Questões de Gênero e o mundo do trabalho, no ateliê de brinquedo de miriti

AutorLidia Sarges Lobato, Joyce Otânia Seixas Ribeiro2
CargoMestrado em Educação pela Universidade Federal do Pará. E-mail: lidiasarges@yahoo.com.br / Doutorado em Educação pela Universidade Federal do Pará. Estágio pós-doutoral na Universidad de Playa Ancha/Valparaíso/Chile. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e Educação/Gepege/CNPq.
Páginas14-33
2GÊNERO | Niterói | v. 22 | n. 2 | p. 2-2 | 1. sem 2022
EDITORIAL
2
EDITORIAL
Nesta edição da revista Gênero, apresentaremos o dossiê Gênero,
Políticas Públicas e Serviço Social, organizado pelas professoras doutoras
Luciana Zucco e Teresa Kleba L isboa, ambas da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC), e pela professora doutora Magali Silva Almeida,
da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Serão apresentadas discus-
sões sobre gênero e a interseccionalidade entre raça e classe; sexualidade;
violência; migração feminina; encarceramento de mulheres; e suas inter-
faces com as políticas públicas, visando contribuir para o aprofundamento
dos estudos sobre a temática no serviço social. Esses estudos são de
grande relevância em um contexto de graves retrocessos no campo das
políticas públicas e de avanço do racismo e da violência contra mulheres,
homossexuais, bissexuais, travestis e transexuais devido ao neoconservado-
rismo e ultraneoliberalismo que dominam o Estado brasileiro.
Ademais, esta edição conta com uma série de artigos de temas livres,
como adoção por casais do mesmo sexo; mulheres e esporte; participação
feminina na democracia portuguesa; feminismo negro; abor to; e trabalho
doméstico. Oferece, ainda, duas resenhas: uma sobre o livro E se fosse você?
sobrevivendo às redes de ódio e fake news, de autoria de Manuela d’Ávila;
eoutra sobre o livro Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano,
que tem como autora Grada Kilomba. Sendo assim, convidamos a todas
e todos, da comunidade acadêmica ou não, que possuem interesse pelos
estudos de gênero a desfrutar de uma ótima leitura.
Equipe editorial:
João Bosco Hora Góis
Kamila Cristina da Silva Teixeira
Sidimara Cristina de Souza
GÊNERO | Niterói | v. 23 | n. 1 | p. 14-33 | 2. sem 2022
14
QUESTÕES DE GÊNERO E O MUNDO DO TRABALHO,
NO ATELIÊ DE BRINQUEDO DE MIRITI
Lidia Sarges Lobato1
Joyce Otânia Seixas Ribeiro2
RESUMO: O trabalho tem como objetivo trazer à tona a produção da diferença
de gênero e sexualidade por uma mulher-artesã do miriti, no contexto de
uma bicentenária tradição. O aporte teórico-metodológico é dos Estudos de
Gênero e o método de pesquisa, a etnografia pós-moderna. Os resultados
apontam para uma mulher que consegue cruzar as fronteiras, em uma trama
que envolve aceitação, negociação e resistência; ao se movimentar na tradição
do brinquedo de miriti, esta mulher produz peças conhecidas localmente
como casal de namorados, borrando, a norma, a tradição e seus significados
heteronormativos, diluindo binarismos e tensionando a heterossexualidade
compulsória.
PALAVRAS-CHAVE: Gênero. Sexualidade. Brinquedo de Miriti.
ABSTRACT: The work aims to bring up the production of the dierence
in gender and sexuality by a woman-artisan from the Miriti, in the context
of a bicentennial tradition. The theoretical-methodological support is from
Gender Studies and the research method, postmodern ethnography. The
results point to a woman who manages to cross the borders, in a plot that
involves acceptance, negotiation and resistance; moving in the tradition of the
miriti toy, this woman produces pieces known locally as a “couple of lovers”,
blurring the norm, the tradition and its heteronormative meanings, diluting
binarisms and tensioning the compulsory heterosexuality.
KEYWORDS: Gender. Sexuality. Miriti toy.
1 Mestrado em Educação pela Universidade Federal do Pará. E-mail: lidiasarges@yahoo.com.br
2 Doutorado em Educação pela Universidade Federal do Pará. Estágio pós-doutoral na Universidad de
Playa Ancha/Valparaíso/Chile. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero e Educação/Gepege/CNPq.
E-mail:
Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons – Atribuição Não-
Comercial 4.0 Internacional.
