Riachão das neves - Vara crime, júri, execuções penais, infância e juventude

Data de publicação15 Março 2023
Número da edição3292
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL DE RIACHÃO DAS NEVES
INTIMAÇÃO

0000112-42.2019.8.05.0210 Habeas Corpus Criminal
Jurisdição: Riachão Das Neves
Impetrado: César Manuel Da Cunha
Advogado: Ana Paula Arruda Crisostomo Barreto (OAB:BA32190)
Impetrante: Ministério Público Do Estado Da Bahia
Terceiro Interessado: Polícia Civil Do Estado Da Bahia

Intimação:

Vistos, etc.



Trata-se de Habeas Corpus Preventivo, no qual se objetiva a expedição de salvo conduto, em favor do Paciente, para que lhe seja concedido o porte de arma de fogo, durante e fora do seu horário de serviço, insurgindo-se contra dispositivos do Estatuto do Desarmamento.


Juntou procuração e documentos.

Informações prestadas pelo Ilustre Delegado de Polícia.

Informações prestadas pelo Estado da Bahia.

Parecer do Ministério Público opinando pela denegação da ordem.


É o que importa relatar.

DECIDO

No sentir deste juízo, deve-se ser cingida a análise do pedido entre o porte da arma de fogo durante, ou fora, do serviço nos limites do município , da análise fora dos limites municipais.

Quanto à utilização da arma de fogo, na condição de livre porte em qualquer ponto do território estadual ou nacional, tem-se que não deve ser conhecida e indeferido qualquer salvo-conduto, face a generalidade do pedido e inadequação do meio processual.



Da análise atenta dos autos, pode-se concluir que não há qualquer ameaça concreta de constrangimento ilegal sobre a liberdade de locomoção do Paciente, adveniente de qualquer Autoridade Impetrada.

Como se sabe, o Habeas Corpus é uma ação de natureza constitucional, que se destina a coibir qualquer ilegalidade ou abuso de poder contra a liberdade de locomoção, estando previsto no artigo 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, in verbis: “Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.




Por outro lado, dispõe o artigo 144, da Constituição Federal:


“A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I) polícia federal; II) Polícia rodoviária federal; III) polícia ferroviária federal; IV) policias civis; V) polícias militares e corpos de bombeiros militares ; VI - polícias penais federal, estaduais e distrital. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 104, de 2019)”.



Assim sendo, em conformidade com os referidos dispositivos constitucionais, o artigo 6º, inciso IV, do Estatuto do Desarmamento, estabelece ser proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, com exceção, dentre outras hipóteses, dos integrantes das guardas municipais dos Municípios com mais de 50.000 (cinquenta mil) e menos de 500.000(quinhentos mil) habitantes, quando em serviço, não se verificando, in specie, qualquer ofensa ao princípio da igualdade, como sustentado pelo Impetrante.

Por outro lado, há de se ressaltar a inadequação da ação constitucional para a discussão dos dispositivos do Estatuto do Desarmamento, uma vez que a via estrita do habeas corpus deve-se restringir aos casos concernentes à liberdade de ir e vir. Logo, não se constata dos elementos constantes dos autos, qualquer ameaça concreta de lesão ao direito de locomoção do Paciente, uma vez que se trata, tão somente, de mera conjectura, inexistindo, de tal modo, qualquer coação ilegal a ser conjurada.

Sobre o tema, colhem-se os seguintes julgados, pertinentes ao caso vertente:



“CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUSPREVENTIVO. AUSÊNCIA DE ATO CONCRETO AMEAÇANDO O DIREITO DE LOCOMOÇÃODOPACIENTE. DENEGAÇÃO DA ORDEM. O uso da ação constitucional de habeas corpus está limitado às hipóteses em que há ameaça concreta ao direito de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder (CF, art. 5º, LVIII). (TJ-SC, Relator: Luiz Carlos Freyesleben, Data de Julgamento: 17/02/2010, Segunda Câmara). HABEAS CORPUS PREVENTIVO. PACIENTEINVESTIGADA PELA PRÁTICA DE CRIME DEROUBO MAJORADO. PRISÃO TEMPORÁRIADECRETADA. PEDIDO DE PRORROGAÇÃOINDEFERIDO. AUSÊNCIA DE JUSTO RECEIOAJUSTIFICAR A EXPEDIÇÃO DE SALVO-CONDUTO. Somente é cabível habeas corpus preventivo quando restar demonstrado de modo objetivo o fundado receio de que o paciente possa vir a sofrer coação ilegal em seu direito de ir, vir e permanecer, o que não restou demonstrado no presente caso, inviabilizando-se, assim, expedição de salvoconduto.Ordem não concedida. (TJ-PR - Habilitação: 9949753 PR 994975-3 (Acórdão), Relator: Luiz Cezar Nicolau, Data de Julgamento: 14/02/2013, 4ª CâmaraCriminal, Data de Publicação: DJ: 1049 28/02/2013) Por conseguinte, constata-se a inexistência de qualquer ato concreto ameaçando o direito de locomoção do Paciente, razão pela qual não há se cogitar de coação ilegal a ser sanada neste writ.



