Professor de Matemática: saber em formação movente

AutorRoselaine Machado Albernaz - Cynthia Farina
CargoDoutora em Ciencias de la Educación pela Universidad de Barcelona, Espanha, especialista e mestre em Educação pela UFPel. - Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande (FURG)
Páginas302-323

Page 302

Cynthia Farina1

Roselaine Machado Albernaz2

Este ensaio trata da formação do professor de Matemática a partir de suas experiências no regime escolar e dos saberes que o constituíram histórica, filosófica e politicamente. Esses saberes não se resumem a conhecimentos acadêmicos, mas envolvem os efeitos subjetivos dos saberes científicos que ele incorpora. Partindo de um conto, a personagem chamada „professorapesquisadora‟ conduz o texto através de indagações sobre os processos de formação dos professores de uma disciplina tão particular como a Matemática. A personagem parece ter um „quê interrogativo‟ que não é alheio a cada um de nós, professores inquietos em frente a seu campo disciplinar. Com o objetivo de problematizar a formação e os saberes de nossa personagem, seus modos de ser, pensar e perceber, pretendese questionar, com e através dela, as novas solicitações que se fazem aos professores de Matemática e os saberes que a constituem como tal, sua forma de atuar e posicionarse no universo escolar.O ensaio proposto busca uma articulação entre os campos da arte, filosofia, ciência e educação. Diz respeito ao formigante mundo escolar, mas, antes de tudo, aos modos como pensamos tratar a formação de professores de Matemática, a partir de um conjunto de saberes lógicos, subjetivos e sensíveis. : Formação de professores. Matemática. Experiência estética. Filosofias da diferença.

This essay approaches the Mathematics teacher forming process from his/her experiences in the school system and the set of knowledge that has historically, philosophically and politically constituted him/her. This set of knowledge not only comprises academic knowledge, but also involves the subjective effects of knowledge it incorporates. Starting

Page 303

from a tale, the character, called „researcher/teacher‟, conducts the text through questions about the forming processes of teachers of such a particular subject as Mathematics. The character seems to have an „interrogative mood‟ which is peculiar to us, teachers, concerned about our disciplinary field. Having the objective of problematizing the formation and knowledge of our character, her ways of being, thinking and perceiving, we intend to question, with and through her, the new requirements that have been demanded from Mathematics teachers and the set of knowledge that constitute them, the way they are, their way of acting and taking position in the school universe. The proposed essay seeks for an articulation among the fields of Art, Philosophy, Science and Education. It speaks about the intriguing school world, but most of all, the ways we think of treating the forming process of Mathematics teachers based on a set of logical, subjective and sensitive knowledge.

Forming process of teachers. Mathematics. Aesthetic experience. Philosophy of difference.

RESUMEN:

Este ensayo trata de la formación del profesor de Matemática, a partir de sus experiencias en el régimen escolar y de los saberes que lo han constituido histórica, filosófica y políticamente. Esos saberes no se resumen a conocimientos académicos, sino que abarcan los efectos subjetivos de los saberes científicos que incorporan. A partir de un cuento, el personaje llamado 'profesorainvestigadora' conduce el texto a través de indagaciones sobre los procesos de formación de los profesores de una disciplina tan particular como la Matemática. El personaje tiene una mirada interrogante que no es ajena a cada uno de nosotros profesores inquietos frente a nuestro campo disciplinario. Con el objetivo de problematizar la formación y los saberes de nuestro personaje, sus modos de ser, pensar y percibir, se pretende cuestionar, con y a través de él, las nuevas solicitudes que se hacen a los profesores de Matemática y los saberes que los constituyen como tales, sus formas de actuar y posicionarse en el universo escolar. El ensayo busca una articulación entre los campos del arte, de la filosofía, de la ciencia y de la educación. Dice respecto al hormigante mundo escolar, pero, antes de todo, a los modos como pensamos tratar la formación de profesores de Matemática, a partir de un conjunto de saberes lógicos, subjetivos y sensibles.

Formación de profesores. Matemática. Experiencia estética. Filosofías de la diferencia.

INTRODUÇÃO

Os saberes dos professores não se resumem aos conhecimentos científicos, mas envolvem os saberes gerados como efeitos da ciência que incorporam, através de um modo de produção subjetivo.É importante estar alerta para que o pensar vai além do raciocínio lógico, aquele que, muitas vezes, é desenvolvido pelos professores de Matemática no cotidiano escolar para dar conta dos problemas da realidade objetiva. Este raciocínio se estabelece numa ordem lógica, exigindo uma linearidade e sequencialidade

Page 304

reducionista da complexidade do mundo. No nosso entendimento, pensar na formação e nos saberes de um professor de Matemática não é relacionálos, direta ou causalmente, aos saberes acadêmicos promovidos em sua formação acadêmica, pois essa seria uma forma limitada de pensar os processos de formação. Para Larrosa (2004, p.152), pensar não é somente raciocinar ou calcular ou argumentar. Para o autor, pensar é dar sentido ao que somos e ao que nos acontece.

Aliás, é essa uma forma bastante comum nos meios acadêmicos e espaços escolares de entender os processos de formação docente. Nesses espaços, a ênfase se instala numa lista de conteúdos e métodos de ensino, ou seja, se o professor domina os conteúdos de Matemática e utiliza os recursos didáticos adequadamente. Mas não é essa a ideia de formação docente e saber que queremos tratar, pois essa abordagem estaria mais ligada ao pensamento causal e dualista da sociedade disciplinar moderna com a qual surgiu o saber escolar.

Para circular por um pequeno conjunto de ideias que adentre os processos de formação do professor de Matemática, criamos um personagem chamado “professorapesquisadora”. Essa figura é alguém que tem um “quê” que parece estar em cada um de nós, professores, e nos professores de Matemática, que se sentem inquietos diante do seu mundo, ao seu trabalho. Dessa forma, utilizando um conto, pretendemos problematizar a formação e os saberes de nossa personagem, seus modos de ser, entender e viver a atualidade. Assim, nosso objetivo é problematizar, com e através dela, os descompassos e as novas solicitações que se fazem aos professores de Matemática, seus saberes e sua forma de atuar e posicionarse no universo escolar, em frente aos novos riscos e desafios do ensino desta disciplina na contemporaneidade.

O ensaio enfatiza a formação de professores de Matemática através de uma Arqueologia com Foucault, que indaga o presente. Propõe, também, outras possibilidades de se pensar a formação através de uma articulação com outros campos, a partir de Deleuze e Larrosa.

No decorrer do texto, a personagem criada estuda a sociedade disciplinar e a sociedade de controle para entender os desafios da Educação Matemática nos dias de hoje. A intenção é de inventar outras formas de se pensar a formação de professores de Matemática articulada a outros campos do conhecimento, favorecendo uma perspectiva

Page 305

interdisciplinar através das composições que ele apresenta com a arte, a literatura, a filosofia, a educação e a ciência.

1 PERSONAGENS: FIGURAS QUE POTENCIALIZAM A ESCRITA

Deleuze e Guattari desenvolveram a noção de „personagem conceitual‟. Para eles, “o filósofo é somente o invólucro de seu principal personagem conceitual e de todos os outros, que são os intercessores, os verdadeiros sujeitos de sua filosofia” (DELEUZE; GUATTARI, 2007, p.86). O filósofo deixa de ser ele mesmo e passa a ser uma aptidão do

pensamento que lhe permitirá criar conceitos através de um conjunto de forças que o atravessam. Talvez o que esses personagens façam é ajudar a pensar o movimento do pensamento do filósofo.

Para os autores, o personagem conceitual não é uma personificação abstrata ou um símbolo, pois ele “se encarna no processo de criação” (DELEUZE, 2007b, p.13). E vão além, pois afirmam que o destino do filósofo é de transformarse em seu personagem conceitual. Passa a ser um ato em terceira pessoa, pois o movimento do pensamento do filósofo é dado por intermédio desse personagem.

Por sua vez, essas „criaturas‟ não fazem parte somente do campo da filosofia. Encontramos as figuras estéticas como condição para que a arte crie. Essas figuras estéticas funcionam como potência no processo criativo, favorecendo um turbilhão de sensações que tanto o artista como o espectador podem experimentar. Assim, os personagens conceituais da filosofia e as figuras estéticas da arte cumprem a mesma função. Para Deleuze (2007b, p. 13), “a literatura só começa quando nasce em nós uma terceira pessoa que nos destitui do poder de dizer Eu”. Essa terceira pessoa são os personagens literários, ou seja, as figuras estéticas.

Tanto os personagens conceitos como as figuras estéticas podem deslizar uns nos outros, favorecendo o processo inventivo de quem escreve e obrigando a pensar sobre um problema que lhe toca. A invenção literária, fundamentada, ou não, na realidade, pode ser um bom aliado, ou melhor, um intercessor que permitirá desenvolver as ideias do texto e os conceitos filosóficos, articulando diferentes campos como a filosofia e arte.

A literatura é “uma mentira encarnada na realidade e, ao mesmo tempo, um olhar poético sobre o mundo em que vivemos” (GIARDINELLI, p. 28). É dessa forma que serão

Page 306

questionadas as novas solicitações que se fazem aos professores de Matemática e os saberes que os constituíram como tal, sua...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT