A Racionalidade e o Debate Ambiental Contemporâneo

AutorJosé Edmilson de Souza Lima
CargoSociólogo. Doutor em Meio ambiente e Desenvolvimento (MADE-UFPR). Pesquisador/docente do Mestrado em Organizações e Desenvolvimento da FAE
Páginas100-118
DOI: http://dx.doi.org/10.5007/1984-8951.2012v13n102p100
Cad. de Pesq. Interdisc. em Ci-s. Hum-s., Florianópolis, v.13, n.102, p.100-118 jan/jul 2012
A Racionalidade e o Debate Ambiental Contemporâneo
The Rationality and Contemporary Environmental Debate
José Edmilson de Souza Lima
1
Resumo
Nas entrelinhas do debate ambiental contemporâneo estão escondidos e revelados
valores, crenças e práticas que podem ser caracterizados como expressões de uma
racionalidade. Nesse contexto, o artigo se propõe a ensaiar respostas para as
seguintes indagações: o que é a razão? É possível pensar uma racionalidade
ambiental não centrada no mercado? Ou, que não sirva de legitimação ideológica da
sociedade centrada no mercado? Para tanto, na primeira parte reconstitui as origens
clássicas do conceito de razão; na segunda, explicita o processo de formação e
consolidação da racionalidade instrumental moderna e da marginalização da
racionalidade substantiva; na terceira, resgata a reconstituição da racionalidade
substantiva como possibilidade objetiva de ampliação dos espaços para a auto-
realização humana; na quarta, torna visíveis algumas conexões entre
substantividade humana e racionalidade ambiental; e, finalmente, conclui
parcialmente que racionalidade ambiental, entendida como racionalidade alternativa
de produção, não pode estar centrada no mercado.
Palavras-chave: Razão. Racionalidade Instrumental. Racionalidade Substantiva.
Racionalidade Ambiental.
Abstract
In the subtext of the contemporary environmental debate are hidden and restores
values, beliefs and practices that can be characterized as expressions of rationality.
In this context, the article proposes to rehearse answers for the following questions:
what is reason? Is it possible to think an environmental rationality that is not centered
on the market? Or, that does not serve as ideological legitimation of the society
centered on the market? To this end, the first part reviews the origins of the classical
concept of reason; in the second one, it explains the process of formation and
consolidation of modern instrumental rationality and the marginalization of
substantive rationality; in the third one, it rescues the reconstitution of rationality
substantive as an objective possibility of expansion of spaces for human self-
realization; in the fourth one, it makes visible some connections between human
substantivity and environmental rationality; and finally, it conclud es in part that
environmental rationality, which is understood as an alternative rationality of
production, cannot be centered on the market.
Key words: Reason. Instrumental Rationality. Substantive Rationality.
Environmental Rationality.
1 Sociólogo. Doutor em Meio ambiente e Desenvolvimento (MADE-UFPR). Pesquisador/docente do
Mestrado em Organizações e Desenvolvimento da FAE. E-mail para contato: edmilson@fae.edu.
Esta obra foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição 3.0 Não Adaptada.
Cad. de Pesq. Interdisc. em Ci-s. Hum-s., Florianópolis, v.13, n.102, p.100-118 jan/jul 2012
101
Muitos, dentre nós, conhecem adolescentes dominados pela
compulsão da comida. O comedor compulsivo, que se empanturra com tanta
pressa e com tanta desatenção que mal repara naquilo que devora, aplica a
si mesmo duas sérias penalidades. Embora seu corpo esteja sendo
abarrotado de enormes quantidades de coisas realmente boas, o comedor
vai-se tornando, ao mesmo tempo, cada vez menos capaz, fisicamente. E
que pena! nem está apreciando aquilo que come; mal se lembra de
procurar sentir o sabor da comida.
Como adultos do século XX, nós nos tornamos usuários compulsivos
chegando aproximadamente aos mesmos resultados (WALTER KERR,
The Decline of Pleasure).
Introdução
As reflexões contidas neste artigo se situam no centro do debate
contemporâneo acerca da crise civilizatória, com rebatimentos em todas as
dimensões da vida associativa e que reivindica novas atitudes, novas epistemes,
novas teorias e novos saberes. A categoria que confere unidade ao texto é a de
racionalidade, apreendida em seus dois sentidos, o instrumental e o substantivo.
Trata-se de uma categoria analítica relacional, pois o parece ser possível
compreender a dimensão instrumental da racionalidade sem seu complemento, a
dimensão substantiva. Nesse sentido, toda discussão da racionalidade substantiva,
tomada a partir da obra de Guerreiro Ramos, traz de forma subjacente a
contribuição de Polanyi (1980 e 1994) acerca do conceito de uma “economia do
suficiente”. Esse conceito alternativo de economia está centrado em uma
racionalidade substantiva, pois há predomínio de relações de vizinhança e de
fortalecimento do tecido social, capaz de garantir a sobrevivência dos componentes
do grupo social. Polanyi ressalta que a economia é claramente apenas um meio de
garantir o fim de um sistema social, o bem-estar dos viventes. A contribuição de
Guerreiro Ramos tem como um dos pontos de partida, dentre outros, esta
concepção de Polanyi.
A outra categoria analítica é a de racionalidade ambiental, derivada da
contribuição de Leff, cujos pontos de partida são as obras de Marx, Weber e
Foucault. A racionalidade ambiental emerge nas formulações de Leff como todos os
valores, crenças, sentimentos e saberes que resistem ao poder colonizador da
racionalidade instrumental.
A contribuição deste artigo está associada à tentativa de aproximar estas
duas abordagens que, embora de formas diversas, enfrentam a complexidade da

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT