso da máscara pelo Impetrante, não só o protege, mas também os demais que, potencialmente, podem ser por ele infectados.”

No ID 46682295 o autor refutou as preliminares aduzidas e reiterou os termos da petição inicial.

No ID 66318801 foi indeferida a medida liminar por verificar periculum in mora reverso à própria saúde pública, a qual se busca garantir com as medidas ora questionadas .

Após vistas dos autos, o Ministério Público pugnou pela legalidade do Decreto Municipal nº 10.877/2020 e pela não demonstração de direito líquido e certo .

Os autos vieram-me conclusos.

Era o que havia a relatar.

DECIDO:

Para que possa utilizar-se do remédio constitucional Mandado de Segurança, o impetrante deve provar, satisfatoriamente, com a petição inicial, através de documentos, o que afirma.

Ademais, no caso dos autos, destaco, é o mandamus via adequada para debater o tema, pois a matéria sob exame é eminentemente de direito. A comprovação de que o ato guerreado pode atingir o direito da parte impetrante é bastante para sustentar o pleito deduzido em Juízo.

O objeto do mandado de segurança será sempre a correção do ato ou omissão da autoridade, desde que ilegal e ofensivo de direito individual ou coletivo.

Analisando os autos, verifica-se que não assiste razão a alegação da Impetrada de ausência de interesse de agir da Impetrante, por razão da mesma não trabalhar, devido a razão de que muitos outros motivos levam às pessoas a se deslocarem por vias e locais públicos, como farmácias, supermercados , dentre outros.


A presente demanda assenta sobre a ponderação entre diversos princípios que regem o ordenamento jurídico e que devem ser cuidadosamente dosado no presente caso. Nenhum direito é absoluto . O princípio da legalidade possui assento na Carta Magna, sendo um direito fundamental insculpido no artigo 5º, II da CF/1988: "Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".


Da mesma forma, artigo 5º, caput, da Constituição Federal garante a "inviolabilidade do direito à vida", o artigo 1º, inciso II, declara que o Brasil tem por fundamento a "cidadania", o artigo 3º, inciso I, assevera que é objetivo fundamental "construir uma sociedade solidária", bem como o seu artigo 196 estabelece que a "saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais que visem à redução do risco de doença".

Diversos entes estatais , dentre eles os Municípios e os Estados dispõem de competência legal para exigir o uso de máscaras pela população nos seus respectivos territórios desde o início da pandemia, conforme entendimento da Suprema Corte. Para atingir tal mister, é possível utilizarem-se da publicação de decretos editados pelos gestores locais, em conformidade com o artigo 3º, §7º, da Lei Federal nº 13.979 de 6 de fevereiro de 2020.

Apesar do decreto municipal criar restrição à liberdade individual da população em geral, tornando o uso da máscara obrigatório, tal medida se revela proporcional, adequada e de acordo com as medidas previstas na legislação federal e estadual. A medida imposta pelo decreto municipal está de acordo com a Lei Estadual nº 14.261/2020 e a Lei Federal nº 13.979/2020.

E, ainda, o Município agiu dentro da competência que lhe fora outorgada pela CF, “in verbis”:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência; Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (...) XII - previdência social, proteção e defesa da saúde; (...) § 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais

Ressalto, que a nenhum cidadão é facultado eximir-se do dever legal de usar máscaras para evitar a propagação da Covid-19, sob pena de infringir princípios constitucionais do direito à saúde, os deveres de cidadania e solidariedade, bem como o direito mais importante de todos: a vida. Tal entendimento, ainda que em pouco lapso de tempo, já encontra-se consolidado na jurisprudência dos nossos Tribunais:

"MANDADO DE SEGURANÇA. USO DAS MÁSCARAS. CORONAVÍRUS. IMPOSIÇÃO. EMERGÊNCIA SANITÁRIA Decreto nº 64.959, de 4.5.2020, do Governador de S. Paulo. Obrigatoriedade do uso das máscaras faciais. Suposta violação dos arts. 5º, II e 84, da CF. Súmula 266 do STF. Não conhecimento. Superação do ponto pelo emprego do quanto posto no art. 282, §2º do NCPC. Julgamento pelo mérito. Decreto do Governador que obriga o uso das máscaras faciais. Alegação de ausência de lei precedente. Inocorrência. Hipótese de competência concorrente de todas as instâncias administrativas, o que restou afirmado pelo col. STF. Decreto do Governador exarado em sintonia com a Lei Federal nº 13.979, de 6.2.2020, seu art. 3º, III, letra d. Tema evidentemente afeto ao poder de polícia sanitária, em consonância com o disposto no art. 78 da Lei Federal nº 5.172/66. Máscaras que, segundo os epidemiologistas, têm relevância estratégica na prevenção contra a contaminação pelo coronavírus, especialmente na fase de aceleração da pandemia, de molde a impedir a veiculação do patógeno, servindo de suplemento ao distanciamento social quando não possível. Recrudescimento da contaminação em novembro passado. Denegação da segurança.

(TJ-SP – MS:21656012920208260000 SP n. 2165601-29.2020.8.26.0000 , Relator: Costabile e Solimene, Data do Julgamento:27/01/2021, Orgão Especial, Data de Publicação:28/01/2021)"

"DECISÃO SAÚDE – CRISE – CORONAVÍRUS – MEDIDA PROVISÓRIA – PROVIDÊNCIAS – LEGITIMAÇÃO CONCORRENTE. Surgem atendidos os requisitos de urgência e necessidade, no que medida provisória dispõe sobre providências no campo da saúde pública nacional, sem prejuízo da legitimação concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

1. O assessor Vinicius de Andrade Prado prestou as seguintes informações: Partido Democrático Trabalhista – PDT ajuizou ação direta com a finalidade de ver declarada a incompatibilidade parcial, com a Constituição Federal, da Medida Provisória nº 926, de 20 de março de 2020, relativamente às alterações promovidas no artigo 3º, cabeça, incisos I, II e VI, e parágrafos 8º, 9º, 10 e 11, da Lei federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Eis o teor dos preceitos impugnados: Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as...

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