Quarta câmara cível - Quarta câmara cível

Data de publicação03 Agosto 2021
Número da edição2913
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Desa. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel
DECISÃO

0505311-24.2018.8.05.0080 Apelação Cível
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Apelado: Elizabete Carneiro Melo
Advogado: Paulo Renato Portugal De Almeida (OAB:0052970/BA)
Advogado: Raphael Lima Mascarenhas (OAB:0054645/BA)
Apelante: Estado Da Bahia

Decisão:

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

Quarta Câmara Cível

Gabinete da Desª. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel



Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0505311-24.2018.8.05.0080
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
Relator: Desª. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel
APELANTE: ESTADO DA BAHIA
Advogado(s):
APELADO: ELIZABETE CARNEIRO MELO
Advogado(s): RAPHAEL LIMA MASCARENHAS, PAULO RENATO PORTUGAL DE ALMEIDA


DECISÃO MONOCRÁTICA

Adoto o relatório da sentença, de ID n.º 17223999, acrescentado se tratar de apelação cível interposta pelo Estado da Bahia contra sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Feira de Santana/BA, que nos autos da Ação Ordinária, confirmou a medida liminar concedida e acolheu parcialmente o pedido autoral, para que o Ente Público disponibilize a assistência médica terapêutica prescrita e necessária à saúde da demandante.

Em suma, a autora ajuizou a presente demanda, diante da negativa do Ente Público, em assisti-la, conforme relatório de seu médico especialista.

Em sede de antecipação de tutela, o douto Magistrado sentenciante determinou a providência, arbitrando astreintes para a hipótese de recalcitrância no cumprimento da ordem judicial, medida confirmada por sentença, inclusive, no que toca à condenação em honorários de sucumbência.

Irresignado, o Estado apela, defendendo o desacerto do julgado, tendo em vista que o cumprimento da liminar ocasionou a perda do objeto, bem como a condenação na verba honorária não se justifica, uma vez que não praticou nenhum ilícito.

Com esteio nesses argumentos, pede o provimento da insurgência, com a modificação da sentença primária.

Instada a manifestar-se, a recorrida quedou-se inerte, sem apresentar contrarrazões, consoante certidão exarada (ID n.º 17224015).

Nesta instância, coube-me, por sorteio, a relatoria.

É o relatório. Decido.

Inicialmente, registro que o presente julgamento se dá monocraticamente, consoante entendimento sumulado pelo STJ, em seu enunciado nº. 568, cujo teor é o que segue:

Súmula 568. O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.

Este posicionamento do Superior Tribunal de Justiça encontra esteio na intelecção do art. 932, e seus incisos IV e V, do CPC, permitindo ao relator o julgamento monocrático, como meio a privilegiar o instituto dos precedentes, a sua força normativa e garantindo-se a celeridade processual.

À guisa de corroboração, cumpre transcrever a doutrina de Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery:

O relator pode decidir monocraticamente tudo, desde a admissibilidade do recurso até o seu próprio mérito, sempre sob o controle do colegiado a que pertence, órgão competente para decidir, de modo definitivo, sobre a admissibilidade e mérito do recurso. O relator pode conceder a antecipação dos efeitos a serem obtidos no recurso (“efeito ativo” ou, rectius, “tutela antecipada recursal”), conceder efeito suspensivo ao recurso, conceder liminar em tutela de urgência, não conhecer do recurso (juízo de admissibilidade), negar provimento a recurso e dar-lhe provimento (juízo de mérito).[1] (NERY Jr., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1851)

Nessa linha de ideias, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, comentando o art. 932 do CPC, elucidam sobre o dever do relator:

O relator tem o dever de julgar o recurso monocraticamente, preenchidos os requisitos inerentes à espécie, porque aí estará prestigiando a autoridade do precedente (arts. 926 e 927, CPC/2015) e patrocinando sensível economia processual, promovendo por essa via um processo com duração razoável (arts. 5.º, LXXVIII, CF/1988, e 4.º, CPC/2015). Como observa a doutrina, não há aí um simples espaço de poder livre – o que há é um 'dever-poder'. Pode o relator julgar monocraticamente qualquer espécie recursal a partir do art. 932, CPC/2015, podendo inclusive invocá-lo para decidir a remessa necessária e para, em sendo o caso, decidir questões concernentes a processos de competência originária. (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Comentários ao Código de Processo Civil Artigos 926 ao 975, Vol. XV. Diretor: Luiz Guilherme Marinoni)

Para além do inconteste dever de julgar monocraticamente, os festejados processualistas arrematam:

O relator pode negar provimento ao recurso liminarmente quando esse for contrário aos precedentes das Cortes Supremas (art. 932, IV, a e b, CPC/2015). Pode igualmente provê-lo, mas aí se exige o contraditório (art. 932, V, CPC/2015).

