Quinta câmara cível - Quinta câmara cível

Data de publicação07 Junho 2022
Gazette Issue3113
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Des. José Cícero Landin Neto
DECISÃO

8003109-02.2022.8.05.0000 Agravo De Instrumento
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Agravante: Banco Maxima S.a.
Advogado: Giovanna Bastos Sampaio Correia (OAB:BA42468-A)
Agravado: Nayra Cristina Do Nascimento Leite
Advogado: Adrieli De Barros Feitosa Da Silva (OAB:BA63802-A)

Decisão:

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo Banco Máxima S/A em face de Nayra Cristina do Nascimento Leite , nos autos do processo de origem nº 8016519-18.2021.8.05.0080, irresignado com a decisão de origem proferida nos seguintes termos:

Ex positis, atento à legislação e aos princípios de direito aplicáveis a espécie e com fulcro no art. 300, Concedo a Tutela de urgência requerida, para determinar a parte acionada, a Imediata suspensão dos descontos relativos aos contratos de Nº 237730913(ID 23156026) , nos vencimentos da parte da Autora, sob pena de ser considerado ato atentatório a Justiça, ex vi do art. 77, § 2º, do NCPC e de pagamento de multa no valor R$ 30.000,00, destinado ao F u n d o M u n i c i p a l d e Sa ú d e. Oficie-se a fonte pagadora (INSS) para suspensão dos descontos das parcelas do(s) empréstimo(s) nos vencimentos d a p a r t e a u t o r a .

Afirma que a Autora ajuizou ação ordinária em face do Banco Agravante, em razão de diversas ofertas de empréstimo, tendo contratado o crédito no valor de R$ 8.711,92 (oito mil, setecentos e onze reais e noventa e dois centavos) e, inobstante as parcelas de caráter variável, consistia em um contrato sem previsão de término.

Informa que a Agravada sabia não possuir mais a margem consignável de 30% disponível para empréstimos comumente ofertados aos servidores públicos, tendo optado por realizar saque com seu cartão do Programa Credcesta, justamente diante da separação entre a margem Credcesta e a margem utilizada pelas demais instituições financeiras.

Traz a informação de um áudio de ligação em contato firmado via Callcenter entre a Agravada e Agravante, em que àquela questiona seu limite para compras e confirma que realizou compras anteriormente que vieram descontadas em suas faturas, fato que, segundo a ré, joga por terra as alegações da Autora/Agravada de que sofreu cobranças indevidas em razão de “compras”. Ressalta que nesta mesma ligação, a atendente explica de forma clara à Autora/Agravada que sua margem para compras diminuiu por se tratar de um valor “rotativo”, restando portanto, clara a ciência da Autora/Agravada da natureza das operações realizadas.

Requereu ao menos o deferimento do valor do depósito controverso/contratado, já que ainda não é possível aferir se os juros estão acima ou não da média de mercado.

Pugnou pela concessão do efeito suspensivo, prequestionando a matéria.

O Recurso é tempestivo. O preparo foi realizado ( ID nº 24287687).

Foi negado efeito suspensivo.

Foi certificado o decurso, in albis, do prazo para apresentar contrarrazões.

No caso em tela, o Agravante se mostra irresignado com a decisão proferida que determinou a suspensão dos descontos, por entender que são devidos, em razão de contrato firmado entre as partes.

Compulsando os autos, verifico que não estão presentes os requisitos autorizadores da reforma da decisão de origem.

Esclareça-se, inicialmente, que a relação jurídica estabelecida entre as partes é de natureza consumerista e, portanto, deve ser solucionada à luz do Código de Defesa do Consumidor. Muito embora a agravada argumente que não tenha efetuado o negócio jurídico que ensejou a propositura da ação em face do ora agravante, acabou sendo vítima do serviço fornecido pela mesma, equiparando-se a consumidor nos moldes do art.17 do CDC, in verbis: “Art. 17 do CDC - Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento”.

Ao comentar o dispositivo legal acima transcrito, James José Marins de Souza pontua que "o fato do serviço é a causa objetiva do dano ocasionado ao consumidor em função de defeito na prestação de serviço, isto é, a repercussão do defeito do serviço, causadora de danos na esfera de interesse juridicamente protegido do consumidor (...). Responsabilizam-se independentemente da apuração de culpa todos os fornecedores de serviço, quer imediatos como mediatos, solidariamente, pelos danos ocasionados aos consumidores em função de defeito na prestação do serviço ou por incompletude nas informações acerca da segurança na sua execução ou fruição." (Arruda Alvim, Thereza Alvim, Eduardo Arruda Alvim e James Marins, Código do Consumidor Comentado, RT, 2ª tiragem, p. 47).

