A reforma trabalhista sem fim: a continuidade da desconstrução dos direitos trabalhistas após 2017 e o relatório do gaet

AutorRenata Queiroz Dutra
CargoProfessora Adjunta de Direito do Trabalho da Universidade de Brasília (Graduação e na Pós-Graduação)
Páginas444-483
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, v. 46, n. 254, p. 444-483, set./dez. 2021| ISSN 2447-861X
A REFORMA TRABALHISTA SEM FIM: A CONTINUIDADE DA
DESCONSTRUÇÃO DOS DIREITOS TRABALHISTAS APÓS 2017 E O
RELATÓRIO DO GAET
The endless labor reform: the continuation of the deconstruction of Labor rights
after 2017 and the “GAET” report
Renata Queiroz Dutra
Universidade de Brasília, Brasil
Informações do artigo
Recebido em 05/011/2021
Aceito em 14/12/2021
doi>: https://doi.org/10.25247/2447-861X.2021.n254.p444-483
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Atribuição 4.0 Internacional.
Como ser citado (modelo ABNT)
DUTRA, Renata Queiroz. A Reforma Trabalhista sem
fim: a continuidade da desconstrução dos Direitos
Trabalhistas após 2017 e o Relatório do GAET. Cadernos
do CEAS: Revista Crítica de Humanidades.
Salvador/Recife, v. 46, n. 254, p. 444-483, set./dez. 2021.
DOI: https://doi.org/10.25247/2447-861X.2021.n254.p444-483
Resumo
Nesse artigo buscou-se mapear a continuidade da
reforma trabalhista de 201 7 por meio de um apanhado
das medidas editadas pelo Executivo entre 2018 e 2021,
da atuação do STF sobre o tema no mesmo período, e de
uma análise mais detida no conjunto de propostas
apresentado pelo GAET Grupo de Altos Estudos sobre
o Trabalho, em novembro de 2021. O objetivo é
descortinar não apenas o caráter continuado desse
processo, bem como a renovação de argumentos e
promessas que, a despeito de descumpridas, continuam
animando proposições da mesma natureza, em um
cenário de profunda degradação das relações de trabalho
no país.
Palavras-Chave: Reforma Trabalhista. Austeridade.
GAET. Precarização do Trabalho.
Abstract
This article aims to map the continuity of the 2017 labor
reform through an overview of the measures edited by
the Executive between 2018 and 2021, the Brazilian
Constitucional Court’s performance on the subject in the
same period, and a more detailed analysis of the set of
proposals presented by GAET - Group of Higher Studies
on Labor, in November 2021. The objective is to unv eil
not only the continued character of this process, as well
as the renewal of arguments and promises that, despite
being breached, continue to encourage propositions of
the same nature, in a scenario of deep degradation of
labor relations in the country.
Keywords: Labor reform. Austerity. GAET.
Precariousness of work.
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, v. 46, n. 254, p. 444-483, set./dez. 2021.
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Sumário: Introdução; Os desdobramentos da reforma trabalhista en tre 2018-2021; O
relatório do GAET de novembro de 2021; O GAET: composição e funcionamento; As propostas
do relatório do GAET; Subcomissão de Economia do Trabalho ; Subcomissão de Direito do
Trabalho e Segurança Jurídica; Subcomissão de Trabalho e Previdência; Subcomissão de
Liberdade Sindical; Questões colocadas à regulação do trabalho no país; Considerações finais.
Referências.
Introdução
Passados 4 anos da Reforma Trabalhista de 2017 (Leis 13.429 e 13.467/2017)
encampada pelo Governo Michel Teme r (MDB), duas constatações emergem: primeiro, os
resultados prometidos não foram alcançados, notadamente no que toca ao nível de
emprego, que, mesmo antes da pandemia, não havia sido elevado aos patamares prometidos
pelos idealizadores da reforma, contexto que se agravou com a pandemia da Covid-19;
segundo, o processo de desconstrução da proteção ao trabalho, com reversão dos pilares que
orientavam o Direito do Trabalho rumo ao seu oposto, apenas se iniciou em 2017.
Durante o Governo Jair Bolsonaro (sem partido), a ruptura consistente promovida
pela Lei 13.467/2017 se desdobrou em inúmeras outras medidas, sempre intituladas de
“modernizadoras” da legislação do trabalho. Ao contrário do que se deu no período anterior,
as alterações incidentes sobre o direito do trabalho, entre 2018 e 2021, tiveram por
característica o manejo de Medidas Provisórias, algumas das quais convertidas em lei, outras
derrotadas expressamente no Congresso Nacional ou apenas caducadas pelo d ecurso do
prazo. Também merecem destaque durante o Governo Bolsonaro a atuação do Executivo no
sentido de revogar e/ou alter ar normas regulamentadoras, notadamente em matéria de
saúde e segurança do trabalho.
Houve, portanto, um agravamento do cenário deficitário em relação ao diálogo social,
ao observar-se que, de um processo legislativo exíguo e sem participação popular, que
marcou a tramitação da Lei 13.467/17, passou-se a uma atuação unilateral do Poder
Executivo, por meio de medidas provisórias e decretos que não envolvem, senão a posteriori,
a participação de outros poderes, e abreviam, ainda mais, a possibilidade democrática de
discussão com a sociedade a respeito da temática da regulação do trabalho.
Se, mesmo antes de 2017, era possível dizer de um processo continuado de
construção da reforma trabalhista no Brasil, o qual contou, antes mesmo de qualquer
alteração legislativa, com uma modificação de paradigmas capitaneada pelo Supremo
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Tribunal Federal por meio de uma jurisprudência revisora dos entendimentos da Justiça do
Trabalho e instauradora das demandas de mercado como elemento apto a relativizar
diretrizes constitucionais (PAIXÃO, 2021; MELLO FILHO, DUTRA, 2021), é interessante
observar que a noção de continuidade perdurou após a reforma de 2017, com a legitimação,
pelo mesmo STF, das alterações legislativas (DUTRA; MACHADO, 2021), e pela sequência de
atos normativos que continuaram a direcionar a desconstrução dos direitos sociais
trabalhistas até 2021.
É nesse contexto de continuidade ou de processualidade das reformas laborais de
austeridades que se insere o relatório divulgado no dia 29 de novembro de 2021 pelo
Ministério do Trabalho, como produto das discussões do GAE T Grupo de Altos Estudos
sobre o trabalho, assim intitulada a comissão composta por indicados do governo para pensar
as questões atinentes ao trabalho, o qual apresenta um conjunto de propostas, envolvendo
projetos de lei e de Emendas Constituc ionais, para reformar, mais uma vez, a regulação do
trabalho no país.
Nesse artigo buscou-se mapear a continuidade da reforma trabalhista de 2017 por
meio de um apanhado das medidas editadas pelo Executivo entre 2018 e 2021, da atuação
do STF sobre o tema no mesmo período, e de uma análise mais detida no conjunto de
propostas apresentado pelo GAET no final do ano de 2021.
O objetivo, assim, é descortinar não apenas o caráter indeterminado temporalmente
desse processo, bem como a renovação de ar gumentos e promessas que, a despeito de
descumpridas, continuam animando proposições da mesma natureza, em um cenário de
profunda degradação das relações de trabalho no país. Ao final, pretende -se levantar
desafios para os rumos da regulação do trabalho no país, considerando a ofensiva continuada
sobre os trabalhadores, trabalhadoras, suas organizações coletivas e instituições públicas de
regulação do trabalho.
Os desdobramentos da Reforma trabalhista entre 2018-2021
Longe de desenrolar-se como um período de acomodação das abruptas e
significativas alterações impostas ao direito do trabalho pela Lei nº 13.467/2017 (KREIN, 2018;
DELGADO & DELGADO, 2017), o ano de 2018 acirrou o cenário de disputas entre capital e
trabalho no país.

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