Primeira câmara criminal - Primeira câmara criminal

Data de publicação30 Novembro 2022
Gazette Issue3226
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Des. Aliomar Silva Britto Primeira Criminal
DECISÃO

8045701-61.2022.8.05.0000 Inquérito Policial
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Autor: Delegado Da 1ª Delegacia Territorial Da Comarca De Vitória Da Conquista
Investigado: Wekisley Teixeira Silva

Decisão:

Trata-se de Auto de Prisão em Flagrante oriundo da Delegacia Territorial de Vitória da Conquista/BA, em face do investigado WEKISLEY TEIXEIRA SILVA, prefeito do município de Encruzilhada/BA, sob a acusação de ter praticado o delito previsto no artigo 14 da Lei nº 10.826/2003.

Nos termos do artigo 29, inciso X, da Constituição Federal, compete aos tribunais de justiça estaduais o julgamento das ações penais promovidas em face dos prefeitos municipais.

No entanto, o Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia vêm interpretando restritivamente a regra atinente ao foro privilegiado pela prerrogativa de função, exigindo-se, para sua aplicação, contemporaneidade e pertinência temática entre os fatos apurados no processo e a função pública em exercício.

Nesse sentido, colaciono precedente do Supremo Tribunal Federal:

Ementa: Direito Constitucional e Processual Penal. Questão de Ordem em Ação Penal. Limitação do foro por prerrogativa de função aos crimes praticados no cargo e em razão dele. Estabelecimento de marco temporal de fixação de competência. I. Quanto ao sentido e alcance do foro por prerrogativa 1. O foro por prerrogativa de função, ou foro privilegiado, na interpretação até aqui adotada pelo Supremo Tribunal Federal, alcança todos os crimes de que são acusados os agentes públicos previstos no art. 102, I, b e c da Constituição, inclusive os praticados antes da investidura no cargo e os que não guardam qualquer relação com o seu exercício. 2. Impõe-se, todavia, a alteração desta linha de entendimento, para restringir o foro privilegiado aos crimes praticados no cargo e em razão do cargo. É que a prática atual não realiza adequadamente princípios constitucionais estruturantes, como igualdade e república, por impedir, em grande número de casos, a responsabilização de agentes públicos por crimes de naturezas diversas. Além disso, a falta de efetividade mínima do sistema penal, nesses casos, frustra valores constitucionais importantes, como a probidade e a moralidade administrativa. 3. Para assegurar que a prerrogativa de foro sirva ao seu papel constitucional de garantir o livre exercício das funções – e não ao fim ilegítimo de assegurar impunidade – é indispensável que haja relação de causalidade entre o crime imputado e o exercício do cargo. A experiência e as estatísticas revelam a manifesta disfuncionalidade do sistema, causando indignação à sociedade e trazendo desprestígio para o Supremo. 4. A orientação aqui preconizada encontra-se em harmonia com diversos precedentes do STF. De fato, o Tribunal adotou idêntica lógica ao condicionar a imunidade parlamentar material – i.e., a que os protege por 2 suas opiniões, palavras e votos – à exigência de que a manifestação tivesse relação com o exercício do mandato. Ademais, em inúmeros casos, o STF realizou interpretação restritiva de suas competências constitucionais, para adequá-las às suas finalidades. Precedentes. II. Quanto ao momento da fixação definitiva da competência do STF 5. A partir do final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais – do STF ou de qualquer outro órgão – não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo. A jurisprudência desta Corte admite a possibilidade de prorrogação de competências constitucionais quando necessária para preservar a efetividade e a racionalidade da prestação jurisdicional. Precedentes. III. Conclusão 6. Resolução da questão de ordem com a fixação das seguintes teses: “(i) O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; e (ii) Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo”. 7. Aplicação da nova linha interpretativa aos processos em curso. Ressalva de todos os atos praticados e decisões proferidas pelo STF e demais juízos com base na jurisprudência anterior. 8. Como resultado, determinação de baixa da ação penal ao Juízo da 256ª Zona Eleitoral do Rio de Janeiro, em razão de o réu ter renunciado ao cargo de Deputado Federal e tendo em vista que a instrução processual já havia sido finalizada perante a 1ª instância.”
(AP 937 QO, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/05/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-265 DIVULG 10-12-2018 PUBLIC 11-12-2018)

De igual maneira, o Superior Tribunal de Justiça firmou seu entendimento na Questão de Ordem na Ação Penal nº 874 – DF, declinando de sua competência e determinando a remessa dos autos à primeira instância, em virtude da ausência de contemporaneidade entre os fatos e a função pública.

Assim, tem-se que a competência deste egrégio Tribunal de Justiça para processar e julgar ação penal originária em face de Prefeito Municipal está adstrita à hipótese de apuração de fato ocorrido durante o exercício do cargo público atual e que possua com este pertinência temática.

Com efeito, a prerrogativa de foro existe para garantir o exercício do múnus público de forma legítima e independente, atendendo, assim, o interesse da sociedade.

Lado outro, o princípio constitucional da isonomia veda que esta proteção do interesse público se configure em um indevido privilégio pessoal do agente.

No caso vertente, o fato aparentemente delituoso não guarda relação com o cargo de prefeito municipal, de modo que inexiste pertinência temática para justificar o foro de prerrogativa de função.

Diante de tudo, declaro-me incompetente para processar e julgar o presente feito, determinando-se a remessa dos autos ao MM. Juízo de Direito de Primeiro Grau.

Cumpra-se. Publique-se. Intime-se.

Arquivem-se os autos.

Salvador, 16 de novembro de 2022.

Des. Aliomar Silva Britto

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Desa. Aracy Lima Borges Primeira Criminal
EMENTA

8014262-32.2022.8.05.0000 Ação Penal - Procedimento Ordinário
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Autor: Ministerio Publico Do Estado Da Bahia
Reu: Flavio Da Silva Carvalho
Advogado: Raul Estrela Machado (OAB:BA37174-A)
Reu: Humberto Pereira Da Silva
Reu: Jose Cavalcante De Araujo

Ementa:

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

Primeira Câmara Criminal



Processo: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO n. 8014262-32.2022.8.05.0000
Órgão Julgador: Primeira Câmara Criminal
AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s):
REU: FLAVIO DA SILVA CARVALHO e outros (2)
Advogado(s):RAUL ESTRELA MACHADO

AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA – PREFEITO DENUNCIADO PELA SUPOSTA PRÁTICA DO DELITO PREVISTO NO ART. 54, §2°, V, DA LEI N° 9.605/98. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA DENÚNCIA E AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA ANALISADAS COM O MÉRITO. REQUISITOS DO ART. 41, DO CPP PREENCHIDOS. MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADA. RESPONSABILIDADE DO GESTOR EVIDENCIADA EM RAZÃO DO CARGO QUE OCUPA. DEMONSTRADA A AUSÊNCIA DE DOLO OU CULPA NA CONDUTA. DENÚNCIA REJEITADA.

1. Trata-se de Ação Penal Originária ajuizada pelo Ministério Público Estadual, em face de Flávio da Silva Carvalho, atual prefeito do município de Tabocas do Brejo Velho/BA, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 54, §2°, inciso V, da Lei n° 9.605/98, em autoria colateral, por supostamente autorizar a manutenção de lixão a céu aberto, em uma área situada nas imediações das coordenadas geográficas UTM 23 L 610021.60 m E; 8595396.64 m S datum WGS84, a 01 KM da rodovia BA-466 e a aproximadamente 1,6 Km do início do adensamento populacional da sede municipal, e não adotar medidas de precaução contra risco de dano ambiental grave e irreversível, permitindo a destinação diária de novos lixos e rejeitos urbanos para aquele local inadequado, bem como a presença de “catadores de lixo”.

2. A inicial acusatória atende aos requisitos preceituados no art. 41, do CPP, uma vez que contempla a qualificação do acusado; a exposição dos fatos criminosos, descrevendo minuciosamente as condutas supostamente praticadas por ele, com todas as suas circunstâncias (Alcaide que além de autorizar a manutenção de um “lixão a céu aberto” na municipalidade, permite a destinação diária de novos resíduos para esse local inadequado, e, ainda, a presença de “catadores de lixo” no ambiente com poluição em nível potencialmente danoso à saúde humana); a classificação do crime por ele cometido, em tese (art. 54, §2°, V, da Lei n° 9.605/98) e...

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