Note-se que a alusão do legislador a súmulas ou a casos repetitivos constitui apenas um indício – não necessário e não suficiente – a respeito da existência ou não de precedentes sobre a questão que deve ser decidida. O que interessa para incidência do art. 932, IV, a e b, CPC/2015, é que exista precedente sobre a matéria – que pode ou não estar subjacente a súmulas e pode ou não decorrer do julgamento de recursos repetitivos. (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Comentários ao Código de Processo Civil Artigos 926 ao 975, Vol. XV. Diretor: Luiz Guilherme Marinoni, Coordenadores: Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero. São Paulo: Revista dos Tribunais, E-book, 2017).

Dessa forma, o presente julgamento, por decisão monocrática, consentâneo com a norma preconizada no art. 932, IV e V, do CPC/2015, não configura negativa de prestação jurisdicional, tampouco afronta ao art. 5°, XXXV, da Constituição Federal, porquanto a fundamentação da presente decisão perfilha-se ao entendimento dominante acerca do tema.

Anuncio, pois, o julgamento.

O Estado da Bahia, ora apelante, aduz a preliminar de perda de objeto da ação, sob o fundamento de que juntou aos autos cópia do ofício de orientação de cumprimento de liminar expedido, assim como a resposta recebida pela Secretaria de Saúde antes do cumprimento da ordem judicial, o que não prospera. Veja-se.

A despeito das argumentações do Estado, tratando-se de ação, em que se discute a negativa de realização de TERAPIA A VAC (Terapia Por Pressão Negativa) para a autora de forma integral, o mero exaurimento em relação a disponibilização, a internação e realização dos exames necessários pretendidos, no curso do processo, não implica em perda do interesse de agir, porquanto o tratamento médico, pela demandante, apenas se dera por força de ordem judicial.

Entendimento contrário implicaria reconhecer, em todos os casos de liminar satisfativa, o consequente improvimento, cujo efeito processual imediato seria, contraditoriamente, tornar sem efeito a decisão precária exauriente.

Deste modo, entendo persistir interesse processual da apelada, ainda que seja para ver ratificadas as decisões favoráveis.

Pois bem.

A presente ação foi ajuizada contra a negativa do Ente Público em realizar a terapêutica na paciente autora, consoante prescrição médica.

Registro que incumbe ao Poder Público, em todas as suas esferas representativas, propiciar, através de políticas sociais e econômicas, o acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação do direito constitucional à saúde, conforme dispõe o artigo 196, da Constituição Federal, in verbis:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

O dever de garantir o acesso universal e igualitário, dos cidadãos brasileiros, aos serviços públicos de saúde é, portanto, de todos os Entes Federativos, que respondem por tal obrigação de forma solidária, facultando-se, ao prejudicado, requerer tutela jurisdicional em face de cada um deles, isolada ou conjuntamente.

A matéria está pacificada no âmbito do Supremo Tribunal Federal, cuja jurisprudência firmou-se "no sentido de que é solidária a obrigação dos entes da Federação em promover os atos indispensáveis à concretização do direito à saúde, tais como, na hipótese em análise, a realização de tratamento médico por paciente destituído de recursos materiais para arcar com o próprio tratamento. Portanto, o usuário dos serviços de saúde, no caso, possui direito de exigir de um, de alguns ou de todos os entes estatais o cumprimento da referida obrigação" (STF - RE: 820910 CE, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 26/08/2014, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-171 DIVULG 03-09-2014 PUBLIC 04-09-2014).

Examinando os autos, extraio que o juízo a quo lastreou, como fundamento essencial de suas conclusões, no direito constitucional à saúde, garantido em cláusula pétrea (art. 5º, caput, CF/88) e em dispositivos específicos da Constituição Federal.

Para assim decidir, afasta-se qualquer pecha de desrespeito à independência aos Poderes constituídos, bem como a aplicação, ao caso, da teoria da reserva do possível, segundo a qual os recursos públicos, dada sua escassez, devem ser aplicados de acordo com o juízo de conveniência e oportunidade do gestor.

É absolutamente pacífico o entendimento de que a intervenção judicial é legítima quando se constate a existência...

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