E por tratar a matéria discutida nos autos de relação de consumo, incide a responsabilidade objetiva do fornecedor de reparar os danos sofridos pelo consumidor (art. 14 do CDC).

É certo que, segundo a teoria do risco da atividade presente no CDC, aquele que lucra com uma atividade deve responder pelo risco ou pelas vantagens dela decorrentes, devendo ser responsável pela insegurança que o procedimento apresenta, não podendo transferir tais riscos ao consumidor.

Assim, sucumbe o recorrente à teoria do risco do empreendimento, adotada pelo legislador pátrio na hipótese de fato do serviço, impondo-se àquele que exerce algum tipo de atividade no mercado de consumo o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos serviços fornecidos, quer em face dos consumidores diretos, quer em face dos consumidores em potencial. Deste modo, não há que se falar em incidência da excludente de culpabilidade prevista no art. 14, § 3º, II, do CDC.



Frise-se, mais uma vez, que não demonstrou o agravante, em análise sumária, que sua conduta se tenha pautado na estrita conformidade do CDC, evidenciando que, de fato, tomou todas as providências devidas na formação contratual ou, mesmo, que tenha o recorrido realizado o indigitado negócio jurídico. Logo, tendo em vista a verossimilhança das alegações e a hipossuficiência do consumidor, incumbia ao agravante provar o fato alegado como justificativa para o ato ilícito que lhe é imputado, o que não o fez, a teor do que estabelece o art. 373, inciso II, do CPC, in verbis: ”Art. 373. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.”

O professor Humberto Theodoro Júnior, ao lecionar sobre o ônus da prova, ensina que: "Quando, todavia, o réu se defende através de defesa indireta, invocando fato capaz de alterar ou eliminar as conseqüências jurídicas daquele outro fato invocado pelo autor, a regra inverte-se. É que, ao se basear em fato modificativo, extintivo ou impeditivo do direito do autor, o réu implicitamente admitiu como verídico o fato básico da petição inicial, ou seja, aquele que causou o aparecimento do direito que, posteriormente, veio a sofrer as consequências do evento a que alude a contestação. O fato constitutivo do direito do autor tornou-se, destarte, incontroverso, dispensando, por isso mesmo, a respectiva prova (art. 334, III). A controvérsia deslocou-se para o fato trazido pela resposta do réu. A este, pois, tocará o ônus de prová-lo" (Curso de Direito Processual Civil, 1º Volume, Rio de Janeiro, Forense, 2000, p. 374).

Realizadas tais considerações, insta salientar que, não se vislumbra o preenchimento dos requisitos da verossimilhança nas alegações da agravante, apta a ensejar a modificação da decisão a quo, tampouco a urgência consubstanciada no risco de dano irreparável ou de difícil reparação para a agravante.

No que tange à fixação da multa diária, mostra-se perfeitamente cabível à espécie.

Conforme destacam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery: “Imposição da multa. Deve ser imposta a multa, de ofício ou a requerimento da parte. O valor deve ser significativamente alto, justamente porque tem natureza inibitória. O juiz não deve ficar com receio de fixar o valor em quantia alta, pensando no pagamento. O objetivo das astreintes não é obrigar o réu a pagar o valor da multa, mas obrigá-lo a cumprir a obrigação na forma específica. A multa é apenas inibitória. Deve ser alta para que o devedor desista de seu intento de não cumprir a obrigação específica. Vale dizer, o devedor deve sentir ser preferível cumprir a obrigação na forma específica a pagar o ato valor da multa fixada pelo juiz” (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 8ª ed. São Paulo: RT, 2004, p. 858).

Ainda pontue-se que cabível dilatar o prazo para cumprimento, em face das peculiaridades que envolvem o caso em apreço, o que, indiretamente, acarretará repercussão sobre a multa imposta, em caso de eventual descumprimento. Assim, é razoável fixar o prazo de 15 (quinze) dias para cumprimento da decisão agravada, a contar do dia subsequente à publicação da presente decisão.

Frise-se, ainda, que as astreintes não sofrem os efeitos da coisa julgada, portanto, pode ser modificada após a sua fixação e trânsito em julgado. É o que se extrai do art. 537 do CPC/2015.

Entretanto, a multa fixada revela-se exorbitante, assim, neste particular merece reforma a decisão agravada, para determinar que a imposição de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), para a hipótese de descumprimento da obrigação fixada pelo juízo a quo, limitado ao importe total de R$ 30.000,00...

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