Primeira câmara criminal - primeira turma - Primeira câmara criminal - primeira turma

Data de publicação18 Abril 2022
Gazette Issue3079
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Desa. Ivone Bessa Ramos - 1ª Câmara Crime 1ª Turma
DECISÃO

8013989-53.2022.8.05.0000 Habeas Corpus Criminal
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Paciente: Jaelson Da Silva Bonfim
Paciente: Renato Felix De Souza
Advogado: Jaelson Da Silva Bonfim (OAB:BA40098-A)
Impetrado: Juiz De Direito Da Vara Crime Da Comarca De Pindobaçu-ba

Decisão:

Trata-se de HABEAS CORPUS liberatório, com pedido liminar, impetrado pelo Advogado Jaelson da Silva Bonfim (OAB-BA n.º 40.098), em benefício do Paciente RENATO FÉLIX DE SOUZA, tendo apontado como Autoridade Coatora o Juiz de Direito da Vara Criminal da Comarca de Pindobaçu-BA.

Narra o Impetrante, em suma, que o Paciente foi preso em flagrante no dia 05.04.2022, por suposta incursão no art. 12 da Lei n.º 10.826/2003, restando decretada a preventiva para a garantia da ordem pública. Aduz que a prisão flagrancial do ora Paciente decorreu de ingresso policial indevido em sua residência, no contexto da captura de outros dois indivíduos pela prática de tráfico de drogas.

Pondera que, malgrado o Juízo a quo tenha deferido liberdade provisória aos demais custodiados, findou por decretar a segregação cautelar do Paciente, não obstante seja a ele imputada a prática de crime apenado com 01 (um) a 04 (quatro) anos de detenção, e que nem sequer admite a fixação de regime fechado. Reputa ausentes, ademais, os requisitos da preventiva, assinalando ser o Paciente possuidor de residência fixa e ocupação lícita, além de não ostentar indicativos de periculosidade.

Suscita, outrossim, a ocorrência de nulidade por não realização de audiência de custódia, em afronta à normatividade pertinente e à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Destaca, ainda, a excepcionalidade da segregação provisória e as deficiências da fundamentação veiculada no Decreto Prisional, apontando, por fim, a existência de violação ao princípio da isonomia, ante o deferimento de liberdade a custodiados em situação idêntica à do Paciente, ao arrepio do art. 580 do Código de Processo Penal.

Nessa senda, pugna pela concessão da Ordem, em caráter liminar, a fim de que o Paciente seja colocado em liberdade, mediante a expedição de Alvará de Soltura em seu favor, com a confirmação da medida liberatória em julgamento definitivo.

A Inicial encontra-se instruída com o Decreto Prisional impugnado, documentação pessoal do Paciente e o Auto de Prisão em Flagrante.

O Writ foi distribuído a esta Magistrada, por sorteio, em 12.04.2022.

É o Relatório.

DECIDO:

O deferimento de medida liminar em Habeas Corpus não possui previsão legal, resultando o seu cabimento de construção jurisprudencial e doutrinária. Destaca-se que, sendo satisfativos os efeitos da medida in limine, esta apenas deve ser deferida em caráter excepcional, o que somente se justifica, por seu turno, quando inequivocamente evidenciada a coação ilegal porventura infligida ao agente.

Da leitura do Decreto Prisional atacado (Id. 27235557), verifica-se, sem maiores delongas, que a segregação provisória do Paciente padece de efetiva ilegalidade, embora por razões ligeiramente diversas, a princípio, daquelas invocadas na Inicial deste Writ. De logo, anota-se que os pressupostos para a decretação da preventiva encontram-se explicitados no art. 313 do Código de Processo Penal, cuja transcrição é oportuna:

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;

III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

IV - (Revogado).

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

Todavia, emerge dos autos que a prisão flagrancial do Paciente decorrera de sua incursão, em tese, no crime de posse irregular de arma de fogo de uso permitido (art. 12 da Lei n.º 10.628/2003), delito apenado, em seu grau máximo, com 04 (quatro) anos de detenção; inviável, pois, a decretação da preventiva com fulcro no art. 313, inciso I, do Código de Ritos, que a reserva aos tipos punidos com pena máxima superior a 04 (quatro) anos, a fim de evitar a desproporção da custódia em face da sanção.

De outro giro, não se identifica a presença de nenhuma das demais situações que, nos moldes do já mencionado art. 313 do Código de Processo Penal, também poderiam admitir a decretação da prisão cautelar. Com efeito, conquanto tenha o Juízo a quo aludido, com razão, à identificação de outros registros criminais em desfavor do Paciente, não se visualiza a existência de prévio título condenatório e consequente qualidade de reincidente em crime doloso, tampouco o descumprimento de cautelares anteriores.

Portanto, não estando delineada qualquer das hipóteses descritas no art. 313 do Código de Processo Penal – é dizer, a incursão em delito abstratamente apenado com reprimenda máxima superior a 04 (quatro) anos, a condenação definitiva por outro crime doloso, a necessidade de garantir a efetivação de medidas protetivas de urgência anteriormente impostas ou, ainda, a dúvida a respeito da identificação civil do agente –, conclui-se que a desconstituição da preventiva traduz providência imperiosa.

Em outras palavras, tem-se que a custódia cautelar impugnada por meio deste Habeas Corpus representa efetivo constrangimento ilegal ao Paciente, por ausência de pressuposto objetivo para a sua decretação, destacando-se, aqui, resultar imperiosa a intelecção conjugada dos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal. Assim, conclui-se que o relaxamento da prisão, já deferido em sede liminar, era medida de rigor à espécie, valendo conferir, a título ilustrativo, precedente do Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. PENA MÁXIMA NÃO SUPERIOR A 4 ANOS. PRISÃO PREVENTIVA. ART. 313, I, DO CPP. REQUISITOS LEGAIS NÃO CONFIGURADOS. ORDEM CONCEDIDA. 1. Para ser compatível com o Estado Democrático de Direito – o qual se ocupa de proteger tanto a liberdade quanto a segurança e a paz públicas – e com a presunção de não culpabilidade, é necessário que a decretação e a manutenção da prisão cautelar se revistam de caráter excepcional e provisório. A par disso, a decisão judicial deve ser suficientemente motivada, mediante análise da concreta necessidade da cautela, nos termos do art. 282, I e II, c/c o art. 312, ambos do Código de Processo Penal. 2. Consoante disposto nos incisos e no parágrafo único do art. 313 do Código de Processo Penal, para a decretação da prisão preventiva, é necessária a configuração de uma entre as seguintes hipóteses, consideradas requisitos de admissibilidade da segregação cautelar: (a) crime doloso punido com pena máxima superior a 4 anos; (b) existência de condenação definitiva anterior por outro crime doloso; (c) delito praticado em situação de violência doméstica e familiar contra mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, a fim de garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (d) existência de dúvida sobre a identidade do agente. 3. A pena máxima prevista para o crime pelo qual o réu foi preso em flagrante não é superior a 4 anos. Ao decretar a custódia preventiva do paciente, embora o Juízo de primeiro grau haja mencionado o risco de reiteração delitiva, porque o acusado, além de possuir passagens por atos infracionais, encontrava-se em "cumprimento de medida socioeducativa de internação, com saída externa" (fl. 35), o magistrado não indicou o preenchimento de nenhuma das hipóteses previstas nos incisos II e III ou no parágrafo único do art. 313 do Código de Processo Penal. 4. Ordem concedida para, confirmada a liminar, assegurar ao réu o direito de responder à ação penal em liberdade, ressalvada a possibilidade de nova decretação da custódia cautelar caso efetivamente demonstrada a superveniência de fatos novos que indiquem a sua necessidade, sem prejuízo de fixação de medida cautelar alternativa, nos termos do art. 319 do CPP. (STJ, 6.ª Turma, HC 437.326/DF, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 12.06.2018, DJe 22.06.2018) (grifos acrescidos)

RECURSO EM HABEAS CORPUS . PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA EM DECORRÊNCIA DE SENTENÇA. CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DE CONDUTA DESCRITA NO ART. 14 DA LEI N. 10.826⁄2003. AÇÕES PENAIS EM CURSO DESCRITAS NO ACÓRDÃO DA APELAÇÃO. IDONEIDADE. REITERAÇÃO DELITIVA. PENA MÁXIMA NÃO SUPERIOR A 4 ANOS. ART. 313, I, DO CPP. 1. [...]. 2. No presente caso, a prisão preventiva foi decretada em decorrência da prolação de sentença condenatória pelo crime do art. 14 da Lei n. 10.826⁄2003, cuja pena não é superior a 4 anos de reclusão. A despeito da menção às anotações de processos em curso, não se pode falar na...

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