Lado outro, no que tange ao tema quanto à possibilidade do porte de arma de fogo durante o serviço funcional ou fora dele, dentro dos limites do município, entendo, data máxima vênia, que deve haver autorização e concessão do salvo conduto restrito.

Utilizando-me, parcialmente dos fundamentos de sentença, de demanda semelhante, juntada à inicial. Passo a reproduzir:


"(...), é vedado ao julgador diferenciar aquilo que a lei tem por igual, Esse entendimento, aliás, É o que prevalece neste E. Tribuna! de Justiça do Estado de São Paulo, cuja órgão especial declarou a inconstitucionalidade do dispositivo legal questionado:

INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 6, INCISO VI, DA LEI 10.826, DE 22.12.2003, ALTERADA PELA MP 157, DE 23.12.2003. PROIBIÇÃO DE PORTE DE ARMA A GUARDAS MUNICIPAIS DE MUNICÍPIOS COM MENOS DE 50 MIL HABITANTES. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. AUSÊNCIA DE RAZÃO JUSTIFICADORA DO TRATAMENTO DESIGUAL. INCIDENTE CUJA PROCEDÊNCIA SE PROCLAMA. A Lei 18.826/03 vedou o uso de arma de fago excepcional a Guarda Municipal dos municípios com mais de 50 mil habitantes e menos de 500 mil habitantes, quando em serviço . A Medida Provisória 157/03 alterou o inciso IV do artigo 6 da Lei 10.820/03 para ampliar a exceção, agora a contempla Guarda Municipal dos municípios com mais de 50 mil habitantes. Nenhum critério racional justifica a exclusão dos municípios com menos de 50 mil habitantes, igualmente sujeitas à nefasta e crescente violência e submetidos a delinquência de idêntica intensidade à de qualquer outro aglomerado urbano. Nítida violação do princípio da isonomia , a fulminar a norma que determina seja excluída o uso de armamentos, nas vias próprias cometidas ao Suprema Tribunal Federal (TJSP ÓRGÃO ESPECIAL INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI nº 139.191-6/0-60. Presidente: CANGUÇU DE ALMEIDA. Julg.: 29.11.06). A r. sentença abordou com elevada propriedade a questão , de modo que não há qualquer ressalva a ser feita em seu conteúdo. Nestes termos, NEGO PROVIMENTO av recurso. AMARO THOMÉ RELATOR Como dito, é exatamente este o entendimento deste julgador, pois há no caso uma inconstitucionalidade flagrantemente material entre os princípios da Constituição Federal, com a legislação que se apresenta, em especial, a previsão do Art. 6º, inciso IV, do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2003), notadamente, se analisado em cotejo (colisão de princípios e normas) com o preceito maior da igualdade, expresso na Carta Magna, além do próprio princípio da proporcionalidade, implicitamente também contido no texto constitucional. Ora, somente se justifica tratar desigualmente os desiguais, quando o critério desigualador justifique, a utilização do discrímen, e, me é certo, no caso concreto, que nada justifica tratar de forma diferenciada, aqueles que são exatamente iguais, como o disse a própria petição inicial, ademais, manter o que quer a lei ordinária, teríamos sim uma situação esdrúxula de um guarda municipal numa cidade, por exemplo, com população de 499.999 (quatrocentos e noventa e nove mil) habitantes, que não poderia portar sua arma, quando fora de serviço, quando o poderia, um outro guarda de uma capital estadual, a exemplo da citada (..Rio Branco/AC ou Palmas/TO...), com menos de 300.000 (Trezentos mil habitantes), portanto, cidade com índice de violência bem menor que muitas cidades interior dos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo ou Pernambuco por exemplo, ter porte de arma irrestrito, qual seja, porte tanto em serviço como fora dele! Ora, não seria tal, já de pronto, uma tremenda incoerência? Qual seria a justificativa razoável neste caso? Há menos perigo à vida dos guardas municipais em Rio Branco, na Amazônia Acreana, do que em Niterói/RJ, cidade conhecida por sua violência, com seus com 4 97.883 (quatrocentos e noventa e sete mil e oitocentos e oitenta e três) habitantes, portanto, população bem maior que a capital referida? E mais, na bucólica Caxias do Sul/RS, com população de seus 479.236 (quatrocentos e setenta e sete mil e duzentos e trinta e seis) ou por fim, na mui antiga Santos/SP, baixada litorânea, com seus 434.359 (quatrocentos e trinta e quatro mil e trezentos e cinquenta e nove) habitantes (...) “beira ao ridículo” a existência de tais diferenciações, pois os absurdos inclusive, não parariam por aí, pois a lei, com seus regulamentos posteriores, nos...

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