Racismo, fome e política: um diálogo sobre África e América na conjuntura da pandemia

AutorFrancisco de Paula Dominguez Duran, João Lucas Coimbra Sousa, José de Ribamar Sá Silva
CargoDoutor em Economia, docente na Business School, Middlesex University (Reino Unido). E-mail: f.dominguez@mdz.ac.uk / Mestre em Direito Internacional, Arizona State University (Estados Unidos), e doutorando em Estudos Africanos, Universidade Federal da Bahia (Brasil). E-mail: jcoimbra@asu.edu / Doutor em Políticas Públicas, docente do ...
Páginas603-622
RACISMO, FOME E POLÍTICA: um diálogo sobre África e América na conjuntura da pandemia
Francisco de Paula Dominguez Duran
1
João Lucas Coimbra Sousa
2
José de Ribamar Sá Silva
3
Resumo
O artigo discute o atual moment o sócio-político na América Latina e na África, no con texto da pandemia da covid-19 e da
ocorrência de alguns retrocessos civilizatórios. Destaca que as sociedades desses continentes, em particular, são marcadas
pelo racismo estrutural e pela ne gação dos direitos humanos fundamentais, como o acesso aos alimentos, para a maioria
da população, notadamente para os povos originários e para aqueles cujos ancestrais foram desterrados do continente
africano e submetidos à escravidão, para garantir a espoliação dos recursos naturais desta par te do mundo e alimentar a
ascensão do capitalismo como sistema global.
Palavras-chave: América Latina; África; fome; racismo.
RACISM, HUNGER AND POLITICS: a dialogue on Africa and America in the context of th e pandemic
Abstract
The current sociopolitical moment in Latin America and Africa is discussed, under the pressing situation of covid -19
pandemic and the occurrence of some setbacks in civilizational achievements. It must be remarked that tho se societies are
tainted by structural racism and habitual negation of basic human rights, such as access to nourishment for most of the
people, notably regarding original populations of the Americas and the descendants of those who were forced unto slave
labor, all of this motivated by the spoliation of natural resources from this part of the world, in order to fuel capitalism as it
ascended to become a global system.
Keywords: Latin America; Africa; racism.
Artigo recebido em: 12/02/2022 Aprovado em: 29/04/2022
1
Doutor em Economia, docente na Business School, Middlesex University (Reino Unido). E -mail: f.dominguez@mdz.ac.uk
2
Mestre em Direito Internacional, Arizona State University (Estados Unidos), e doutorando em Estudos Africanos,
Universidade Federal da Bahia (Brasil). E-mail: jcoimbra@asu.edu
3
Doutor em Políticas Públicas, do cente do Departamento de Economia, Universidade Federal do Maran hão (Brasil). E-mail:
jose.sa@ufma.br
Francisco de Paula Dominguez Duran, João Lucas Coimbra Sousa e José de Ribamar Sá Silva
604
1 INTRODUÇÃO
A pandemia de covid-19 instaurou-se em um contexto em que forças políticas retrógradas
vêm buscando suprimir algumas conquistas civilizatórias. Ao se discutir o atual momento sócio-político
na América Latina e na África, no contexto da pandemia da covid-19, põe-se em relevo o fato de que as
sociedades desses continentes, em particular, são marcadas pelo “racismo estrutural” e pela negação
dos direitos humanos fundamentais, como o acesso aos alimentos, para a maioria da população,
notadamente para os povos originários e para aqueles cujos ancestrais foram desterrados do
continente africano e submetidos à escravidão.
A expressão “racismo estrutural”, se um dia conseguiu explicar, por exemplo, a
indissociabilidade entre a realidade opressora da pessoa negra e o comportamento opressor do
branco, ao que se observa hoje, não raro, tem servido para uma compreensão diametralmente oposta.
O efetivo enfrentamento do racismo estrutural é, necessariamente, um questionamento da
“normalidade” presente – normalidade essa que se exemplifica tanto no olhar vigilante sobre uma
mulher preta parar diante da vitrine de uma loja qualquer, quanto nas discrepâncias referentes ao
tratamento das situações de fome nos países da periferia do capitalismo; tanto na truculência da
abordagem policial a moradores pretos das periferias urbanas, quanto na espoliação que o
colonizador/imperialista faz dos recursos da mãe-terra dos povos originários.
É essa “normalidade” que instigou a percepção dos próprios organismos das Nações
Unidas, a ponto de destacarem que continuamos vivendo em “uma realidade humilhante” (FAO; IFAD;
UNICEF; WFP; WHO, 2021, p.8). No mais recente relatório sobre a situação da segurança alimentar
da população mundial, está estimado que, ao longo de 2020, o primeiro ano da pandemia, cerca de
2,37 bilhões de pessoas não tiveram acesso à alimentação adequada. Dessas pessoas, quase 928
milhões se encontravam em situação de insegurança alimentar grave, o que significa que elas estão
submetidas à fome. Na África estão 346,6 milhões de pessoas e 92,8 milhões na regiã o América Latina
e Caribe.
Se, por um lado, esses números indicam a dimensão do desafio humanitário de combater
a fome, por outro lado, a situação se mostra muito mais complexa à medida que se observa esse é um
cenário em que avançam forças políticas ultraconservadoras, cujos representantes são herdeiros em
linha reta de um passado escravocrata, que erigiu o capitalismo colonial e imperialista, usurpando os
recursos naturais e drenando a energia humana dos povos, sobretudo no chamado “novo mundo” e na
África.

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