Primeira câmara cível - Primeira câmara cível

Data de publicação25 Agosto 2020
Número da edição2684
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Des. Mário Augusto Albiani Alves Júnior
DECISÃO

0538759-31.2018.8.05.0001 Apelação (cível)
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Apelado: Anderson Carlos Santos Silva
Advogado: Silvino De Alencar Barros (OAB:2923300A/BA)
Advogado: Daniel De Araujo Paranhos (OAB:3842900A/BA)
Apelante: Banco Bonsucesso S.a.
Advogado: Joao Thomaz Prazeres Gondim (OAB:6060200A/BA)

Decisão:

Trata-se de Recurso de Apelação interposto por BANCO BONSUCESSO S/A, contra sentença proferida pelo MM. Juízo da 2ª Vara de Relações de Consumo da comarca de Salvador, nos autos da Ação de Revisão Contratual sob o nº 0538759-31.2018.8.05.0001, proposta por ANDERSON CARLOS SANTOS SILVA, que julgou procedentes os pedidos autorais, nos seguintes termos:

Diante do exposto, além do mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS, com fulcro nos Arts. 4o, 6o, 46, 47, 51 e 54 CDC, e nas demais disposições legais mencionadas no corpo da fundamentação, para:

i) declarar a abusividade das taxas de juros praticadas, devendo a instituição financeira acionada proceder ao recálculo dos juros do contrato sub judice, desde o início, observando os parâmetros estipulados pelo BCB – Banco Central do Brasil, disponibilizados no Sistema Gerenciador de Séries Temporais que à época da contratação era de 2,05% a.m. e 27,59% a.a., ex vi taxa média de juros total, divulgada pelo Banco Central do Brasil, através do seu portal no Sistema Gerenciador de Séries Temporais;

ii) condenar a instituição financeira vencida nos ônus sucumbenciais, custas e honorários de advogado, estes arbitrados em 15% do valor da condenação, consoante art. 85, § 2o c/c art. 86, Parágrafo Único, ambos do novo CPC.

Ficam, portanto, decotadas todas as parcelas que ultrapassem o quanto aqui delineado e definido.

Na hipótese de se verificar pagamento a maior pela parte autora, fica reconhecido, declarado e garantido o direito de receber em dobro o valor excedente (Art. 42, Parágrafo único, do CDC), tudo devidamente corrigido monetariamente e acrescido de juros de 1%, a partir de cada desembolso.

Extingue-se o processo com resolução de mérito, na forma do art. 487, I, do novel CPC.

Irresignada, a apela, requerendo, preliminarmente, a anulação da sentença por ausência de fundamentação. No mérito, sustenta a legalidade dos juros remuneratórios pactuados contratualmente.

Instado, o autor apresenta suas contrarrazões, rechaçando os elementos aduzidos pelo apelante, pugnando pelo improvimento do recurso interposto.

Vieram-me conclusos os autos.

É o que importa relatar, passo a decidir.

Conheço do recurso, presentes que se encontram os pressupostos extrínsecos e intrínsecos de sua admissibilidade.

De pronto, explicita-se a possibilidade de decisão monocrática para a resolução da presente altercação nos termos dos arts. 1.011, I c/c 932, V, “a” e “b”.

Art. 1.011. Recebido o recurso de apelação no tribunal e distribuído imediatamente, o relator:

I – decidi-lo-á monocraticamente apenas nas hipóteses do art. 932, incisos III a V;

Art. 932. Incumbe ao relator:

V – depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

No que tange à preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação, esta resta impróspera, vez que é de clareza solar que o juízo singular fez a correta subsunção do caso concreto apresentado ao entendimento sumulado nos tribunais superiores sem que houvessem quaisquer lacunas argumentativas. Destaque-se que o juiz, após análise dos elementos probatórios apresentados, uma vez plenamente convencido através dos mesmos, sentenciou nos moldes presentes nos autos, de forma plenamente válida dado o princípio do livre convencimento motivado.

Rejeito, pois, a preliminar aventada, passo à análise do mérito.