2GÊNERO | Niterói | v. 22 | n. 2 | p. 2-2 | 1. sem 2022
EDITORIAL
2
EDITORIAL
Nesta edição da revista Gênero, apresentaremos o dossiê Gênero,
Políticas Públicas e Serviço Social, organizado pelas professoras doutoras
Luciana Zucco e Teresa Kleba L isboa, ambas da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC), e pela professora doutora Magali Silva Almeida,
da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Serão apresentadas discus-
sões sobre gênero e a interseccionalidade entre raça e classe; sexualidade;
violência; migração feminina; encarceramento de mulheres; e suas inter-
faces com as políticas públicas, visando contribuir para o aprofundamento
dos estudos sobre a temática no serviço social. Esses estudos são de
grande relevância em um contexto de graves retrocessos no campo das
políticas públicas e de avanço do racismo e da violência contra mulheres,
homossexuais, bissexuais, travestis e transexuais devido ao neoconservado-
rismo e ultraneoliberalismo que dominam o Estado brasileiro.
Ademais, esta edição conta com uma série de artigos de temas livres,
como adoção por casais do mesmo sexo; mulheres e esporte; participação
feminina na democracia portuguesa; feminismo negro; abor to; e trabalho
doméstico. Oferece, ainda, duas resenhas: uma sobre o livro E se fosse você?
sobrevivendo às redes de ódio e fake news, de autoria de Manuela d’Ávila;
eoutra sobre o livro Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano,
que tem como autora Grada Kilomba. Sendo assim, convidamos a todas
e todos, da comunidade acadêmica ou não, que possuem interesse pelos
estudos de gênero a desfrutar de uma ótima leitura.
Equipe editorial:
João Bosco Hora Góis
Kamila Cristina da Silva Teixeira
Sidimara Cristina de Souza
GÊNERO | Niterói | v. 23 | n. 1 | p. 14-33 | 2. sem 2022 15
INTRODUÇÃO
Este artigo apresenta parte dos resultados de pesquisa3 desenvolvida
durante os anos de 2017 e 2018. Trata-se de uma experiência etnográfica
desenvolvida durante quatro meses em um ateliê de brinquedo de miriti4 na
cidade de Abaetetuba, no Estado do Pará. Nosso objetivo para o momento
é refletir e, ao mesmo, tempo evidenciar a prática de uma mulher-artesã
do miriti, desvelada em suas criações artísticas entrelaçadas pelas questões
relativas à produção da diferença. Embasadas nos aportes teóricos dos Estudos
Culturais e dos Estudos de Gênero, estamos sendo desafiadas a pensarmos tais
questões, que vão além dos padrões normativos estabelecidos em sociedade.
Neste sentido, tomamos como método de pesquisa a etnografia pós-moderna,
seguindo a norma, que prevê a observação participante, as conversações e a
captura de imagens, que serão apresentadas ao longo da tessitura do texto.
A etnografia “[...] se configura na verdade como um campo articulado pelas
tensões, ambiguidades e indeterminações próprias do sistema de relações do
qual faz parte” (CLIFFORD, 1998, p. 10), além de estar imersa nas experiências
em meio às relações de poder existentes entre o etnógrafo/pesquisador e seus
interlocutores. No processo de feitura da pesquisa, o campo assumiu grande
relevância no que se refere à automodelagem etnográfica, momento no qual
o/a etnógrafo/a constitui o outro e a si mesmo/a.
A etnografia pós-moderna não foca na descrição densa, mas na escritura.
Por isso, Cliord (2016a, 2016b) afirma que o próprio texto embalsama o
acontecimento na medida em que expande seu significado. É preciso ob-
servar os acontecimentos outros que fluem no cotidiano do ateliê e durante
a produção do brinquedo de miriti, compondo o diário de campo para depois
traduzi-lo, ou seja, passar as informações da performance oral para a escrita;
agora, as informações também se movem de texto para texto, e a inscrição
transforma-se em transcrição, de modo que tanto os interlocutores quanto
a pesquisadora são leitores/as e coautores/as de uma invenção cultural. Fazer
etnografia é saber experimentar sensações outras inimagináveis.
3 Pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica, fruto da
dissertação de Mestrado intitulada O currículo e seus efeitos na subjetividade de uma mulher-artesã do miriti.
4 O artesanato de miriti, popularmente chamado de brinquedo de miriti, consiste em peças miniaturizadas e
multicoloridas de cenas do cotidiano ribeirinho no interior da Amazônia (fauna, trabalho, moradia, transporte,
religiosidade e afeto); a matéria-prima para a modelagem das peças é a bucha ou braço do miritizeiro,
espécie nativa da região que, por sua maleabilidade e leveza, é conhecida como o isopor da Amazônia. O
brinquedo de miriti é reconhecido como patrimônio cultural imaterial do estado do Pará. Disponível em:
https://www.artesol.org.br, acesso em: 18/11/2021.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT