Ressignificando a maternidade: psicanálise e literatura

AutorCristina Steves
Páginas52-66
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Ressignificando a Maternidade: Psicanálise e Literatura
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Cristina Stevens
A este ato cruel de autonegação, quando desejei que a terra me
tragasse, você deve o seu nascimento, e eu o prazer indescritível
de ser mãe.
(Mary Wollstronecraft, Maria, or the wrongs of
woman)
Res
umo: O presente trabalho explora estudos teóricos que têm buscado conciliar feminismo e
maternidade, e seus reflexos na literatura. A partir da perspectiva psicanalítica, objetivam
desconstruir os mitos patriarcais que regulam a complexa experiência da maternidade;
analisam as fragilidades e inconsistências do paradigma edipiano, e identificam o crescimento
de outras economias psicológicas e narrativas que buscam ressignificar a maternidade sob a
ótica da mulher. Cixous, Irigaray e Kristeva, e recentes contribuições para uma teoria
feminista da maternidade. Breve análise desta temática na literatura inglesa.
Palavras chave: psicanálise; maternidade; literatura inglesa contemporânea.
Todos nós temos mães, e como mulheres temos o potencial para sermos mães; mas a
maternidade é uma realidade que conceitualmente tem sido deformada, evitada, idealizada,
degradada. Concepções religiosas, mitológicas, socioculturais nos apresentam conotações
complexas que vão de um sentimentalismo quase doentio a uma imagem aterrorizadora de
“continente escuro”, negativo, que precisa ser controlado, anatomizado, demonizado. Essas
formulações patriarcais tiveram – e ainda têm – impacto incalculável na vida de homens e
mulheres, e por isto têm merecido a atenção de feministas, sobretudo nas três últimas décadas.
Por muito tempo a maternidade foi considerada um fato puramente biológico, fixado
literal e simbolicamente nos limites do domínio privado e emocional. Os discursos religiosos,
médicos e psicológicos que descreviam e sobretudo prescreviam esses papéis foram bastante
danosos. Hoje, debatemos a função e status da maternidade no espaço público, e sua
complexidade aumenta à medida que o sentido de maternidade se diversifica, uma vez que à
mãe tradicional vem juntar-se a mãe adotiva, a mãe lésbica, o homossexual que materna, a
mãe de aluguel, a mãe adolescente, a mãe solteira, a mãe prisioneira, a mãe pobre, negra, a
mãe genética etc. Embora consciente da diversidade de circunstâncias materiais e culturais
que remetem à análise de significados construídos no plano individual e local, acreditamos
que existem algumas preocupações em comum, apesar das diferenças. A multiplicidade da
mulher está presente na figura da mãe, para quem convergem as dimensões de classe, raça,
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Este trabalho é um dos resultados do projeto de pesquisa desenvolvido no Centre for Interdisciplinary Gender
Studies da Universidade de Leeds, com apoio da CAPES, através da c oncessão de bolsa de pós-doutorado.

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