Restituição do Recebido

AutorWladimir Novaes Martinez
Ocupação do AutorAdvogado especialista em Direito Previdenciário
Páginas113-118

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Se há remansosa disposição da Justiça Federal de acolher a renúncia às mensalidades de um benefício para tornar possível a desaposentação, isto é, ensejar uma segunda aposentação (com raros doutrinadores contrários à ideia)

— em cada caso observados os trâmites procedimentais — no que diz respeito ao dever de restituir ou não o que foi auferido no regime concessor e mantenedor do benefício, desde a DIB até a DCB da prestação, bem como o nível do eventual quantum, é questão ainda intrincada, aberta ao debate, técnica e juridicamente polêmica.

Alguns autores (como Adriane Bramante de Castro Ladenthin. In: A restituição na desaposentação — RPS, n. 399/13) rejeitam a obrigação de devolver sem enfatizar o equilíbrio do plano de benefícios do regime de origem ou do regime receptivo; outros pensam na necessidade da restituição, despreocupados com o regime inanceiro, o tipo do plano, os elementos biométricos do segurado etc.; enim, com os aspectos matemáticos ou inanceiros.

Exemplos singelos operados com números arredondados, idades variadas e situações ideais talvez tornem as concepções um pouco mais visíveis.

Suponha-se um regime originário com apenas dois contribuintes. Um primeiro segurado começou a pagar com 15 anos e 30 anos depois se aposentou aos 45 anos de idade e viverá até os 70 anos. Logo, seu benefício nesse regime concessor perduraria por 25 anos (45 + 25 = 70 anos). Entretanto, depois de recebê-lo por 10 anos, portanto, com 55 anos de idade, renunciou e ingressou num regime receptor em que receberá por 15 anos uma renda mensal dobrada em relação ao que auferia no primeiro regime (55 + 15 = 70 anos). Ou seja, 15 anos, grosso modo, que podem equivaler, no exemplo, a 30 anos, se dobrada a mensalidade.

A rigor, a preocupação do segundo regime deve ser no sentido de que deveria auferir recursos o mais próximo possível do que teria auferido se o segurado tivesse se iliado desde os 15 anos ao seu plano de benefícios e ali se aposentado aos 55 anos de idade. Mas, evidentemente, isso não será possível, por causa da enorme multiplicidade de mecanismos contributivos presentes nos diferentes regimes.

Num certo acerto de contas, ou o regime originário reembolsa o regime instituidor de tudo o que recebeu de contribuição menos o que desembolsou de mensalidades, cobrando a eventual diferença do segurado, ou apenas tudo o que recebeu sem nada exigir dele. Na segunda hipótese, juridicamente arcará com insuiciências e, se tiver de aposentar outro segurado, não possuirá exatamente os recursos para pagá-lo.

Num regime originário que adote um plano de benefícios de contribuição deinida (verdadeira caderneta de poupança) e cujo capital acumulado restante será encaminhado para um regime instituidor de igual característica, teria consumido uma parte desse capital acumulado. O segurado terá de se contentar com o saldo remanescente transportado mais o que vier a contribuir no novo regime.

Lembrando-se que os dois maiores regimes (RGPS e RPPS), de regra adotam o regime de repartição simples e plano de benefício deinido, ideias que deinem ampla solidariedade, a referida variedade de situações torna bastante complexo ou quase impossível o cálculo, não só das contribuições devidas (ou vertidas) para o primeiro regime como o que foi pago em matéria de manutenção de benefício.

Dito isso porque no RGPS jamais houve correlação entre a contribuição e o benefício e somente com a Lei n. 9.876/99 é que se começou a implantá-la. Nos RPPS, alguma relação não tem mais do que 15 anos (o ESPCU, somente depois de 1993).

Para exemplificar e aclarar um pouco mais o raciocínio imagine-se um empregado com 20 anos, admitido com salário no teto de contribuição, que receba uma aposentadoria por invalidez cinco anos após a admissão (para garantir

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a futura carência, antes de 1991), auferindo a mensalidade máxima desse benefício durante 35 anos. Que tenha alta médica, contribua por mais dez anos, requeira a aposentadoria por idade e logo depois pretenda se desaposentar (sic) porque ingressou no serviço público!

Esses e outros exemplos trazidos à colação pela doutrina ressaltam óbices pontuais da complexidade da avaliação e dos cálculos e nada mais, sendo facilmente superados, insiste-se, pela adoção da repartição simples e a presença de uma solidariedade entre os regimes, aliás, proligada pela norma constitucional quando optou pela universalidade de cobertura, mas desaparecida com a Lei n. 9.796/99 (compensação inanceira).

Se restituição tiver a ver com o novo benefício, ele terá de ser custeado com os recursos do regime originário e mais os do novo regime. Ipso facto, quem só abdica, não requer a CTC e não pretende se aposentar novamente, não tem de devolver nada.

Restituição do recebido traz à luz vários questionamentos relativos aos regimes de previdência social, sendo que o principal deles é saber que eles historicamente não observaram quaisquer regras atuariais aceitáveis. A pluralidade de alíquotas pessoais fora do período básico de cálculo ou no seu bojo, especialmente quando era de 36 meses, inviabiliza qualquer solução técnica, adotada a posteriori.

Assim sendo, com certeza os modelos imaginados desaguarão em montantes aferidos ilíquidos e não reletirão o verdadeiro equilíbrio atuarial e inanceiro necessário.

Causas não técnicas

A par de motivos técnicos (aspectos inanceiros da relação entre os dois regimes em si mesmo atuarial e matematicamente incognoscíveis e mudez normativa, restam enormes embaraços de apuração do quantum) e razões infundadas às vezes são apresentadas...

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