Primeiramente, faz-se necessário ressaltar que o princípio da “pacta sunt servanda” não perfaz obstáculo à revisão contratual pelo judiciário, vez que as avenças, longe de serem imutáveis, devem obediência aos dispositivos de ordem pública e de interesse social. Da não observância de tais princípios, torna-se autorizada a atuação estatal sem que se possa falar em desvirtuamento do “direito dos contratos” ou da autonomia da vontade.

Urge, pois, esclarecer que a presente demanda será analisada à luz do CDC, visto a disposição do mesmo, que estabelece como consumidor em seu art. 2°:

Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Tal entendimento é, ainda, corroborado, pela Súmula 297 do STJ:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras.”

Necessário, ainda, esclarecer a possibilidade de se fazer aquilo que é requisitado, vez que o art. 1° do Código de Defesa do Consumidor estabelece que as normas de proteção ao consumidor são de ordem pública e interesse social.

Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias.

Advém disso, a possibilidade do julgador intervir diretamente nas cláusulas que, devido a sua condição formal ou sua materialização reiterada no plano fático venham a causar onerosidade excessiva ao consumidor ou vantagem excessiva ao credor, ruborizando quando concomitantes. Desta forma, intenta o magistrado, nos liames a ele concedidos, restabelecer a harmonia contratual.

Há pois de se analisar o suposto erro em sentença ao determinar o depósito do valor incontroverso em via judicial. Pois bem, este ponto da sentença vergastada encontra-se livre de máculas pois atende o disposto no art. 635 do Código Civil, que entende como possível o depósito de quantias as quais o credor recusa-se a receber.

Neste sentido é assente a jurisprudência dos Tribunais Pátrios:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. REVISÃO CONTRATUAL. TUTELA DE URGÊNCIA. Vedação de inscrição em cadastro restritivo e autorização para depósito de valor incontroverso. Cabimento, no caso concreto, pois há evidências quanto à abusividade e à cobrança indevida, bem como há pedido específico de depósito da parte incontroversa. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70075250126, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Heleno Tregnago Saraiva, Julgado em: 24-10-2017)

Em primeiro momento, há de se observar os JUROS REMUNERATÓRIOS. Esses são devidos negocialmente, já estando adicionados ao valor contratual no momento de seu firmamento.

O Superior Tribunal de Justiça editou, desde o ano de 2009, o enunciado de nº 382, assentando o entendimento de que a mera estipulação de juros remuneratórios acima de 12% (doze por cento) ao ano não é requisito, por si só, capaz de denotar abusividade. Veja-se o citado enunciado:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.



Tal entendimento foi chave na resolução de conflitos dessa natureza, tendo em vista o que era estabelecido no art. 192, § 3° da CF, que realizava a limitação dessas taxas de juros a 12% ao ano, tendo em mente a sua ulterior alteração pela EC n° 40/2003, que realizou supressão de tal limite.

Para fins de análise acerca da abusividade dos juros remuneratórios, a jurisprudência tem consolidado o entendimento no sentido de que mostram-se abusivos os juros remuneratórios que ultrapassem a taxa média de mercado. Nesse sentido, assim tem decidido o Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. ENCARGOS MORATÓRIOS. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PROVA DE ERRO. DESNECESSIDADE. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. ENCARGOS DA NORMALIDADE. COBRANÇA LEGÍTIMA. MORA DEBENDI. CARACTERIZAÇÃO. TAC. COBRANÇA. POSSIBILIDADE. DISPOSIÇÃO EX OFFICIO. AFASTAMENTO.

(...)

4. "A alteração da taxa de juros remuneratórios pactuada em mútuo bancário e a vedação à cobrança das taxas denominadas TAC e TEC dependem da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado e da comprovação do desequilíbrio contratual" (AgRg no REsp 1061477/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 01/07/2010)" 5. "Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas"(Súmula 381/STJ).

6. Agravo regimental parciamente provido.

(AgRg no REsp 897.659/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/10/2010, DJe 09/11/2010)

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. LIMITAÇÃO DE JUROS. NÃO CABIMENTO. TAXA MÉDIA DE MERCADO. SÚMULA 7 DO STJ. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. POSSIBILIDADE. REVISÃO DE HONORÁRIOS. SÚMULA 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

1. "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual...

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