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Data de publicação29 Outubro 2020
Número da edição2729
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Desa. Márcia Borges Faria
DESPACHO

8000346-94.2018.8.05.0185 Apelação (cível)
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Apelado: Guilhermina Ramos De Matos
Advogado: Rafael Bomfim Costa (OAB:3718700A/BA)
Apelante: Municipio De Palmas De Monte Alto
Advogado: Vicente De Paula Santos Carvalho (OAB:4199100A/BA)
Advogado: Ciro Rocha Soares (OAB:0017309/BA)
Advogado: Tiago Leal Ayres (OAB:0022219/BA)

Despacho:


Ouça-se a d. Procuradoria de Justiça.


Salvador/BA, 28 de outubro de 2020.


Desembargadora Márcia Borges Faria

Relatora

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Des. Edmilson Jatahy Fonseca Júnior
DECISÃO

8029314-39.2020.8.05.0000 Agravo De Instrumento
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Agravante: Municipio De Itapetinga
Advogado: Bruno Garcia Da Silva (OAB:0025894/BA)
Agravado: Reinaldo Ribeiro Dos Santos

Decisão:

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Itapetinga em face da decisão constante no ID 10472617, fls. 37/40, proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara dos Feitos de Relações de Consumo, Cíveis e Comerciais, Consumidor, Registros Públicos e Acidentes de Trabalho da Comarca de Itapetinga que deferiu a tutela provisória de urgência, de natureza antecipatória, para determinar ao Estado da Bahia e ao Município de Itapetinga que realizem a transferência imediata do autor para um leito de UTI com suporte neurológico, no prazo máximo de 72(setenta e duas) horas, oferecendo os recursos necessários para o tratamento do paciente, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada a R$ 10.000,00 (dez mil reais), sem prejuízo da adoção das demais providências cabíveis à espécie.

Em suas razões recursais, o agravante argui a sua ilegitimidade passiva, ao argumento de que o Estado da Bahia é o responsável pelo Sistema de Regulação, além de receber os repasses da União para atender as necessidades de saúde, consistentes em medicamentos e tratamentos, acrescentando que o autor já foi regulado pelo órgão municipal desde 22/09/2020, para ser transferido para uma unidade de UTI com suporte neurológico, dependendo, apenas, da disponibilização da vaga, de responsabilidade do Estado da Bahia.

Defende que a medida liminar deferida afronta os princípios da isonomia e da legalidade, além de representar interferência do Poder Judiciário nas atividades do Poder Executivo.

Ressalta, no caso, a incidência do princípio da reserva do possível, diante do impacto criado pela pandemia do COVID-19 que atingiu o orçamento da saúde, de modo que não pode deixar de atender as necessidades da coletividade para atender a de um munícipe.

Outrossim, rebate a fixação de astreintes, alegando que os parcos recursos disponíveis para a saúde pública municipal têm sido utilizados no combate ao avanço do COVID-19, de modo que temerária a imposição da multa no atual momento, pleiteando a suspensão pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias.

Destaca a presença do perigo de dano, em razão do atual momento com a pandemia.

Pugna pela suspensão integral dos efeitos da medida liminar proferida pelo Juiz de origem e, ao final, que seja provido o agravo de instrumento.

Juntou documentos.

É o relatório. Passo a decidir.

Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Itapetinga em face da decisão que deferiu a tutela provisória de urgência, de natureza antecipatória, para determinar ao Estado da Bahia ao Município de Itapetinga que realizem a transferência imediata do autor para um leito de UTI com suporte neurológico, no prazo máximo de 72(setenta e duas) horas, oferecendo os recursos necessários para o tratamento do paciente, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada a R$ 10.000,00 (dez mil reais), sem prejuízo da adoção das demais providências cabíveis à espécie.

Inicialmente, a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pelo Município de Itapetinga não merece prosperar.

Sobre o tema, pacificou-se no STJ que o funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária dos entes federados, diante do direito fundamental em questão.

Deste modo, a responsabilidade pela promoção de atos indispensáveis à concretização do direito à saúde, no caso disponibilizar ao agravado vaga em UTI com suporte neurológico, é solidária entre a União, Estados e Municípios, tendo por fim assegurar ao indivíduo direito fundamental, configurando, em caso de negativa por parte do ente público, em violação do direito à saúde, com o manifesto descumprimento da obrigação constitucionalmente prevista e transgressão da dignidade humana e do direito à vida.

Assim, configurada a responsabilidade solidária dos entes da federação, é facultado ao necessitado exigir de qualquer um deles, em conjunto ou separadamente, o cumprimento da obrigação, possuindo todos legitimidade para integrar o polo passivo das demandas que objetivam garantir o acesso à saúde para os que não dispõem de recursos financeiros. Rejeita-se a preliminar de ilegitimidade passiva.

No mérito, analisados os autos, verifica-se que o agravado foi vítima de acidente vascular cerebral (AVC), tendo ajuizado a ação originária pretendendo vaga em UTI com suporte neurológico para tratamento da doença, consoante indicação médica de ID 10471617, pleito que foi atendido por meio da decisão ora agravada.

Pois bem. Pretende o agravante a suspensão dos efeitos da liminar concedida nos autos originários deste agravo, eximindo-o da obrigação de cumprir a decisão agravada.

Contudo, sob uma análise perfunctória da questão posta sub judice, diante da narrativa da inicial, bem como dos documentos acostados, não se evidencia, de forma suficientemente clara, a existência dos requisitos legais para a concessão da liminar postulada, porquanto não demonstrado, no caso, o fumus boni iuris necessário ao deferimento da medida.

Por outro lado, afere-se que restaram preenchidos pelo agravado os requisitos imprescindíveis à concessão da medida vindicada no primeiro grau, especialmente face à presença de simultaneidade da plausibilidade do direito perseguido e da possibilidade de dano de reparação incerta.

Isto porque, afere-se não haver dúvida acerca do estado de saúde do paciente e da necessidade premente do procedimento solicitado pelo profissional habilitado para tratamento da doença que acomete o agravado, consoante demonstram os relatórios médicos e exames acostados aos autos.

Como dito, o direito à saúde, configura-se como dever do Estado, devendo ser garantido de modo indistinto por todos os entes públicos, vale dizer, de forma solidária entre a União, os Estados e os Municípios, conforme preleciona o artigo 196, da Constituição Federal, podendo qualquer dos referidos entes constar no polo passivo, de forma isolada ou conjunta. Eis o teor da norma constitucional apontada:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Logo, não é admitido que o Município agravante pretenda ser afastado da responsabilidade imposta pela Carta Maior, uma vez que o constituinte o colocou, também, na condição de garantidor do direito à saúde dos cidadãos.


Com efeito, ao conceder a liminar em favor do agravado, o Juiz singular, à primeira vista, procurou viabilizar a exigência da observância ao princípio maior: o direito à vida, mormente diante do requerimento médico que recomendou a internação em UTI especializada, necessária para o tratamento do paciente, inclusive porque destituído de recursos financeiros para arcar com o tratamento médico prescrito.

Deste modo, como deslindado em linhas pretéritas, a responsabilidade pela promoção de atos indispensáveis à concretização do direito à saúde é solidária entre a União, Estados e Municípios, configurando, se o ente público negar a proteção pretendida nos presentes autos, violação do direito à saúde, com o manifesto descumprimento da obrigação constitucionalmente prevista e transgressão da dignidade humana e do direito à vida.

Nesta conformidade, impende colacionar importante manifestação do Ministro Celso de Mello, no julgamento do AgRg no RE 271.286-8/RS:

"O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano de organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento...

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