Prefácio

AutorJosé Antonio Dias Toffoli
Ocupação do AutorMinistro do Supremo Tribunal Federal
Páginas5-9
PREFÁCIO
Diz a Constituição de 1988, no inciso XXXV de seu art. 5º, que a “lei não excluirá da
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Trata-se do princípio da inafas-
tabilidade da jurisdição, o qual corresponde, em nossa ordem jurídico-constitucional, à
“principal garantia dos direitos subjetivos”, como pontua José Afonso da Silva.1 A Carta
Cidadã também ampliou consideravelmente o acesso à Justiça: estabeleceu um extenso
rol de direitos fundamentais, instituiu ações constitucionais aptas a fazerem valer esses
direitos e fortaleceu o Poder Judiciário e as instituições essenciais à Justiça (ministério
público, defensoria pública, advocacia pública e advocacia privada).
O monopólio da jurisdição pelo Estado é, inegavelmente, uma conquista histó-
rica. No Brasil, a ampliação das vias de acesso à Justiça é um grande legado de nossa
democracia. Entretanto, não se deve atribuir ao método adversarial a condição de rota
essencial para a resolução das lides. Deve-se assegurar o acesso à justiça sem descurar
de que a Justiça incorpore e valorize formas de solução das demandas que permitam
maior aproximação das partes e melhor equacionamento dos conf‌litos. O processo será
tão mais efetivo quanto mais pacif‌icadora for a solução encontrada.
Conforme bem elucidou Kazuo Watanabe2, numa sociedade tão complexa como
a brasileira, na qual os conf‌litos se multiplicam e assumem as mais diversas formas, é
preciso que haja meios adequados para a resolução das diferentes espécies de contendas,
o que compreende não só o processo judicial contencioso, mas soluções extrajudiciais
que privilegiem a autocomposição. A sociedade brasileira almejada, consoante previsto
no preâmbulo da Constituição de 1988, está fundada na harmonia social, cabendo, por
conseguinte, ao poder público e à sociedade civil pautarem-se pela busca da efetiva paz
social.
A possibilidade de os agentes sociais (pessoas físicas e jurídicas, de natureza pública
ou privada) buscarem a solução de seus conf‌litos pela via do diálogo não somente evita
que a contenda se protraia no tempo, mas também previne a mobilização do aparato
judicial (com todos os custos envolvidos, para o jurisdicionado e para a Justiça), f‌ican-
do, sempre, resguardada a possibilidade de acionamento dos órgãos judiciais no caso
de insucesso das tratativas.
Ademais, a solução adjudicada dos conf‌litos complexos por meio de sentença prola-
tada por magistrado nem sempre cumpre o desiderato de extirpar do mundo fenomênico
a violação ou a ameaça de lesão a direito em tempo compatível com a natureza desse. É
fundamental atentar para a essência do conf‌lito de interesses, a f‌im de dispensar a ele
1. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional. 39. ed. São Paulo: Malheiros, 2016. p. 433.
2. WATANABE, Kazuo. Acesso à justiça e sociedade moderna. In: GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO,
Cândido Rangel, e WATANABE, Kazuo (Coord.). Participação e Processo. Revista dos Tribunais. p. 128.
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