Ruy barbosa - Vara crime, júri, execuções penais, infância e juventude

Data de publicação25 Agosto 2021
Número da edição2928
SeçãoCADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL DE RUY BARBOSA
DECISÃO

8000860-40.2021.8.05.0218 Petição Infracional
Jurisdição: Ruy Barbosa
Requerente: M. P. D. E. D. B.
Requerido: K. M. D. S.
Advogado: Renan Freitas Macedo (OAB:0052839/BA)
Terceiro Interessado: M. M. D. J. M.
Requerente: K. F. M. S.
Requerente: J. D. J. M.
Terceiro Interessado: C. T. D. R. B. -. B.

Decisão:

Vistos.

O Ministério Público moveu ação socioeducativa em face de KEVIN MIRANDADA SILVA, nascido em 14/04/2004, por ato infracional de comportamento tipificado no art. 217-A do Código Penal, aduzindo, em síntese, como supedâneo fático que:

“Narram os autos do Boletim de Ocorrência em epígrafe, oriundos da Delegacia de Polícia de Macajuba, que no mês de junho de 2020, durante a época de festejos juninos, o Representado, Kevin Miranda da Silva, manteve conjunção carnal e outros atos libidinosos com a criança Kari Fernanda Miranda Santos, nascida em 28 de julho de 2008. Segundo restou apurado, em novembro de 2020, a genitora da vítima constatou que a gravidez da sua filha. Exame de Ultrassonografia Obstétrica, realizado no dia 12/11/2020, confirmou a gestação de vinte (20) semanas e quatro (04) dias. Indagada, a vítima informou que manteve conjunção carnal com o Representado.”

A representação movida contra o adolescente fora recebida por este juízo em 19/04/2021, ocasião em que fora designada audiência de apresentação do adolescente e expedidas as competentes notificações.

O advogado do adolescente protocolizou petição de resposta à representação por ato infracional.

Durante a instrução em juízo, foram ouvidas as testemunhas: Josenilde de Jesus Miranda, genitora da menor K.F.M.S.; Em seguida, se procedeu com a oitiva de Maria Milza de Jesus Miranda, genitora do representado. Em assentada anterior, este juízo já havia ouvido o representado a respeito dos fatos que lhe estão sendo imputados.

Na fase do art. 402 do CPP, as partes não requereram diligências, conforme consignado em ata de audiência.

Em alegações finais, o Ministério Público, em razão das provas colhidas na instrução processual, pleiteou pela aplicação da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade.

A defesa do acusado, em alegações finais, pugnou pela absolvição do representado, sustentando tese de erro de proibição, sob o argumento de que o menor pensava que a conduta era permitida, desconhecendo totalmente que tal fato seria crime de estupro.

É o relatório. DECIDO.

O processo encontra-se formalmente em ordem, inexistindo nulidades ou vícios a sanar. As provas foram coligidas sob o crivo dos princípios norteadores do devido processo legal, mormente o contraditório e a ampla defesa, nos termos constitucionais.

Presentes as condições da ação e os pressupostos de desenvolvimento regular do processo. Ausente qualquer nulidade a ser declarada ou sanada e, inexistindo alegações preliminares, adentro ao mérito.

Das provas colacionadas nos autos, tanto na fase pré-processual como na fase judicial, depreende-se que no mês de junho de 2020, durante a época de festejos juninos, o Representado, Kevin Miranda da Silva (16 anos), nascido em 14/04/2004, manteve conjunção carnal e outros atos libidinosos com a criança Kari Fernanda Miranda Santos (11 anos), nascida em 28 de julho de 2008, resultando em gravidez.

Em audiência, este juízo passou a ouvir a adolescente Kari Fernanda unicamente a respeito de sua gestação e da necessidade ou não de se acionar a rede de apoio de assistência municipal. A adolescente informou que já teve a criança, que se chama Lucas Miranda Santos.

A materialidade está amparada nos elementos de informação colacionados aos autos, tais como: Boletim de Ato Infracional, Relatório do Conselho Tutelar, Depoimentos colhidos; Laudos Periciais, evidenciando assim a justa causa para deflagração da presente ação socioeducativa.

Percebe-se que os depoimentos das testemunhas Josenilde de Jesus Miranda, genitora da menor K.F.M.S., e da Sra. Maria Milza de Jesus Miranda, genitora do representado; convergem com os demais elementos de prova, sobretudo com o resultado de gravidez da menor, após o ato de conjunção carnal praticado com o adolescente representado, gravidez esta amparada nos laudos médicos juntados, motivo pelo qual merecem ser valorados com credibilidade no contexto probatório.

No tocante a tese de erro de proibição suscitada pela defesa, esta não merece prosperar. Não há que se confundir o desconhecimento da lei, que é inescusável, com o instituto do erro de proibição. O erro de proibição recai sobre a ilicitude do fato, resultando em uma causa excludente da potencial consciência da ilicitude. Para se aferir a existência de erro de proibição, são consideradas as características pessoais do agente, tais como idade, grau de instrução, local em que vive e os elementos culturais no qual desenvolve sua personalidade.

Não há erro de proibição quando inexiste comprovação de que o representado ignorava a ilicitude da conduta. Somente se reconhece o erro de proibição evitável, previsto no art. 21, parágrafo único, do Código Penal, quando o agente não possui a consciência de que estava fazendo algo errado, embora lhe fosse viável, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência. Pela oitiva do representado (nascido em 14/04/2004), que tinha 16 anos de idade à época dos fatos, enquanto que a vítima tinha apenas 11 anos de idade, dos depoimentos colhidos, documentos e relatório acostados, se conclui que não há qualquer comprometimento cognitivo do adolescente, no que se refere a potencial consciência da ilicitude de manter conjunção carnal com uma criança de 11 anos de idade.

Em audiência, durante a oitiva do representado, este afirmou que encontra-se no estado de São Paulo, local em que encontra-se empregado, para contribuir para o sustento do filho e que ainda não registrou a paternidade da criança Lucas Miranda Santos pelo fato de o representado estar residindo e trabalhando em outro Estado da Federação, o que dificulta que possa retornar ao município de Ruy Barbosa/BA, para fins de proceder com o registro de paternidade do filho Lucas Miranda. A participação do representado na formação do filho foi confirmada pela vítima.

Assim, cotejados os subsídios documentais acostados aos autos, entendo que está satisfatoriamente comprovada a autoria e materialidade do ato infracional imputado ao adolescente representado, uma vez que a prova material e a prova oral colhidas, se harmonizam com os fatos narrados na representação. Todos esses elementos, examinados em conjunto, são suficientes para formar o convencimento de que a conduta do adolescente se amolda perfeitamente ao ato infracional equiparado ao crime disposto no art. 217-A do Código Penal.

Contudo, na forma do art. 126, parágrafo único do ECA, levando-se em consideração as circunstâncias e consequências do fato; levando em consideração o contexto social e o fato de que o representado reconhece a paternidade da criança Lucas Miranda; levando em consideração que o adolescente representado se encontra residindo e trabalhando em outro estado da Federação; levando em consideração a maior ou menor participação do agente no ato infracional; entendo que a remissão, no presente caso, atende aos objetivos delineados no ECA sobre a proteção integral à criança e ao adolescente, assegurando-se, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, na forma do art. 126, parágrafo único do ECA, concedo REMISSÃO ao adolescente KEVIN MIRANDADA SILVA, qualificado nos autos, em face da representação movida pelo Ministério Público, por incursão em ato infracional de comportamento tipificado no art. 217-A do Código Penal, determinando a suspensão do presente feito, pelo prazo prescricional legal.

Notifique-se o representado e seus genitores sobre as diligências necessárias para reconhecer a paternidade da criança Lucas Miranda Santos, junto ao cartório de registro civil mais próximo de sua residência, ainda que esteja residindo no Estado de São Paulo, uma vez que o art. 6°, § 2° do PROVIMENTO N. 16 do CNJ, autoriza que o reconhecimento de paternidade possa ser realizado por termo perante Ofício de Registro de Pessoas Naturais diverso daquele em lavrado o assento natalício do filho, bastando tão somente apresentar a certidão de nascimento da criança.

Oficie-se ao Conselho Tutelar local para que auxilie o adolescente representado, genitor da criança Lucas Miranda Santos, para fins de dar seguimento ao procedimento de reconhecimento de paternidade em Ofício de Registro de Pessoas Naturais diverso daquele em lavrado o assento natalício do filho, na forma disciplinada no art. 6°, §§ 2° e 3° do PROVIMENTO N. 16 do CNJ.

Ciência ao Ministério Público.

Intimem-se.

RUY BARBOSA/BA, 04 de agosto de 2021.

MARINA LEMOS DE OLIVEIRA FERRARI

Juíza de Direito

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL DE RUY BARBOSA
SENTENÇA

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